As terapias de anticorpos monoclonais neutralizantes têm-se demonstrado altamente eficazes em impedir que pacientes de alto risco com Covid-19 sejam hospitalizados. No entanto, recentemente, dois grupos de investigadores alemães descobriram que os tratamentos deste género, desenvolvidos pelas empresas Eli Lilly e Regeneron, perdem eficácia quando expostos, em testes laboratoriais, à variante Ómicron.
“A atividade neutralizante de vários anticorpos monoclonais é fortemente afetada contra a variante Ómicron e limitará as opções de tratamento para a Covid-19, com a variante Ómicron”, afirma uma das equipas, no artigo publicado online, ainda a aguardar revisão pelos pares.
O segundo grupo de investigadores observou que o tratamento da Eli Lilly não conseguiu inibir o vírus da variante Ómicron de entrar nas células humanas e que o da Regeneron foi “ineficiente” na inibição da variante.
Segundo o The New York Times, em Nova York, os administradores dos hospitais NewYork-Presbyterian, N.Y.U. Langone e Mount Sinai disseram, nos últimos dias, que parariam de dar aos pacientes os dois tratamentos em questão.
As notícias não são, no entanto, todas más. O sotrovimab, anticorpo monoclonal neutralizante do laboratório britânico GlaxoSmithKline (GSK), parece ser capaz de combater a nova variante, segundo os mesmos grupos de investigadores alemães. A GSK, por seu lado, garantiu também que o tratamento experimental permanece ativo “contra as principais mutações da nova variante Ómicron”, de acordo com dados pré-clínicos.
Classificado, no final de junho, pela Comissão Europeia, como um dos cinco tratamentos mais promissores para a Covid-19, a terapia monoclonal, desenvolvida em parceria com o laboratório californiano Vir Biotechnology, permite, graças a uma única dose, reduzir em 79% o risco de hospitalização e morte em adultos com alto risco de apresentar sintomas.
A terapia já foi aprovada pela Food and Drug Administration (FDA), nos Estados Unidos, pela Agência Britânica do Medicamento, no Reino Unido, e pela Agência Europeia do Medicamento (EMA) na Europa, não sendo, ainda assim utilizado em todos os países europeus, como por exemplo em Portugal.
Muita procura e pouca oferta
Nos Estados Unidos, onde as três terapias estavam já a ser amplamente utilizadas em meio hospitalar, os médicos expressaram preocupação. Se o sotrovimab era já muito procurado antes mesmo do surgimento da Ómicron, atualmente, o fornecimento da única terapia que não perdeu eficácia perante a nova variante é muito limitado.
Espera-se, ainda assim, que a situação melhore nas próximas semanas, já que o governo Biden está em negociações com a GSK “para garantir que mais doses sejam entregues no início do próximo ano”, revelou um funcionário do governo norte americano ao The New York Times.
Na Europa, o cenário é um pouco diferente. Além do Ronapreve (o equivalente ao Regeneron americano que se verificou ineficaz a inibir a Ómicron) e do sotrovimab da GSK, a EMA aprovou ainda o Regkirona da Sul Coreana Celltrion, a qual anunciou ter acelerado o desenvolvimento de um “cocktail” de anticorpos neutralizantes criado para atingir as mutações do SARS-CoV-2 em novas variantes, incluindo ómicron.
Além disso, como explica o pneumologista e coordenador do Gabinete de Crise para a Covid-19 da Ordem dos Médicos, Filipe Froes, “o tratamento da Ely Lilly foi um fármaco inicial e já tinha sido desaprovado quando se verificou ineficaz contra a variante Delta”.
Apesar de, até agora, os estudos indicarem um conjunto de sintomas mais leves associados à variante Ómicron, Filipe Froes sublinha que “não nos podemos esquecer que esta variante foi detetada a 11 de novembro, decretada variante de preocupação pela OMS a 26, detetada em Portugal a 28 e ainda está no início da sua atividade a nível mundial”. Ou seja, se há muitas coisas que já sabemos, o pneumologista refere que há outras em relação às quais ainda existem algumas dúvidas, como é o caso da gravidade.
No entanto, o facto de a Ómicron escapar a dois dos tratamentos existentes com anticorpos monoclonais não é particularmente preocupante, segundo Filipe Froes. Esses dois tratamentos já não eram muito utilizados atualmente, explica o médico.
“O que temos de usar agora são os tratamentos mais recentes, que demonstraram manutenção da eficácia perante a variante Ómicron”. É o caso da terapia da GSK e do tixagevimab/cilgavimab, outra terapia monoclonal, desenvolvida pela AstraZeneca, que aguarda aprovação.