1. O Sexo das Mulheres
Anne Akrich
Anne Akrich chama-lhe uma revolução em curso, mas também podia dizer que é uma revolução imparável. A luta das mulheres (por igualdade, liberdade, respeito, emancipação) tem hoje cada vez mais força e meios. E o livro da escritora francesa, descendente de mãe polinésia e de pai judeu, tunisino, é um belo contributo para a extensão do campo desta luta. Em O Sexo das Mulheres (tradução de Telma Costa), relatam-se traumas pessoais mas também desejos íntimos. Denuncia-se o que há de mais básico no machismo, da mesma forma que se apontam outros silenciamentos. “Não acredito na reconstrução. Não acredito na resiliência. Acredito nos livros”, lê-se a certa altura. Essa crença permite-lhe fazer destes “fragmentos de um discurso belicoso” (subtítulo que glosa um famoso livro de Roland Barthes) um manifesto, um grito, uma catarse. Sempre entre a ironia e a franqueza, o humor e a frontalidade, sem deixar temas de fora e pedra sobre pedra. Quetzal, 176 págs., €17,70
2. Não Saí da Minha Noite
Annie Ernaux
Além de ser uma das melhores representantes da autoficção, Annie Ernaux também é, sem surpresa, uma extraordinária cultora de diários, géneros que se alimentam mutuamente. Oitavo título da escritora francesa (Nobel de Literatura de 2022), traduzido em Portugal (este por Tânia Ganho), Não Saí da Minha Noite é o diário dos três últimos anos de vida da mãe e o reverso do outro livro que lhe dedicou (Uma Mulher). É uma cerimónia do adeus, como a de Simone de Beauvoir, na qual a chamada “segunda infância” (a velhice) recorda a Ernaux os primeiros anos. É um espelho contínuo entre mãe e filha, num diálogo de silêncios, memórias e esquecimentos. Livros do Brasil, 88 págs., €13,30
3. Acolher
Claire Keegan
Numa época que se aposta tanto em super-heróis e em argumentos frenéticos e de humanidade impossível, a escritora irlandesa Claire Keegan remete-nos para um universo radicalmente oposto. Os seus livros, breves e escassos (nascida em 1968, acaba de publicar o quinto livro), são pequenas miniaturas (e pérolas), centradas em personagens que têm de descobrir o seu lugar no mundo e entender a linguagem dos afetos, não através do que se expressa mas do que não se diz e apenas se sugere. Em Acolher, de 2010, traduzido por Marta Mendonça, isso é dado pela narração (na primeira pessoa) de uma menina, que vai viver com os pais adotivos numa quinta, enquanto a família espera por mais um filho. Relógio d’Água, 80 págs., €16
4. A Voz das Mulheres
Miriam Toews
O caso acabou em tribunal, com os violadores condenados a longas penas de prisão. Porém, dentro da colónia menonista boliviana, o assunto abriu grandes feridas. Como tratá-las? É nessa reação que a escritora canadiana Miriam Toews centra o romance de 2018, A Voz das Mulheres (tradução de Ana Maria Pereirinha). Os homens que sedaram as jovens à noite já lá não estão, mas as mulheres e respetivas famílias não sabem se devem ficar (onde têm poucos direitos) ou se devem partir (e enfrentar o desconhecido). O debate é descodificado por um homem encarregado de fixar em ata os vários argumentos, traduzindo, afinal, o intraduzível: sofrimento, medos, anseios. Alfaguara, 176 págs., €17,70