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“Interessa-nos este Porto, mais autêntico, mais calmo, onde não há aquela sofreguidão de provar ou de ver isto ou aquilo”, dizem Igor Gandra e Carla Veloso, do Teatro de Ferro
Rui Duarte Silva
1. Teatro de Ferro
Não é um local institucional, mas também não é completamente marginal. Tem aquele “charme alternativo”, brinca Igor Gandra, ao fazer a visita guiada pela imensa sede do Teatro de Ferro, com sala de ensaios, ateliê, escritório e armazéns. Mudaram-se para Campanhã há dois anos, um pouco por acaso, desejosos de se afastarem da zona histórica de Vila Nova de Gaia (onde estiveram dez anos), sujeita a uma “pressão turística insuportável”. “Campanhã é uma zona em transformação, há muito por fazer, a nível cultural também”, diz Igor. “Há uma urgência em olhar para esta parte da cidade, estraçalhada pelas vias de comunicação e com um tecido urbano de leitura muito difícil, densamente habitado. Mas são conhecidas as experiências em que os agentes culturais são uma espécie de pelotão da frente, que torna as coisas inabitáveis para quem já lá está e as descaracteriza.”
Acrescenta ainda Igor: “É muito importante ter algum controlo sobre os meios de produção e aqui conseguimos manter uma relação estreita entre a sala de ensaios e o ateliê.” Nos intervalos das criações dos objetos manipulados e das marionetas dos seus espetáculos, vão inventando formas de dar vida ao local, com workshops mais relacionados com a sua área artística (vão, por exemplo, acolher agora os wips e wops do Festival Internacional de Marionetas do Porto, ver na página 24 desta edição) e aulas livres de dança contemporânea, karaté, ballet para miúdos e canto coral experimental. “Isto não é uma escola, são coisas que sabemos fazer e que pensamos que seriam interessantes para nos darmos a conhecer, pois não é só a encher salas que se chega ao público”, sublinha Igor. Tv. da Formiga, 65, Espaço 2, Piso 1, Porto > T. 22 370 0011/ 96 256 9656
![lm-mesa 325 06-10-16-4-1.jpg](https://images.trustinnews.pt/uploads/sites/5/2019/10/9781990lm-mesa-325-06-10-16-4-1.jpg)
“Conhecemos os vizinhos quase todos e reparamos que as pessoas também se conhecem”, constatam Leonor Sá e Mário Espinho que, há dois anos, abriram o Mesa 325
Lucília Monteiro
2. Mesa 325
Numa rua de moradias de finais do século XIX, a maioria de antigos brasileiros de torna-viagem, na Avenida Camilo, no Bonfim, poucos esperariam encontrar um café alternativo e saudável. Mas o Mesa 325, nascido há dois anos, tem-se revelado uma boa surpresa, a avaliar pelo número de lugares ocupados a meio de uma manhã de quarta-feira, dia em que o visitámos. A ideia de abrir uma “cafetaria confortável onde as pessoas pudessem ler um livro ou trabalhar no seu portátil”, já andava há muito na cabeça de Mário Espinho, arquiteto, e da mulher, Leonor Sá, farmacêutica. Foi só depois do nascimento do primeiro filho, há três anos, que o sonho de terem “um negócio próprio” começou a ganhar forma. O bairro não era novo para eles, especialmente para Leonor, que aqui viveu e cresceu com os pais. “Conhecemos os vizinhos quase todos e notamos que também as pessoas se conhecem entre si”, contam. E é este ambiente que querem levar para o interior da cafetaria. A maior parte das frutas e legumes usados para as saladas, sanduíches, quiches, recheio dos bagels e smoothies que têm na carta vem da frutaria da rua ao lado, as carnes do talho da freguesia, as revistas e jornais do dia são comprados no quiosque mais próximo. O bairro, garantem, tem outros atrativos como o facto de ainda ter estacionamento gratuito e de estar a uns minutos a pé da Baixa do Porto. Certo é que no Mesa 325 terá sempre um bom café à espera. A frase na parede (“Wake up and smell the coffee”) prepara-nos para o que a carta oferece: café de filtro 100% arábica, vietnamita (com leite condensado), americano, affogato (com bola de gelado), cold brew (café gelado), para consumir à mesa ou levar para a rua. “As pessoas costumam muitas vezes procurar os sítios pela comida, nós queremos distinguir-nos pela bebida”, assume Mário Espinho, que vai conciliando este negócio com a arquitetura. Já Leonor Sá deixou, por ora, o trabalho de farmacêutica e tem-se dedicado a tempo inteiro a este projeto. Mas não esconde que um dia “gostava de trabalhar na farmácia de manhã e à tarde no café”. Para não perder o contacto com o seu bairro. Av. Camilo, 325, Porto > T. 91 598 6691 > seg-sex 8h30-19h30, sáb 10h-19h
