Andaram longe de pensar Vasco Santana e António Silva que algum dia fossem postos dentro de uma cápsula de teletransporte, para, a pedido de Nossa Senhora, aparecida na Costa do Castelo, irem até a Alemanha com a “missão nacionalista” de matar Hitler – e ainda levarem com eles Beatriz Costa e Maria Matos. A ligação Lisboa-Berlim fez-se na cabeça do ator e dramaturgo Ricardo Neves-Neves quando a atriz e encenadora Sandra Faleiro lhe pediu um texto para trabalharem juntos. No palco da Sala Estúdio do Teatro Nacional D. Maria II estão agora o Sobrinho (interpretado por Neves-Neves), Titi (Cristina Carvalhal), Paizinho (Rui Melo) e a Filha (Joana Campelo), personagens de Entraria Nesta Sala…, que foi buscar a primeira inspiração aos filmes portugueses dos anos 40. “Os filmes são uma inspiração. Não queríamos fazer uma imitação, mas uma recriação”, sublinha Sandra Faleiro, “e também não queríamos cair na caricatura só”. Fazer comédia, hão de concordar os dois, não é coisa fácil, e em Entraria Nesta Sala… o absurdo vai-se levando cuidadosamente até aos limites.
Em cena está, logo a abrir, o célebre candeeiro de Pátio das Cantigas e há de haver revista às roupas como a Sra. Dona Mafalda faz aos empregados em O Costa do Castelo. Mas não são só as cenas ou as frases e os diálogos dos filmes espalhados ao longo da peça que nos levam para aquela época da Crónica Feminina. Há também os fados, as cantigas folclóricas e ligeiras, e o tom de tudo isto – sobretudo o tom, apontam Sandra Faleiro e Ricardo Neves-Neves. Foi isso que procuraram aqui: o tom certo daquele universo e o tom certo da comédia. “O que gosto na escrita do Ricardo é ela ser cândida: um espanto constante por a vida ser como é, uma perda de inocência também”, nota Sandra Faleiro. “Ai que engraçado”, exclama a Filha vezes sem conta ainda antes de entrar na cápsula de teletransporte, que se liga pelo telefone à telefonista que depois ligará ao Reichstag, e que os levará até à poeirenta Berlim de 1945. “O teatro está pela hora da morte”, haveremos de ouvir António Silva dizer.
Teatro Nacional D. Maria II > Pç. D. Pedro IV, Lisboa > T. 21 325 0800 > Até 8 nov, qua 19h30, qui-sáb 21h30, dom 16h30 > €6, €12