Estudos recentes indicam que os cães podem ser importantes aliados não apenas na contenção da Covid-19, mas também na identificação de casos da Covid Longa. O olfato canino é milhares de vezes mais forte do que o de qualquer humano, razão pela qual os cães são normalmente recrutados pela polícia para detetarem a presença de narcóticos ou explosivos. Mais recentemente, também a medicina pareceu encontrar nos cães uma ajuda valiosa com várias pesquisas a apontarem o olfato canino como capaz de farejar evidências de cancro e outras doenças com bastante precisão.
O recurso ao olfato canino para identificar casos positivos e de Covid Longa poderia ajudar numa contenção mais eficaz do vírus dado que permitiria fazer uma identificação rápida de indivíduos que estivessem contaminados pela Covid sem ser necessário que os mesmos fossem sujeitos a testes. Por outro lado, detetar a presença da condição mais comumente conhecida por Covid Longa poderia ser não apenas extremamente benéfico para os pacientes como também para os médicos, ajudando na compreensão das razões por trás da mesma.
A Covid Longa ou condição pós-Covid é, de acordo com o Sistema Nacional de Saúde português, um “conjunto de sintomas tardios em algumas pessoas com história provável ou confirmada infeção por SARS-CoV-2, habitualmente 3 meses após início da fase aguda e com, pelo menos, 2 meses de duração. Os sintomas podem desenvolver-se durante ou após a infeção aguda por SARS-CoV-2”. Um dos principais problemas sentidos pelas vítimas da Covid Longa é serem diagnosticadas corretamente uma vez que nem sempre os sintomas são associados a esta condição. Muitos pacientes de Covid Longa não são capazes de provar que haviam sido, a dado momento, infetados pelo vírus, principalmente se adoeceram no início da pandemia, antes de os testes estarem amplamente disponíveis, o que se torna um obstáculo a que tenham acesso aos cuidados adequados. Poderão os cães ajudar?
A resposta não é tão simples como um sim, mas pode ser um talvez. Vários estudos levados a cabo em diferentes locais como os Estados Unidos, Reino Unido ou Alemanha levam a crer que os cães são capazes de identificar através do cheiro indivíduos que testam positivo à Covid-19. Um outro estudo publicado pela primeira vez em janeiro procura agora demonstrar que o olfato canino pode ser igualmente eficaz a identificar casos de Covid Longa, o que não quer dizer que vão ser utilizados para esse fim. No estudo em causa, nenhum paciente foi de facto diagnosticado com Covid Longo pelos cães até porque os participantes foram escolhidos por terem já esse diagnóstico prévio. Os cães foram apenas capazes de identificar em 23 dos 45 pacientes a condição em causa, atingindo uma taxa de precisão de 51%.
No estudo publicado inicialmente na MedRxiv e mais tarde no Journal of Clinical Trials, os cães identificaram os 23 pacientes de Covid Longo através de amostras de suor dos mesmos. Ao farejarem outras 188 pessoas escolhidas por não terem Covid Longo, os cães não identificaram nenhum caso. A taxa de precisão estabelecida pode estar, inclusive, a ser subestimada, segundo a coautora Emilie Seyrat, porque algumas amostras tiveram de ser enviadas pelo correio durante o verão e, portanto, podem ter sido comprometidas pelo calor e pelo tempo, destaca a Time.
A Covid Longa continua a ser uma condição que intriga muitos na comunidade médica nomeadamente por não existir ainda uma explicação para o facto de algumas pessoas desenvolverem sintomas crónicos após contraírem Covid-19. Uma das principais hipóteses postas é que os resíduos do vírus permanecem no sistema de algumas pessoas, continuando a, potencialmente, replicar-se e causando, por isso, problemas de saúde duradouros.
O facto de os cães serem capazes de farejar compostos do vírus mais de um ano depois de as pessoas ficarem doentes vem apoiar essa hipótese, explica, segundo a Time, Dominique Salmon-Ceron, especialista em doenças infecciosas do Hospital Hôtel-Dieu em Paris e outro autor do estudo. “Os nossos resultados aumentam o argumento de que o vírus provavelmente pode persistir (no organismo)”.
Também por esta razão não é possível assumir de imediato que os cães poderão ser usados para diagnosticar a condição até porque a persistência viral é bastante diferente do diagnóstico de uma doença complexa como a Covid Longa, garante Salmon-Ceron, e pode não ser, necessariamente, uma indicação da mesma.
Ainda assim, os dados recolhidos trazem consigo boas notícias. Os cães poderão ser um elemento-chave na compreensão da condição por parte da comunidade médica, além de poderem ajudar não a diagnosticar os pacientes, já que esse é um processo complexo, mas, eventualmente, a provar que essa poderá ser uma hipótese de diagnóstico, nomeadamente junto daqueles pacientes incapazes de garantir que contraíram a Covid-19. “Ninguém acreditava neles (nos pacientes), exceto alguns médicos”, diz Salmon-Ceron. Agora, talvez os cães possam ajudar.
A medicina humana pode ter encontrado o seu próximo grande aliado nos cães. Outros estudos mostraram que o olfato canino consegue identificar com taxas de precisão que rondam os 91%, e por vezes ultrapassam, casos positivos à Covid. Poderiam os cães ser uma alternativa mais barata e sustentável na testagem em locais como aeroportos? As possibilidades são imensas e o melhor amigo do homem volta a provar ser uma ajuda indispensável.