![LM-CAMPANHA SANDRA 07-10-16_-3-1.jpg](https://images.trustinnews.pt/uploads/sites/5/2019/10/9759918LM-CAMPANHA-SANDRA-07-10-16_-3-1.jpg)
A designer Maria Teixeira, do Studio RARO, foi uma das últimas a entrar no CACE Cultural do Porto. “Gosto muito de estar em Campanhã, tem esta paisagem maravilhosa”, aponta
3. Studio RARO
Os projetos são tantos, em mãos ou na gaveta, que a formação enquanto designer de comunicação e de interiores, com mestrado em produção gráfica, torna-se vaga para descrever o trabalho de Maria Teixeira no Studio RARO. Define-se, por isso, como “facilitadora criativa”. “Gosto de criar desafios e juntar as pessoas certas, a minha maior virtude é reconhecer e motivar talentos”, diz, referindo-se ao agenciamento de artistas e à criação de eventos (como o Mostrarte – Mostra Académica de Artes e Imagens), que ocupam parte dos seus dias. Ao mesmo tempo, Maria Teixeira aproveita para desenvolver o seu próprio produto, o Lumicroma, com o qual quer recuperar as antigas técnicas de reprodução fotográfica (projeto vencedor do programa ASA, da Associação Nacional de Jovens Empresários), seguindo processos químicos amigos do ambiente, aplicáveis em vários suportes (papel, tecidos ou pedras). A Studio RARO é, desde dezembro de 2014, uma das empresas residentes do CACE Cultural do Porto, uma incubadora ligada à área cultural e artística, instalada na antiga Central Hidroelétrica do Porto, junto ao leito do rio Douro. “Gosto muito de estar aqui, tem esta paisagem maravilhosa e uma série de equipamentos de que podemos usufruir”, conta. Assim o tem feito, promovendo formações muito distintas, sobre fotografia, cosmética natural, expressão corporal, escrita criativa, tricô, ilustração, maquilhagem e até cerveja artesanal. Os talentos, afinal, podem estar em qualquer lado. CACE Cultural do Porto > R. do Freixo, 1071, sala 6, Porto
![LM-DANIELA E HELDER 06-10-16_-3-1.jpg](https://images.trustinnews.pt/uploads/sites/5/2019/10/9759930LM-DANIELA-E-HELDER-06-10-16_-3-1.jpg)
Os mestres em turismo Hélder Barbosa e Daniela Alves desenharam um guia turístico pelo Bonfim. “Há muito para visitar nesta zona, que tem passado ao lado tanto da cidade como dos que aqui vivem”, lamentam
4. Explore Bonfim
O convite para criarem um guia de visita turístico pelo património do Bonfim acabou por fazer com que Hélder Barbosa e Daniela Alves tivessem (também eles) descoberto esta freguesia do Porto. Até então, os dois jovens, mestres em turismo e desenvolvimento de negócio, a viverem na Maia, conheciam a zona sobretudo pelas idas à Biblioteca Pública Municipal, pelas Fontainhas ou pela estação de metro do Campo 24 de Agosto. Quando começaram a fazer um levantamento sobre o património do Bonfim, respondendo ao convite que a junta de freguesia tinha feito ao Instituto Superior de Ciências Empresariais e de Turismo (ISCET), onde os dois estudavam, perceberam que “tinha muito mais para oferecer do que um simples local de passagem”. “Tem a Igreja do Nosso Senhor do Bonfim, o Museu Militar do Porto, a Casa-Oficina António Carneiro, o Parque de Nova Cintra, o Cemitério Prado do Repouso, as Fontainhas e até as três pontes S. João, Maria Pia e Infante”, enumeram. E outras histórias e património foram encontrando como a casa onde viveu Aurélio da Paz dos Reis, “o pai do cinema português”, que se encontra por estas ruas, mas, infelizmente, ao abandono. O Explore Bonfim está, desde há um ano, disponível na internet, dividido por quatro circuitos turísticos – Jardins, Pontes, Igrejas e Capelas e Um dia no Bonfim – que podem ser percorridos, numa manhã ou tarde, ao ritmo de cada um. www.explorebonfim.com > informações: Junta de Freguesia do Bonfim > Campo 24 de Agosto, 294, Porto > T. 22 519 4500
![LM-MIRA FORUM 04-10-16-5-1.jpg](https://images.trustinnews.pt/uploads/sites/5/2019/10/9759934LM-MIRA-FORUM-04-10-16-5-1.jpg)
O Mira Fórum de João Lafuente e Manuela Matos Monteiro têm mudado o panorama cultural de Campanhã. “Fala-se das capacidades destes lugares. São quase camaleónicos.”
