A sinceridade é uma marca forte da escrita do brasileiro, filho de pais argentinos, Julián Fuks. Não no sentido de que tudo o que escreve é real ou autobiográfico. É certo que a sua vida e a da família são um tema central da sua literatura (o que era ainda mais claro em Resistência, de 2016), mas isso não faz das suas páginas um relato de histórias pessoais e memórias. Nos agradecimentos finais deste A Ocupação pode ler-se: “Aos meus pais, aos meus irmãos, pelo carinho inabalável e pela paciência da conversão em personagens.” A sinceridade de Fuks é, antes, uma espécie de fé de que a literatura o pode – nos pode – levar mais longe, revelar sentidos e verdades que só a escrita literária, livre, pode proporcionar.
Boa parte deste livro resulta da experiência do autor no antigo Hotel Cambridge, em São Paulo, ocupado em 2012 pelo Movimento Sem Teto do Centro, passando, então, a albergar pessoas sem–abrigo das mais variadas origens geográficas. Como observador, Julián subiu e desceu ali muitas escadas, registando histórias dos seus ocupantes. Isso não faz do livro uma espécie de reportagem, até porque ele é, ainda, habitado pela figura do pai, numa cama de hospital, ou pelos dias do narrador e da sua companheira às voltas com as questões levantadas por um primeiro filho – ter ou não ter? São várias as ocupações.
A Ocupação é, também, marcado pelo programa da Rolex Mentor and Protégé Arts Initiative, que juntou Fuks, “discípulo”, ao “mestre”, Mia Couto. Essa marca chegou ao ponto de – e é também disso que falamos quando dizemos “sinceridade” – um dos capítulos do livro ser uma carta de Julián Fuks ao escritor moçambicano (“Cada frase é uma tentativa de atravessar a fronteira, uma tentativa desastrada, frustrada como outras vezes”). Outro, é a resposta de Mia: “O facto é o seguinte, meu caro amigo: o mundo que nasce da tua escrita e dos teus livros é bem maior que as circunstâncias políticas que nos cercam.”