Investigadores da Smithsonian Institution calculam que, só nos EUA, morram entre 365 milhões e mil milhões de aves por ano em colisões contra janelas e outras barreiras transparentes. A American Bird Conservancy aponta para um número mais próximo de mil milhões – três vezes a população humana do país.
O problema parece estar a crescer, o que tem levado vários países a recolher informação para tentar perceber as zonas e os tipos de estrutura mais letais. Algumas dessas recolhas mostram que não são só as janelas dos prédios e as barreiras acústicas das autoestradas a matar aves: em Valência, Espanha, os dados apontam para milhares de mortes em campos de padel.
Em Portugal, ainda há muito pouca informação sistematizada sobre as quantidades de animais e as espécies que mais morrem, mas a organização não governamental SPEA (Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves) quer mudar isso, com uma campanha dirigida aos cidadãos: “Viu uma ave a voar contra um vidro? Diga à SPEA.”
“O objetivo é recolher informação base, para compreender as espécies afetadas e identificar pontos críticos, como uma fachada que está a causar muita mortalidade, e então agir sobre esse local”, explica Hany Alonso, responsável pela iniciativa na SPEA. Qualquer pessoa que veja uma ave morta, ferida ou atordoada no embate contra uma barreira, ou outros sinais (como marcas de penas num vidro), pode ajudar a resolver o problema, reportando a situação num formulário, no site da associação.
As aves que mais morrem
Ainda antes da campanha, lançada esta terça-feira, 19, já há sinais de que os campos de padel são, tal como em Valência, um problema sério em Portugal. “Pela informação que temos recebido, muitas aves estão a morrer em colisões contra as barreiras transparentes dos campos de padel, até porque são infraestruturas muitas vezes inseridas em espaços verdes, onde há aves”, diz Hany Alonso.
A transparência das superfícies não é o único problema. Muitas vezes, as janelas fazem de espelho, refletindo, por exemplo, árvores de um jardim em frente.
Diferentes “pontos negros” terão soluções distintas, continua o investigador da SPEA. “Usa-se muito a colocação de silhuetas de aves nas barreiras transparentes, mas não são muito eficazes, porque as aves continuam a colidir noutras zonas onde essas silhuetas não se encontram. Tem de haver uma boa cobertura. Uma solução que tem mostrado algum sucesso é colar uma superfície adesiva com uma série de pontos que torna a barreira mais visível. Há formas relativamente simples de marcar a presença da estrutura minimizando o impacto visual.”
Entre as espécies mais sensíveis aos vidros e acrílicos estão as de voo muito rápido, como os gaviões, os açores e os guarda-rios, que não têm tempo de se desviar quando se apercebem da barreira. “Em Portugal, há um risco muito grande com estruturas destas perto de ribeiras, porque é o habitat dos guarda-rios”, sublinha Hany Alonso. “Temos também exemplos no nosso país de gaviões, que em Espanha são mesmo das espécies mais afetadas e a que aparece mais em centros de recuperação.”
Outras aves que morrem em grande número são as típicas de ambientes urbanos, acrescenta Hany Alonso, “como melros, toutinegras e pardais”. “Um grupo crítico é o dos pequenos migradores: muitas vezes, durante o período de migração, fazem paragens em zonas que não conhecem, e portanto não conhecem os obstáculos.” É por esta razão que é igualmente importante saber quais as épocas do ano mais problemáticas.
Reconhecido cada ponto crítico, a SPEA entra em contacto com as entidades que gerem esses edifícios ou estruturas para, em conjunto, tentarem implementar soluções para reduzir os acidentes. Mas o primeiro passo terá de ser dado pelos cidadãos – salvar as aves começa nas pessoas comuns.