5. Mira Fórum
A dois passos da estação de Campanhã, as portas altas de madeira, de cor bordeaux, não têm deixado indiferente quem passa pela Rua de Miraflor. Onde outrora se armazenava carvão, cereais ou vinho, novos moradores e projetos têm agora dado outra vida a esta zona ainda socialmente desfavorecida. Sobretudo, os quatro velhos armazéns comprados por Manuela Matos Monteiro e João Lafuente: o Mira Fórum, Espaço Mira e o Armazém 3 (o quarto será, em breve, a nova casa dos dois fotógrafos), uma consequência “natural” do facto de se “sentirem tão bem” nesta rua. O terceiro aniversário do Mira Fórum (celebrado a 5 de outubro) recebeu uma extensão do festival Encontros da Imagem de Braga (uma exposição sobre (O) Porto de José Bacelar preenche, até novembro, as paredes de pedra da galeria) e um concerto experimental da banda Soundful. “As pessoas vêm aqui e falam-nos das capacidades destes lugares. São quase camaleónicos”, diz-nos Manuela Monteiro. Expor os seus próprios trabalhos nestas paredes não está no horizonte do casal. Apenas “o registo de curadores” lhes importa e a possibilidade de convidar outras pessoas a fazer o mesmo.
Ao longo dos últimos três anos, o Espaço Mira e o Mira Fórum já receberam mais de uma centena de artistas, dezenas de exposições, sessões de cinema, performances, concertos, lançamento de livros e residências artísticas. Manuela Monteiro gosta de os definir como “facilitadores de experiências”. “Há um potencial muito grande de criatividade que os Mira permitem que se manifeste.” E que não se limita ao interior das quatro paredes. “Estabelecer relações afetivas com o lugar e as pessoas” foi sempre uma das preocupações de João e Manuela. “Tem havido um processo sólido de interação das relações. Quem vive aqui à volta diz-nos que agora, finalmente, falam bem de Campanhã”. Os dois fotógrafos agradecem e continuam de portas abertas para acolher novos projetos. R. de Miraflor, 155, Porto > T. 92 911 3431 > ter-sáb 15h-19h
![LM-DECK 04-10-16-4-1.jpg](https://images.trustinnews.pt/uploads/sites/5/2019/10/9759938LM-DECK-04-10-16-4-1.jpg)
“Se eu não estiver, o carteiro deixa-me as encomendas no café”, conta o designer André Henriques que trocou as Antas e a Baixa do Porto por Campanhã
6. Deck 97
Há três anos que André Henriques (conhecido por Deck 97) trocou a zona mais “nobre” das Antas e da Baixa do Porto por Campanhã. O designer e fotógrafo reabilitou um armazém de carvão da Rua de Miraflor e transformou-o na sua casa, um enorme loft que é também o ateliê e estúdio onde somos recebidos por Miga (o gato foi oferecido por Mundo Segundo, um dos membros dos Dealema, banda de hip hop de cuja imagem Deck 97 é o responsável). Foi em Londres, conta-nos, quando estudava na Central Saint Martins, que se apaixonou pela arquitetura dos lofts. Em Campanhã, concretizou um sonho, portanto. É a esta zona do Porto que André Henriques gosta de trazer os amigos, a maioria ligada à música e à cultura urbana. “É uma zona lovely, onde toda a gente se cumprimenta. Se não estiver em casa, o carteiro deixa-me as encomendas no café. É como morar num bairro.” Se pudesse, Deck 97 só lhe acrescentava “um parque verde mais próximo” e “um ginásio”, mas nada que lhe tirasse “o espírito de aldeia”. Ao mesmo tempo, “tem o ambiente ideal para criar”, diz o designer que também trabalha com os Mind da Gap, Bezegol, Sam The Kid e Fuse. E ainda é dele a capa do álbum Pelea, o novíssimo trabalho da espanhola Wöyza. De Campanhã para o mundo, pois.
![RDS_OPPIAcristianoPereira_05.jpg](https://images.trustinnews.pt/uploads/sites/5/2019/10/9759951RDS_OPPIAcristianoPereira_05.jpg)
“Aqui todas as pessoas se conhecem”, constata Cristiano Costa Pereira, professor e diretor artístico da Oppia