Os gorilas-da-montanha que vivem no Parque Nacional dos Vulcões do Ruanda, país da África Oriental, encontram-se com frequência com seres humanos. Em qualquer dia, os animais podem cruzar-se com turistas de telemóvel em riste, biólogos a recolherem amostras de fezes ou veterinários que ali vão para lhes administrar antibióticos.
Há dois anos, quando o coronavírus começou a espalhar-se por todo o mundo, os especialistas estavam preocupados com a possibilidade de as pessoas puderem passar o vírus, de forma involuntária, para os macacos em vias de extinção, conhecidos por serem vulneráveis a uma variedade de microrganismos patogénicos humanos.
“Anteriormente, outros vírus humanos causaram doenças respiratórias nos gorilas”, disse Kirsten Gilardi, diretora executiva da Gorilla Doctors, uma equipa internacional de veterinários que cuida de gorilas selvagens ao jornal The New York Times.
Em março de 2020, num esforço para proteger os animais, o Ruanda fechou temporariamente o seu Parque Nacional dos Vulcões e quando o voltou a abrir, alguns meses depois, tomou precauções rigorosas, como exigir aos turistas e investigadores o uso de máscaras e manterem distância física dos gorilas. Regras, que além de terem provocado uma queda geral no turismo, fizeram com que os gorilas do parque tivessem relativamente poucos encontros próximos com humanos durante a pandemia.
O que até hoje faz com que não existam sinais de coronavírus entre os gorilas. O que aconteceu com os animais, foi o mesmo que se passou com os humanos. Ao tentar-se controlar uma ameaça, também se travou a transmissão comum de doenças respiratórias de humanos para grandes símios. Desde março de 2020, o número de surtos de doenças respiratórias entre os gorilas do parque caiu de uma média pré-pandemia de 5,4 surtos entre grupos familiares para apenas 1,6 por ano. Descobertas que entretanto foram publicadas na Nature, em fevereiro passado, num relatório co-escrito por Prosper Uwingeli, diretor-chefe do Parque Nacional dos Vulcões.

A análise é preliminar e os investigadores não podem provar que a saúde dos gorilas melhorou porque os humanos mantiveram a distância. Mas, as descobertas sugerem que, mesmo após o declínio da pandemia, controlos mais rígidos podem ser necessários para ajudar a proteger os macacos ameaçados de apanharem doenças das pessoas.
“O mesmos tipo de ações que podem proteger os animais selvagens mais suscetíveis da Covid também pode protegê-los de outros patogénicos humanos”, disse Thomas Gillespie, da Emory University que frequentemente trabalha com primatas selvagens.
Pouco mais de mil gorilas-da-montanha permanecem em estado selvagem, divididos entre parques nacionais do Ruanda, Uganda e República Democrática do Congo. Muitos foram deliberadamente habituados à presença humana para facilitar tanto a realização de pesquisas como o crescimento do ecoturismo.
Os macacos enfrentam uma série de ameaças, incluindo a caça furtiva e perda de habitat, mas as doenças respiratórias também são uma grande preocupação e uma das principais causas de morte nestes animais.
Bactérias e vírus circulam naturalmente entre gorilas e outros macacos, alguns dos quais podem causar infeções respiratórias. Mas, os cientistas também documentaram vários casos com a presença de patogénicos humanos, incluindo os rinovírus e coronavírus responsáveis por constipações e gripes comuns. Em muitos desses casos, os vírus respiratórios causam sintomas relativamente leves e familiares nos gorilas infetados.
“Eles tossem, espirram, têm o nariz a pingar, podem ter os olhos a lacrimejar, podem não ter fome, estar letárgicos, literalmente não querendo sair da cama de manhã. Eles parecem-se e agem exatamente como nós quando temos uma infeção do trato respiratório superior”, explicou Kirsten Gilardi.
O pior é quando essas constipações simples evoluem e causam doença grave, como pneumonia ou até mesmo a morte. Em 2009, um vírus respiratório humano adoeceu 11 dos 12 gorilas de um único grupo familiar no Ruanda. Cinco dos animais necessitaram de cuidados veterinários e outros dois, incluindo uma cria, morreram.
Para conter essa transmissão de doenças entre espécies, a União Internacional para a Conservação da Natureza emitiu um conjunto de diretrizes, em 2015, para cientistas, turistas e outras pessoas que possam encontrar grandes primatas. As recomendações incluem permanecer a pelo menos sete metros de distância dos animais e usar uma máscara facial. Medidas que só a pandemia forçou todos a usarem. O Parque Nacional dos Vulcões agora exige que turistas, funcionários do parque, investigadores e outras pessoas que encontrem gorilas usem máscaras faciais e permaneçam a cerca de dez metros de distância. Medidas que podem vir a ser aplicadas a outras espécies de animais em vias de extinção, com ou sem Covid-19.