Este é um tempo de infinita, fácil e acessível informação, outra tanta contrainformação e, ainda, muito mais opinião, praticamente sem escrutínio. Rodeados de crise por todos os lados, o apelo a emoções distópicas encontra aqui um substrato fértil. O futuro, que, entretanto, antecipou a chegada, com muitas das ocorrências que nos batem à porta – secas, ondas de calor, cheias, de grau e intensidade pouco vulgares –, mostra-nos onde estamos. Isto não são casualidades e os próximos anos não vão ser melhores. Não é mais possível disfarçar, ou adiar o tema para daqui uns anos, talvez para a próxima cimeira sobre o clima. Os diferentes equilíbrios dos ciclos da Terra ajustam-se e algumas das consequências conhecemo-las e vamos senti-las, cada vez mais.
Mais ou menos, este é o quadro global. Acontece que em Portugal, desta vez, a coisa é bem mais grave, pois a nossa posição geográfica, bem para cá dos Pirenéus, no contacto/convergência de placas tectónicas, banhados pelo Atlântico e influenciados pelo Mediterrâneo, não nos ajuda, é a nosso desfavor. Portugal é, na verdade, perigoso nas ocorrências e riscos naturais. A geografia não nos ajuda e a geologia é-nos fatal e provoca a enorme perigosidade de Portugal. Nesta equação acresce outra significativa parcela, a nossa comprovada incompetência para gerir o território. Daqui resultam uma grande variabilidade de contextos e fenómenos e uma enorme indeterminação e incerteza; uma realidade que não podemos ignorar. Mas fingimos que não sabemos e, até ver, quando qualquer ocorrência nos bate à porta, reagimos e fazemos mais um estudo e um plano.
Sabemos que ocorrências catastróficas já aconteceram e vão voltar a acontecer em todos os locais, aqui não há as habituais dicotomias litoral-interior, norte-sul, ricos-pobres… Também temos a certeza de que os meios de ação disponíveis (humanos e materiais), em caso de ocorrência, são sempre mais escassos que o necessário, e que, às vezes, vezes demais, não funcionam e atuam como deviam. Tudo isto são certezas. A grande incerteza é saber, o quê, quando e onde?
É urgente prevenir em vez de reagir, que é muito mais caro e muito menos eficaz. Necessitamos de mapas de risco, que devem conduzir a outros de “recomendações e limitação ao uso do território”, que, por sua vez, devem definir zonas com diferentes níveis de perigosidade, apoiar os planos de proteção civil, orientar a política de redução de risco e a possível monitorização com sistemas de emergência e alerta. Só uma ação deste tipo tem a seriedade do efeito de mitigação e adaptação, designadamente à tão presente tragédia climática.
A próxima seca deve começar a ser gerida agora, nomeadamente na agricultura que escolhemos. Como é nosso hábito, no tempo certo, esquecemos a limpeza de linhas de água e planos de ação local (algo muito diferente de qualquer coisa emanada a partir da Proteção Civil de Carnaxide ou de uma bonita e moderna rulote ou contentor, em plena ocorrência) é o mínimo e já, porque já é tarde. Lisboa, Madeira, Açores, Baixo Mondego são bons exemplos de territórios críticos. Para não citar o imenso discreto e “anónimo” território hidrológico que em situação de pico extremo assume grave risco. E como estamos habituados, rapidamente nos acenaram com a magia da mentira dos milhões: o Plano de Drenagem de Lisboa, que muito vai gastar, pouco minimizar e quase nada resolver – é assim em todas as grandes cidades do mundo.
Persiste um comportamento ecológico individual e coletivo, público e privado, que urgentemente tem de mudar e possibilitar a antecipação do que aí vem. A incontornável transição ecológica só será politicamente possível se for cientificamente necessária e socialmente desejável. Uma nova vivência na Terra exige mais proximidade, mais lentidão, mais justiça e mais felicidade.
Entretanto, se conhecermos um pouco da história e da vida do planeta, facilmente descobrimos que nada de novo há na Terra.