Nas últimas semanas de Novembro, a posição de vários cientistas, muito cuidadosos em afirmar uma relação direta entre alguns eventos meteorológicos extremos e as alterações climáticas, perderam um pouco a timidez e alertaram para o facto de casos como a super-tempestade Sandy – que afetou o Nordeste dos Estados Unidos – ou a maior ocorrência de fenómenos violentos, como o que aconteceu recentemente no Algarve, serem sinais claros de um clima em mudança.
Muitos artigos surgiram usando comparações curiosas, falando do facto de podermos ter um problema na articulação do joelho sem estar relacionada com a idade. Por outro lado, sabemos que à medida que vamos envelhecendo é mais provável que tal aconteça. Também o clima é assim – à medida que a concentração de gases com efeito de estufa vai aumentando, também a frequência e intensidade de determinados fenómenos é maior e mais visível.
Os cientistas afirmam que um aumento de temperatura global superior a 2 graus Celsius em relação à era pré-industrial terá consequências dramáticas, principalmente para os países com menor capacidade de adaptação. Estudos da Agência Internacional de Energia, do Banco Mundial, entre outros, afirmam que o caminho que estamos a seguir é o de um aumento de emissões que conduzirá a um aumento de, pelo menos, 3,6 a 4 graus de temperatura. Só conseguiremos inverter esta tendência se as emissões atingirem um pico já em 2015.
A Conferência das Nações Unidas sobre alterações climáticas, em Doha, no Qatar entre 26 de Novembro e 7 de Dezembro teve um episódio embaraçoso. É sabido que entre os países em vias de desenvolvimento (designação algo dúbia para nações como esta), o Qatar é recordista em emissões de gases com efeito de estufa: cerca de 50 toneladas, per capita, por ano, várias vezes acima das cerca de 7 toneladas per capita/ano de um português. Num país tão identificado com os combustíveis fósseis, em particular com o petróleo, a própria imparcialidade do presidente da conferência que tem de procurar consensos e construir soluções, como ex-presidente da Organização dos Países Exportadores de Petróleo, tem levantado dúvidas.
Ao longo da cidade encontramos inúmeras tarjas relacionadas com a conferência, repetindo exaustivamente o slogan “Count me in” (contem comigo). O que é curioso é que essas faixas nos primeiros dias do evento tinham um erro de escrita (ou talvez não….). De um vermelho vivo, diziam “>2º no mundo – Contem comigo”. O sinal de maior “>” deixava confundido quem olhava, mas talvez houvesse alguma mensagem subtil.
É como se fosse uma confissão do Qatar e de muitos outros países que têm obstruído as negociações que sem avanços significativos conduzirão o planeta inexoravelmente a uma elevada subida de temperatura e a efeitos que queremos evitar. De um dia para o outro porém, o maior passou a menor, substituindo-se todas as faixas. Com tanto trabalho emitiu-se de certeza mais um pouco de carbono. A mensagem já estava politicamente correta. Agora já podem contar comigo!