Ninguém gosta de estar de mau humor – à exceção do Gru e do Grinch, personagens cinematográficas bem conhecidas do público. Mas, e se nem tudo tiver de ser sombrio ou em modo de fúria num dia em que se acorda com os pés de fora?
As conclusões de um novo estudo, conduzido por investigadores da Universidade do Arizona, nos EUA, e publicado na revista Frontiers in Communication, dão ferramentas para se perceber de que forma o cérebro das pessoas reage à linguagem quando estão bem-humoradas versus de mau humor.
A verdade é que o mood afeta a maneira como se processa a linguagem e há forma de daí retirar benefícios. Quando alguém está mal-disposto, idealmente deve querer concentrar-se em tarefas mais analíticas, que precisem de mais minuciosidade. Nesses dias de cara fechada, sem um leve esgar, as pessoas podem ser mais rápidas a detetar inconsistências no que leem, por exemplo.
A equipa liderada por Vicky Lai, professora assistente de Psicologia e Ciência Cognitiva da Universidade do Arizona, trabalhou nesta pesquisa com Jos van Berkum, da Universidade de Utrecht, e Peter Hagoort, do Instituto Max Planck de Psicolinguística, ambos dos Países Baixos.
Inicialmente, manipularam o humor dos participantes do estudo mostrando-lhes excertos de um filme dramático, A Escolha de Sofia, ou de uma série televisiva de comédia, Friends. Enquanto, as imagens mais engraçadas não tiveram impacto no humor dos intervenientes, os clips tristes conseguiram alterar a disposição das pessoas, deixando-as mais negativas.
Depois do poder do elemento visual, seguiu-se o estímulo da audição. As pessoas ouviram uma série de gravações de áudio, emocionalmente neutras, de histórias compostas por quatro frases, cada uma contendo uma “frase crítica” que suportava ou distorcia o conhecimento de palavras padrão ou familiar. Palavra por palavra e a frase foi exibida no ecrã do computador, enquanto as ondas cerebrais eram monitoradas por eletroencefalograma.
Uma das histórias, sobre conduzir à noite, terminava com a “frase crítica”: “Com as luzes acesas, pode ver mais”; outra história diferente, sobre observação de estrelas, a mesma “frase crítica” foi alterada para: “Com as luzes acesas, pode ver menos”. Embora essa afirmação seja precisa no contexto da observação de estrelas, a ideia de que acender as luzes faria com que uma pessoa visse menos é um conceito muito menos familiar que desafia o conhecimento padrão.
Numa terceira fase, foram apresentadas versões das histórias em que as “frases críticas” foram trocadas para que não se encaixassem no contexto da história. Por exemplo, a história sobre conduzir à noite incluía a frase: “Com as luzes acesas, pode ver menos”.
Aí, o cérebro reagiu às inconsistências, dependendo do humor: os participantes mais mal-humorados mostravam um tipo de atividade cerebral intimamente associada à revisão.
“O humor e a linguagem parecem ser suportados por diferentes redes cerebrais. Mas nós temos um cérebro, e os dois são processados no mesmo cérebro, por isso há muita interação”, explica Vicky Lai.
Em 2018, outra investigação feita pela Universidade de Waterloo, com 95 participantes que completaram nove tarefas distintas e questionários que medem a interação do humor, reatividade emocional e vários desafios analíticos e de memória de trabalho, concluía algo semelhante. As pessoas mais reativas, as que têm respostas emocionais rápidas, intensas e duradouras, tiveram melhor desempenho em tarefas de funções executivas quando estavam de mau humor. As menos reativas apresentaram o efeito oposto, com o mau humor associado a pior funcionamento executivo. O mau humor pode ajudar em algumas tarefas que requeiram habilidades executivas, mas apenas para pessoas que são mais reativas emocionalmente.
Os participantes do estudo atual, 34 mulheres, completaram a experiência duas vezes, uma de mau humor e outra com boa disposição, com uma semana de intervalo e foram pagas por autorizarem fazer o exame médico ao cérebro. Desta vez, os investigadores recrutaram apenas mulheres, porque a manipulação do humor mostrou anteriormente ser mais bem-sucedida do que em homens.
“Ao pensarem em como o humor as afeta, muitas pessoas consideram coisas como ficar mal-humorado, comer mais gelado ou, na melhor das hipóteses, interpretar a fala de outra pessoa de maneira tendenciosa. Mas, há muito mais a acontecer em recantos inesperados das nossas mentes. Isso é realmente interessante. Imagine o laptop ser mais ou menos preciso em função do nível da bateria – isso é impensável. Mas no processamento de informações humanas, e presumivelmente também no de espécies relacionadas, algo semelhante pode estar a acontecer”, descreve Jos van Berkum, da Universidade de Utrecht.
O humor ganha assim uma importância maior na hora de decidir que tarefa fazer e aproveitar o mau humor para melhor analisar, parece ser uma boa ideia.