O número de novos casos de Covid-19 tem vindo a aumentar em Portugal. Na última semana, foram cerca de 11 mil por dia. Certo, a doença já não leva tantas pessoas à urgência e as mortes parecem quase residuais, quando comparadas com o pico da pandemia. Porém, não podemos ignorar que, na última semana, morreram, por dia, cerca de 18 pessoas, sendo a maioria delas os suspeitos do costume: doentes com mais de 80 anos e doenças associadas.
E se existisse um antiviral capaz de complementar a ação da vacina e de reduzir a probabilidade de estes doentes de risco irem parar ao hospital, terem doença grave e morrerem? E existe mesmo. Chama-se Paxlovid, mas ainda não está disponível no nosso País, nem se sabe quando estará. Nos Estados Unidos da América é campeão de vendas e também já foi aprovado no Brasil. Por cá, aguarda-se a norma da DGS.
Segundo o pneumologista Filipe Froes, perante o que está a acontecer agora em Portugal, a aposta deveria ser feita, precisamente, nas medidas que diminuem o impacto da gravidade da doença, “nomeadamente, o reforço da vacinação e um acesso mais fácil a outras terapêuticas, que já existem noutros países, como os anticorpos monoclonais neutralizantese e os novos antivíricos, dos quais o Paxlovid é um deles”.
Utilizado há alguns meses em certos países, nomeadamente nos EUA, o medicamento já foi aprovado pela Agência Europeia do Medicamento e, em janeiro deste ano, a Direção-Geral da Saúde disse que iria adquirir o fármaco, embora sem especificar quando é que este iniciaria a ser utilizado. Filipe Froes sublinha que “este tipo de medicamentos é muito bem vindo em Portugal e necessário nesta fase de combate à pandemia, que é diferente da fase inicial”.
Segundo o médico, o fármaco “é essencial, sobretudo na altura em que nos encontramos, por contribuir significativamente na diminuição do impacto da gravidade e da mortalidade nas pessoas mais vulneráveis”.
O medicamento previne a evolução para doença grave, traduzida pela necessidade de hospitalização. “Vem complementar a abordagem da Covid, sobretudo para os doentes que, apesar de terem sido vacinados, não conseguem montar uma resposta imunológica à vacina que os proteja da evolução da doença para formas graves”.
Paxlovid em Portugal para quando? Não se sabe
Perante a importância do Paxlovid, surge a dúvida: Por que razão não está ainda disponível no nosso País? Desde janeiro, que a DGS estará a preparar uma norma “para a utilização o mais racional e equitativa possível deste medicamento”, afirma Filipe Fores.
Na norma estarão, de facto, descritos os critérios de elegibilidade para que se possa aceder ao fármaco. Porém, quando contactada pela VISÃO, a DGS comunicou que tal norma não tem ainda, sequer, uma data prevista de saída.
Outra informação que deverá constar no documento é a forma como a distribuição do medicamento será feita. Tomando como exemplo a campanha de vacinação e o que costuma acontecer com a maioria dos medicamentos de ambulatório, poder-se-ia supor que o processo dependerá das ARS, ou seja, de um circuito centralizado para a distribuição, em tempo útil, do medicamento.
Porém, a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT), que “está a acompanhar o processo relacionado com a utilização do medicamento Paxlovid, liderado pelo INFARMED e pela DGS)”, indicou à VISÃO que, apesar de os circuitos de distribuição e de disponibilização do medicamento ainda estarem a ser finalizados, “o objetivo transversal a todo o País é que haja um contacto direto do utente com a Linha SNS 24”.
Apesar de aguardar ainda a publicação da norma da DGS para saber mais informações, A ARSLVT informou também que, partir do contacto com o SNS24, “deve-se avaliar a pertinência de utilização do medicamento e informar o doente do local em proximidade onde um médico confirmará o seu diagnóstico, e caso se adeque, o medicamento será disponibilizado”.
Resta saber se este será um sistema verdadeiramente ágil. Basta pensar nos primeiros meses da campanha de vacinação.
No futuro, após o fim da pandemia, Filipe Froes afirma que o cenário ideal seria aquele de uma “prescrição pelo médico assistente e de levantamento na farmácia habitual”. Por agora, pela pouca disponibilidade do fármaco, “tem de se garantir que o medicamento tenha, sobretudo, critérios de maior equidade e justificação de utilização. Temos de dar mais às pessoas mais graves”.
O que é o Paxlovid e como funciona?
Desenvolvido pela Pfizer, este é um inibidor de replicação viral, ou seja, vai inibir uma enzima necessária à replicação do vírus. “É um fármaco que tem registos de pré-autorização de elevada eficácia, na ordem dos 88%, na prevenção da necessidade de hospitalização ou morte”, sublinha Filipe Froes.
O pneumologista considera o medicamento “essencial para controlar a circulação do vírus na comunidade e, sobretudo, para diminuir a gravidade da pandemia na população, sobretudo na mais vulnerável”.
Assim, os doentes que tiverem indicação para tomá-lo são aqueles onde há fatores de risco para doença grave, seja pela idade, imunodepressão ou obesidade, por exemplo.
O Paxlovid deve ser usado o mais precocemente possível, idealmente nos primeiros cinco dias de diagnóstico, pois, “tal como qualquer fármaco anti infeccioso, quanto mais precoce for a sua utilização, maiores são os benefícios”, explica Filipe Froes. O pneumologista sublinha que a precocidade da toma evita também a necessidade de hospitalização.
São tomados dois comprimidos ao dia, durante cinco dias.
Defeitos do Paxlovid
Nem tudo é perfeito e existem duas questões relativas ao Paxlovid que Filipe Froes considera dignas de nota. O medicamento “tem algum acréscimo de incompatibilidades e de interações com outros medicamentos que obriga, ou a suspender essa medicação, ou a ajustar a dose” .
Tem também sido referido, nos EUA, que entre 1,5% a 2% das pessoas que fazem esta terapêutica podem, passados poucos dias, voltar a ter infeção por SARS-CoV2.