“É bom que tenhamos esta noção bem firme: é das doenças cardiocerebrovasculares, em que hipertensão é o seu principal contributo, que os portugueses morrem”, garante à VISÃO Manuel de Carvalho Rodrigues, médico no Centro Hospitalar da Cova da Beira, na Covilhã, e ex-presidente da Sociedade Portuguesa de Hipertensão (SPH), quando questionado sobre a forma como a pandemia influenciou os doentes hipertensos.
Segundo dados da SPH, este problema é, na verdade, o que, “individualmente”, mais contribui para a morte por doença cardiovascular, sendo também um fator que aumenta os riscos de enfarte, AVC e insuficiências cardíaca e renais. E, apesar de, nos últimos anos, as taxas de controlo de hipertensão terem aumentado consideravelmente – em 2017, a percentagem já era de 50%- Vítor Paixão Dias, atual presidente da SPH, admite que, devido à pandemia, este valor possa estar a sofrer um decréscimo considerável.
Não só os portugueses deixaram, durante a quarentena, de ir à farmácia medir a sua pressão arterial pelo risco de ficarem infetados, como as atenções se centraram no combate à Covid-19, descurando-se outros problemas essenciais.
“Numa primeira fase, aceitou-se e entendeu-se que doenças e fatores de risco cardiovasculares, como é o caso da hipertensão, possam ter passado para segundo plano em termos de preocupação e de atenção dispensadas por parte dos serviços de saúde e dos clínicos, de uma forma geral”, afirma Manuel Carvalho Rodrigues. “O que já não se compreende é que, passados estes meses todos, se continue a consumir a 100% todo o tempo e todas as energias em torno da pandemia em detrimento de uma doença que, diretamente ou indiretamente, é a principal causa de morte em Portugal“, continua o médico.
Uma vez que, segundo dados do SPH, 50% das pessoas em Portugal com pressão arterial elevada não sabem que têm, realmente, tensão alta, esta situação torna-se ainda mais crítica e a necessidade de haver um controlo regular dos valores da pressão arterial é urgente. “Numa década, conseguimos reduzir em 46% a mortalidade por doença cardiovascular e AVC, muito à custa do excelente trabalho realizado ao nível dos cuidados de saúde primários. E estes resultados animadores são o caminho certo a percorrer, mas não nos podemos desviar”, afirma o médico.
“A pandemia não é, nem nunca pode ser, a razão para esquecermos ou deixarmos de recorrer aos serviços de saúde quando precisamos de ser auxiliados, caso a tensão arterial não esteja controlada”, alerta.
Medir regularmente a tensão arterial é o primeiro passo
A tensão arterial está controlada quando os valores se encontram abaixo dos 140 / 90 mmHg. Se os números superarem este intervalo, a tensão arterial não está controlada. “Nestes casos, podemos e devemos modificar o nosso estilo de vida, reduzindo o sal que usamos na nossa comida, por exemplo. Mas não nos vamos livrar de passar a fazer medicação”, esclarece Manuel Carvalho Rodrigues. “Se perceber que os valores estão, por norma, acima dos valores recomendados, é importante que consulte o seu médico. Ninguém vai saber aconselhá-lo melhor sobre o que fazer”, afirma.
Neste momento, apenas uma em cada cinco pessoas tem a sua pressão arterial controlada e estima-se que cerca de metade dos doentes não adere, em parte, à toma diária de medicação para controlo da hipertensão. Por isso mesmo, fazer com que a medição da tensão passe a ser uma ação do dia-a-dia é o primeiro passo para ajudar no controlo da hipertensão e, claro, para auxiliar na prevenção de várias doenças cardiovasculares.
Além disso, acrescenta, é essencial adotar-se um estilo de vida saudável, alterando ou criando hábitos que possam ajudar a manter a tensão dentro dos valores normais: praticar exercício físico com regularidade, fazer uma dieta rica em frutas e legumes, reduzir o stresse e deixar de fumar são alguns deles.