O portão do Parque de Serralves abre, pontualmente, às 21 horas. Há, de facto, que esperar pelo breu da noite para que as visitas noturnas ao monumento nacional tenham outro impacto. Nesta, que a VISÃO Se7e acompanhou, guiada pela bióloga Raquel Ribeiro, do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (CIBIO), e que se repete até ao fim de agosto, o objetivo era dar a conhecer biodiversidade do parque. Mas há outras possibilidades de percorrer, nesta terceira edição do Há Luz no Parque, Serralves à noite, assistindo a concertos, peças de teatro e performances, ou oficinas para todas as idades.
“Quando falamos de vida noturna, em que pensamos de imediato?”, começa por perguntar Raquel Ribeiro ao grupo de 25 pessoas (o limite máximo destas visitas é de 35) que se agrupa junto à Colher de Jardineiro, de Claes Oldenburg & Coosje van Bruggen. “Em pirilampos, em morcegos…” atira um adolescente. E haverá isso tudo por aqui? A bióloga encaminha-nos para a Alameda dos Liquidambares que é, conta-nos, “um dos sítios mais comuns onde o morcego-anão gosta de andar a comer borboletas noturnas: por noite, conseguem comer cerca de três mil insetos”. Para que o grupo os conseguisse ver – tarefa difícil, uma vez que são tão pequenos (pesam cinco gramas) e velozes, que houve quem os confundisse com folhas a cair ou gaivotas – a bióloga ativou um aparelho de ultrassons que deteta as pulsações sonoras de altíssima frequência do mamífero. “Em Portugal, existem 27 espécies de morcegos e algumas estão ameaçadas pelas alterações do habitat”, explica-nos Raquel Ribeiro, enquanto conseguimos ver um ou outro a voar.
“Vamos agora ver se encontramos pirilampos”? convida a bióloga, procurando-os no chão, entre as folhagens junto à Alameda dos Liquidambares e ao Parterre Lateral, a caminho da Casa de Serralves. “Oh, que lindos” escuta-se alguém, quando a bióloga os põe na palma da mão e aponta a lanterna. “Como emitem luz?”, perguntam. “Porque têm uma proteína que o corpo produz na parte inferior do abdómen. A luz é um mecanismo de comunicação”, explica Raquel Ribeiro, admirada pela quantidade de pirilampos que, este verão, tem encontrado por ali, admitindo que seja “porque desde 2014 que o Parque não aplica fitofármacos”. Continuamos pelo escuro do Parterre Central – depois de termos devolvido os pirilampos à mãe-natureza –, pasmados pela beleza da instalação Há Luz no Parque, que ilumina, de outra forma, sequoias, araucárias, magnólias, cedros e lagos. “Aqui costuma-se ouvir a coruja do mato, vamos ver se temos sorte.” Não tivemos, mas a esperança pôs toda a gente de ouvidos atentos e cabeça levantada na tentativa de escutar o som do “Tui-tu” da ave de rapina. O Parque, conta Raquel, tem registadas 90 espécies de aves (diurnas e noturnas) entre melros, gaios, alvéolas, chapins e andorinhas.

As visitas noturnas atravessam o Parterre Lateral, a caminho da Casa de Serralves
Lucilia Monteiro
Descemos as escadas para o Bosque do Lago “à procura de anfíbios”. A noite seca e amena não será a mais propícia. As melhores, explica-nos a bióloga, “são as que têm alguma humidade, seguidas de um dia de chuva, sem vento”. Não tivemos sorte junto ao Lago onde, este ano, parecem ter desaparecido os peixes-pimpões sabe-se lá como, mas ainda ouvimos o coaxar da rã verde quando andámos, de lanternas no chão, à procura do sapo comum que a bióloga conta ali ter aparecido há um mês. “Ainda estamos a tentar perceber como aqui apareceu. É um mistério. Há quem admita que possa ter vindo pela Ribeira da Granja, cuja linha de água corre aqui próximo.”
Não encontrámos o sapo nem a salamandra de pintas amarelas que aqui vive (no Parque já foram registadas 500 espécies diferentes). Mas, e embora também não tivéssemos escutado o sapo parteiro, que parece morar mais abaixo junto ao Lameiro, perto do Prado, o que mais gostámos foi de escutar a história de reprodução deste anfíbio. É que, no acasalamento, é o macho, ao contrário da maioria dos animais, o responsável pelo cuidado e postura dos ovos, carregando-os (cerca de 40) às costas, até encontrar um lugar protegido dos predadores.
Mais à frente voltamos a escutar (e a ver) os morcegos-anões junto à Presa, antes de a bióloga dar por terminada a visita de uma hora e meia que passou a correr. Não atravessámos, obviamente, os 18 hectares deste Parque desenhado pelo arquiteto francês Jacques Gréber, galardoado em 1997 com o prémio Henry Ford Prize for the Preservation of the Environment, mas iremos, com certeza, olhá-lo de outra forma, após esta aula de biologia.
Há Luz no Parque > Parque de Serralves, Av. Marechal Gomes da Costa, Porto > T. 22 615 6500 > até 28 agosto, seg-dom 21h-00h > €5, grátis para menores de 12 anos