Foi aos 30 anos que Paulo Ribeiro, agora com 53, começou a ter hipertensão arterial, doença crónica que contribui para a principal causa de morte em todo o mundo: as doenças cardio e cerebrovasculares, como o enfarte agudo do miocárdio e o acidente vascular cerebral (AVC).
“Tinha visão dupla, sentia-me muito agitado e muito irritado com a família”, conta o funcionário público. Consultou vários especialistas e tomou vários tipos de medicamentos, que eram substituídos por outros a cada 15 dias ou mês, mas nenhum deles teve o efeito pretendido.
“Era um gasto significativo de medicamentos que depois iam para o lixo, porque de facto não eram suficientes para eu estar bem”, diz Paulo Ribeiro. Pelo contrário, testou medicação que estava a ter um impacto negativo na sua saúde. “O pâncreas estava a ser afetado com pelo menos dois medicamentos. Sentia um stress praticamente constante causado pela hipertensão na minha vida, já que os sintomas colocavam-me numa situação insustentável e afetavam a minha qualidade de vida, no trabalho, em casa… andava sempre muito nervoso e a hipótese de estar bem era praticamente nula”, conta.
A vida de Paulo mudou quando o seu cardiologista lhe falou acerca de uma técnica, a desnervação renal, “um procedimento minimamente invasivo que consiste em “destruir” nervos que envolvem as artérias renais”, explica à VISÃO Vitória Cunha, membro da Direção da Sociedade Portuguesa de Hipertensão (SPH) e especialista em Medicina Interna.
“É realizada através de um cateter inserido na veia femoral, que aplica radiofrequência, ou mais recentemente ultrassons, nas artérias renais de forma a reduzir os efeitos do sistema nervoso simpático no nosso organismo, que é um dos vários mecanismos envolvidos na hipertensão”, acrescenta a médica.
Para Paulo, este procedimento foi super eficaz, levando a uma redução da maioria da medicação que tomava para tentar controlar a doença. “Tomava 12 medicamentos e comecei a tomar três, um para a hipertensão, um para o coração e outro para os batimentos cardíacos”, diz. “O tratamento melhorou a minha vida em 99%”, acrescenta ainda.
A desnervação renal começou a ser aplicada de uma forma mais rudimentar nos anos 50, mas foi desenvolvida mais tarde e as publicações-piloto acerca da técnica aconteceram entre 2009 e 2010. “Houve um grande número de doentes submetidos a desnervação nos anos seguintes, mas entretanto saíram mais resultados que deixavam algumas dúvidas sobre a eficácia da técnica, pelo que esta foi abandonada durante vários anos”, diz Vitória Cunha, acrescentando que a prática só foi retomada mais recentemente, “depois de estudos mais sólidos com mais eficácia e segurança comprovadas”.
Em Portugal, esta técnica é realizada apenas em centros especializados, com cardiologistas treinados na técnica, explica a especialista. “Não pode, nem deve, ser realizada em qualquer pessoa com hipertensão arterial: está reservada para a pequena percentagem de pessoas com hipertensão verdadeiramente resistente”, defende a médica.
A doença pode afetar todas as artérias e causar problemas como insuficiência renal, alterações da visão, insuficiência cardíaca, doença arterial periférica (das artérias dos membros inferiores), disfunção erétil e demência. “Estas doenças estão associadas não só a uma elevada taxa de mortalidade, mas também de morbilidade, ou seja, de incapacidade e possível dependência de terceiros para manter uma qualidade de vida razoável”, afirma a especialista.
Vitória Cunha alerta para o facto de que, embora contribua “para o controlo da hipertensão e, em vários casos”, reduza “a quantidade de medicação necessária para manter valores adequados”, esta técnica “não cura a doença e não é eficaz em todos os indivíduos, daí a necessidade de selecionar adequadamente quem a pode realizar”.
E apesar de não ser comparticipada pelo Estado, a grande maioria da medicação para a hipertensão é e a sua toma regular, acrescenta a especialista, “consegue promover o controlo da doença numa grande percentagem de pessoas, reduzindo a probabilidade de doença cardio e cerebrovascular”.
Apesar de a hipertensão ter algum componente genético, os principais fatores de risco são modificáveis: o excesso de consumo de sal, o excesso de consumo de gorduras (saturadas e trans) e reduzido consumo de frutas e legumes, o sedentarismo, o excesso de peso, o excesso de consumo de bebidas alcoólicas e o tabaco. O sal pode ser reduzido e substituído, por exemplo, por ervas aromáticas, limão e alho, que podem dar sabor à comida sem contribuir de forma nefasta para a saúde. As gorduras saturadas e trans podem ser substituídas por gorduras insaturadas e mais “saudáveis”(por exemplo, o azeite) e devem ser evitados alimentos processados e pré-cozinhados. Já o exercício físico não precisa de ser um ginásio intenso ou uma maratona. Uma caminhada regular de 20 minutos algumas vezes na semana pode ser um excelente começo. Também já se concluiu que a poluição sonora, a poluição ambiental, o stress e a ansiedade e uma má qualidade do sono são outros contributos importantes para a hipertensão e devem ser evitados.