As novas séries, Emília e Capitães do Açúcar, têm características semelhantes: nascem de ideias e projetos de grupos diferenciadores, com equipas jovens, ainda sem entrada no circuito da ficção da RTP; e apresentam elencos menos conhecidos, de talento emergente. Ambas foram feitas com orçamento de baixo custo, mas cheios de alma e coração, acrescentamos nós que já espreitámos os primeiros episódios de cada uma delas.
Para José Fragoso, diretor de programas da RTP, são “conteúdos frescos, preocupações novas, menos tratadas na ficção, com guiões e realizações inteligentes.” Tratam-se de histórias que inquietam, são as referências dos jovens que as criaram e “o risco de produzir vozes novas é quase nenhum”, garantiu Maria João Mayer, produtora das duas novas séries.
As lágrimas de comoção de Filipa Amaro, criadora de Emília, no final da apresentação da série, foram o culminar de vários anos dedicada a um projeto que ainda lhe deixa dúvidas: “O que é que eu tenho de tão importante para dizer que merece atenção de outras pessoas, durante 25 minutos?”, questiona-se no Instagram.
Argumentista e realizadora da série Frágil, em 2019, na RTP Play, Filipa está interessada em escrever sobre identidade, “o que faz de nós, nós”: “se foi o sítio e ambiente onde, por mero acaso, nascemos ou se é algo que vem de um sítio mais profundo”.
Através da história de Emília, uma rapariga que quer muito ser bailarina, mas que não consegue dançar, Filipa Amaro centra-se na importância de alcançar objetivos e “ganhar coragem para tentar”. Emília passará por provações constantes, mas ao ganhar coragem para tentar vai influenciar o que a rodeia.
“Ao pensar na Emília penso em redes sociais e no que têm de bom e de mau”, começa por dizer Beatriz Maia, atriz principal no papel de um talento desperdiçado, dedicado a quem não arrisca com medo de falhar. E acrescenta: “Somos uma geração que se compara, que permite ser constantemente comparado. Num mundo digital gigante gera medo querer tentar.”
Falar de Beatriz Maia, é sinónimo de expressividade, seja a do olhar, vivo e curioso, seja corporal – bem visível na audição que fará perante um coreógrafo (Ivo Canelas) surpreendido. Os flashbacks que nos mostram Emília em criança a brincar com a avó (Maria Emília Correia) são de uma ternura comovente.
Parecem dealers, mas não são
O mundo mais underground e de drogas usado como ambiente principal de Capitães do Açúcar serve, na verdade, para falar de novos conceitos de família. Quando os amigos se juntam para irem morar juntos, nasce uma nova família. Só assim conseguem começar a ser independentes e vir a criar outra família.
Solitário, Bernardo é um estudante de ciências farmacêuticas que vai entrar para o grupo de Neves, Antunes e Cruz, jovens estudantes de Belas-Artes, para “cozinhar” uma nova substância, que vai funcionar como um manifesto artístico de um grupo que ninguém conhece. “Não somos dealers, só produzimos e ganhamos algum dinheiro”, diz uma das personagens a propósito da droga fictícia, substância psicotrópica chamada Açúcar.
O projeto de Tiago Sarmento (ideia original) e Tiago Correia (argumentista) começou há três anos, como uma série que “refletisse o olhar íntimo dos millennials”. “Como tantos, não conseguimos ser livres em prol de ser felizes”, explica Ricardo Leite, realizador.
“Havia uma urgência em escrever uma série que pudesse retratar a nossa geração e que refletisse questões contemporâneas, com um olhar íntimo, sem julgamento nem preconceito, com uma liberdade estética, verbal e sexual. Como em qualquer grupo de amigos, ou família, todas as personagens têm algo que as une e algo que as separa”, escreveram nas notas de produção.
Esta equipa criativa é do Porto, onde assumem fazer parte de uma minoria. “Não há assim tanta gente do Norte a fazer estes projetos”, mas “o sítio onde estamos não nos pode definir”, defendem. Tal como as suas personagens, também os criadores de Capitães do Açúcar tentam não abdicar dos seus ideais e da sua liberdade, questionando o que é ser livre e o que isso implica.
Emília > RTP1 > Estreia 1 mai, seg 22h30 > 6 episódios > Capitães do Açúcar > RTP1 > Estreia 1 mai, seg 23h > 8 episódios