‘Judite’, eis todas as palavras que conheço

É dentro de uma tenda, onde nada mais há do que uma cama feita de cobertores, que tudo se passa. Rui Catalão, dramaturgo e encenador, há de confirmar mais tarde: “Tudo o que me interessava na história de Judite, a mulher que entra no acampamento do poderoso general Holofernes para o degolar e assim poupar o seu povo da destruição, passava-se numa tenda, numa cama.” A Judite, diz, sabia que chegaria mais cedo ou mais tarde. “Nos textos bíblicos, o tema do feminino é um elemento misterioso, porque pouco desenvolvido, e isso sempre me atraiu, porque me permite trabalhá-lo mais”, nota. Foi depois de ter escrito Ester e da experiência comovente de ver adolescentes trabalharem a sua peça no projeto Panos da Culturgest que Rui Catalão, “ainda de mão quente”, como diz, começou a trabalhar este texto de Judite. Por isso, a peça tem dois elencos: três atores profissionais (Ana Guiomar, Cláudia Gaiolas e Tiago Vieira) e um “exército de crianças”, constituído por diferentes grupos de alunos de escolas que terão um workshop com Catalão à tarde e subirão ao palco à noite. Judite será portanto o resultado da escrita do dramaturgo (texto que será editado em livro no dia da estreia), mas também do que trouxerem esses jovens e ainda do trabalho de improvisação feito entretanto pelos atores na segunda parte da peça. A estes, Rui Catalão, quis esquematizar ao máximo a postura em palco, para que ganhassem, em frente aos espectadores, o humanismo e o naturalismo do ato de representação. “Interessa-me que o público tenha essa sensação de técnica”, sublinha o encenador que não apresentava uma peça com atores (que não ele) desde 2012, quando estreou Melodrama para 2 Atores & 1 Fantasma, sobre a forma como a relação destrói a paixão, uma encenação com poucas palavras e muitos toques e olhares. “Vejo Judite como uma versão sonora de Melodrama”, descreve. Daí não ser necessário muito mais do que aquela tenda, aquela cama – mas, desta vez, rodeada de palavras, muitas palavras de sedução, desprezo, confronto e argumentação. “Usei todas as palavras que conheço”, dirá Holofernes.

Judite > Teatro Nacional D. Maria II > Pç. D. Pedro IV, Rossio, Lisboa > T. 21 325 0800 > 10-27 mar, qua 19h30, qui-sáb 21h30, dom 16h30 > €6, €12