Desde cedo que os regimes se aperceberam do potencial do cinema enquanto arma de propaganda. Tal aconteceu sobretudo nos regimes autoritários e totalitários, como a Alemanha nazi, a União Soviética ou a Itália fascista. No Portugal salazarista, o cinema foi usado como propaganda de forma muito consciente, sobretudo no seu início, como meio de consolidação do ideário do Estado Novo. A tal ponto que, a partir de meados dos anos 30, o Secretário Nacional da Propaganda estabeleceu um programa de cinema ambulante (o Cinema do Povo), para combater o comunismo e promover o Estado Novo.

Maria do Carmo Piçarra, professora universitária e investigadora contratada da Universidade Nova de Lisboa, em Projectar a Ordem (Ed. Os Pássaros, 418 págs., €17) faz uma abordagem histórica desse período, num livro muito completo e cuidado, cheio de interessantes pormenores, com histórias da nossa História.
Os filmes eram projetados os quartéis, sindicatos, escolas, bairros, um pouco por todo o País acompanhadas pela devida doutrinação, para ter a certeza que a mensagem era clara. Ia de encontro a uma população analfabeta, que, em muitas casos, assistia a um filme pela primeira vez, tornando-se extremamente permeável. A aposta neste tipo de propaganda foi forte e eficaz. Um dos mais magníficos exemplos é a grande produção A Revolução de Maio, de António Lopes Ribeiro, uma longa-metragem ficcional em que um infiltrado comunista se convertia à ‘causa’ de Salazar.
Neste livro tudo isto está documentado e explicado, tornando-se uma obra importante para entender as subtilezas da ditadura portuguesa enquanto forma de fascismo.