A história de Benjamin Clementine tem tudo para ser apresentada como um conto de fadas, mas a realidade é bem diferente. Com um percurso de vida duro, este filho de pais ganeses, nascido em Londres em 1988 – é o mais novo de cinco irmãos –, cresceu e viveu sempre como um solitário, desenquadrado da realidade que lhe era imposta. Em vez de ouvir rap, como os outros miúdos, gostava de ouvir Erik Satie ou Antony Hegarty. E, enquanto os outros jogavam à bola na rua, refugiava-se na poesia de nomes como William Blake e T. S. Eliot. Não é por isso de estranhar que fosse tratado por todos, irmãos e colegas de escola, como um extraterrestre. À exceção do irmão mais velho, Joseph, que lhe haveria de oferecer o piano onde aprendeu a tocar, ainda adolescente, cortou por completo com a família quando se mudou para Paris, com apenas 19 anos.
Na capital francesa, sem dominar a língua, começou por trabalhar em restaurantes, a lavar pratos, tendo chegado a dormir na rua. Mais uma vez, seria a música a salvá-lo, ao começar a tocar nas ruas, estações de metro e pequenos bares, onde cantava versões de Leonard Cohen ou Jimi Hendrix, ao mesmo tempo que escrevia as suas próprias canções. Numa dessas ocasiões, chamou a atenção do produtor francês Matthieu Gazier, hoje seu amigo e agente, que o convenceu a gravar um disco e lhe abriu as portas do meio musical francês, no qual foi recebido de braços abertos. Mas o momento de maior epifania estava ainda por acontecer, quando, em outubro de 2013, ainda um quase total desconhecido, foi apresentar o EP Cornerstone ao popular programa televisivo Later with Jools Holland, na BBC 2, onde, descalço, tomou conta do piano para atacar o tema que dá título ao disco. De repente, aquela figura imponente, tão tímida e reservada, transfigurava-se através da sua potente voz de barítono, num daqueles momentos únicos, que param o tempo e ficam na memória coletiva de todos os fãs de música. Como Paul McCartney, também presente em estúdio, que logo ali o “obrigou” a continuar a carreira.
A partir daí é a história que se conhece: tornou-se num dos artistas mais partilhado no Spotify, ganhou diversos prémios e atuou um pouco por toda a Europa e Estados Unidos. Muitas vezes comparado a Nina Simone, são inúmeras as referências que lhe apontam: David Bowie, Tom Waits, Nick Cave… O próprio, porém, prefere enumerar outras, como Jacques Brel, Charles Aznavour ou Leo Ferré. Mas Benjamim Clementine é, acima de tudo, um daqueles artistas inqualificáveis, a quem simplesmente os rótulos não colam, porque a sua música é intemporal, misturando jazz, soul, sonoridades clássicas, gospel ou até chanson francaise, num universo muito próprio, feito de letras autobiográficas e uma voz tão única quanto grandiosa, que ao vivo chega a ser hipnotizante – como aconteceu no verão passado, no Super Rock, onde deu um dos melhores concertos deste festival. Está de volta agora, para uma minidigressão nacional em nome próprio, para apresentar aos fãs portugueses o disco de estreia At Least For Now, editado apenas este ano. Sim, tudo isto aconteceu, sem qualquer álbum gravado…
Theatro Circo > Av. da Liberdade, 697, Braga > T. 253 203 800 > 22 nov, dom 21h30 > €20
Teatro Aveirense > R. Belém do Pará, Aveiro > T. 234 400 920 > 24 nov, ter 21h30 > €15
Casa da Música > Av. da Boavista, 604-610, Porto > T. 22 012 0220 > 25 nov, qua 22h > €23