
Luc303255lia Monteiro

Há muito que, no Brasil, o lançamento de um livro de Rubem Fonseca deixou de ser um acontecimento. Com os grandes romances arrumados no século passado (A Grande Arte, de 1983, ou Agosto, de 1990, por exemplo), a crítica já não se interessa pelos seus contos cada vez mais simples, como os que se reúnem em Calibre 22. A aparência de simplicidade, no entanto, pode ser enganadora.
Os contos do grande escritor brasileiro, Prémio Camões em 2013, têm vindo efetivamente a simplificar-se. Um cara, uma desatenção, um amor perdido, um tiro, várias mortes. Não é o esforço de escrita que mais se destaca nestes textos, antes o paradoxo literário que ergue.
Rubem Fonseca surgiu na cena literária brasileira em 1963, com o volume de contos Os Prisioneiros. Foi o descobrir de uma admirável literatura nova: urbana, violenta e erudita. Ao mergulhar no mundo do crime, o escritor captou uma sociedade em mudança, assente em rituais e em estéticas exuberantes, espelhados nas vítimas e nos matadores. O recurso à simplicidade (presente desde o início) tornou popular uma realidade que já o era. No Rio de Janeiro, em São Paulo e em outras cidades, era assunto quotidiano, diário, familiar – verdadeiro mas também ficcionado, na linha do bom policial norte-americano.
Os contos que lemos em Calibre 22 (nos quais reaparece a personagem mais célebre do autor, o advogado criminalista Mandrake) não se fixam num género nem aceitam rótulos. São, na verdade, histórias para todos os tempos. Têm a rapidez de uma mensagem no WhatsApp e confundem-se com os códigos de conduta das gestas medievais. São realistas na descrição do seu tempo, e pós-modernos na paródia autoconsciente que assumem. Com a emoção certa e a prosa sempre tensa, estes contos ligam o leitor à corrente. Histórias renovadamente contemporâneas.
Calibre 22 (176 págs., €15,50) chega às livrarias pela mão da renovada Sextante, agora estruturada nas coleções Ficção Contemporâ-nea, cujos primeiros lançamentos incluem ainda O Mar, de John Banville, e Aquiles, de Carlos Fuentes, e Biblioteca dos Tesouros, com Os Três Mosqueteiros e A Ilha do Tesouro