Sensações súbitas de calor e suores noturno com duração variável, entre dois e quatro minutos, em média, associadas a transpiração, palpitações, calafrios, tremores e ansiedade. Estes são os sintomas mais frequentes associados à menopausa, um processo biológico que assinala o fim do ciclo reprodutivo e ocorre entre os 45 e os 55 anos, afetando cerca de 70% das mulheres.
Os episódios de vasodilatação cutânea (na parte superior do tronco, do pescoço e da face) resultam da diminuição da produção de estrogénios, gerando desconforto e constrangimentos vários nos plano profissional, social e íntimo.
Até aqui, o protocolo clínico para minimizar estes sintomas passava pela terapia de reposição hormonal, geralmente nos dez anos após a paragem da primeira menstruação, e na condição de não existirem antecedentes de cancro da mama ou risco de problemas tromboembólicos ou do fígado.
Depois, veio o fezolinetant, um principio ativo não hormonal, capaz de bloquear uma proteína do cérebro (neurocinina-3) que intervém na regulação da temperatura corporal. Os ensaios clínicos iniciados há alguns anos revelaram-se promissores e, em março, verificou-se uma redução dos sintomas (graves e moderados) em mais de metade da amostra, que foi significativamente superior quando comparada com o grupo placebo.
‘Interruptor’ dos calores
Na primeira quinzena de maio, o regulador dos medicamentos dos Estados Unidos (Food and Drug Administration) deu luz verde para o uso da substância, uma solução a acrescentar ao arsenal terapêutico para prevenir sintomas vasomotores (afrontamentos ou calores).
Em dezembro, seguiu-se o ok da reguladora do Reino Unido (Medicines and Healthcare products Regulatory Agency). Segundo o jornal The Guardian, o novo fármaco atua como um ‘interruptor’ que pode facilitar a vida a muitas mulheres, beneficiando especialmente aquelas para quem a terapia de substituição hormonal não é aplicável.
Sob a designação comercial de Veoza, o medicamento chega em janeiro ao mercado britânico e será sujeito a receita médica. Por enquanto, o acesso ainda não é feito pelos serviços de saúde públicos, ou seja, o custo é elevado (uma embalagem mensal tem um custo superior a €500).
O medicamento passou pelo crivo da Agência Europeia de Medicamentos (EMA), tendo o parecer favorável do Comité de Medicamentos de Uso Humano (CHMP), a 12 de outubro. Dois meses depois, veio a aprovação da Comissão Europeia (CE).
Entretanto, o Infarmed fez saber que o fármaco “foi aprovado como medicamento sujeito a receita médica”, ou seja, “não está restringida a prescrição no âmbito da Autorização de Introdução no Mercado (AIM)”, detida pela farmacêutica Astellas. Já sobre o pedido de comparticipação, “até ao momento não foi solicitado”.
Contactado pela VISÃO, o laboratório não avançou pormenores sobre a data em que o fezolinetant será colocado no mercado português, bem como o seu custo estimado, mas é provável que esta opção terapêutica venha a estar disponível no próximo ano.
Soluções à medida
“A vantagem deste fármaco é bloquear os recetores de moléculas neuronais, no sistema nervoso central”, esclarece Fernando Cirurgião, diretor do serviço de Ginecologia do Hospital São Francisco Xavier, em Lisboa.“Este é um passo importante para a qualidade de vida das mulheres, já que um terço das suas vidas é passado em (pós) menopausa”, acrescenta o ginecologista-obstetra.
Na prática, o centro termorregulador situado no cérebro deixa de comportar-se como “avariado”, na sequência da baixa hormonal e, com isso, vão-se os incapacitantes afrontamentos e os suores noturnos. “As mulheres saudáveis podem sentir diferenças após um mês de toma diária mas, se deixarem de tomar, os sintomas voltam”, explica o médico.
Embora a sintomatologia tenda a diminuir, em frequência e intensidade, a verdade é que o processo pode durar alguns anos (por vezes mais de uma década). “A toma diária implica uma sobrecarga hepática, sobretudo para quem já tem problemas de fígado”, informa o clínico. Daí que seja necessário avaliar cada caso, na consulta médica, a fim de tomar a melhor decisão para gerir os afrontamentos.
Vale a pena lembrar, ainda, que além desta opção farmacológica, “há os fitoestrogénios (hormonas vegetais), com uma eficácia mais reduzida”, sob a forma de suplementos (vitaminas, isoflavonas de soja, extratos de plantas e ómegas). E que certos alimentos da dieta mediterrânica são ricos em fitoestrogénios. Eles estão presentes nas sementes de linhaça, no sésamo, no alperce seco, no grão e legumes, nas frutas e no chocolate negro.
Por fim, há evidência científica sobre os benefícios do exercício físico, de hábitos saudáveis e da gestão do stresse na redução dos sintomas vasomotores da menopausa.
