UM GRANDE EQUÍVOCO da humanidade foi chamar “Terra” ao nosso planeta azul, que tem 71% da sua superfície submersa pelo mar, o qual é determinante na regulação dos ciclos hidrológicos e influencia fortemente o nosso clima. O mar é também o maior sistema de reciclagem e armazenamento de gases nocivos, bem como de nutrientes e de poluentes originados em terra. Sabemos como alguns dos nossos processos produtivos estão dependentes de serviços naturais prestados pelos ecossistemas marinhos, como o pescado que consumimos, ou a absorção no mar e nas zonas costeiras de CO2, que reduzindo os gases de efeito de estufa na atmosfera, mitiga o fenómeno das alterações climáticas.
Esse equívoco é revelador de como desconhecemos o planeta em que vivemos. Ou, no nosso caso, o país que habitamos. Ignoramos, por isso, que existe uma fortíssima componente marítima em muitos dos grandes desafios que enfrentamos. Como o da globalização do comércio mundial que irá implicar mais e maiores portos e transportes marítimos e logo o desenvolvimento das indústrias da construção, reparação e equipamento navais, dado que 90% desse comércio transita por mar; os da sustentabilidade e da segurança energéticas que exigem, respetivamente, a exploração de mais fontes energéticas offshore, incluindo energias renováveis, e a diversificação das rotas de transporte de energia, aumentando o transporte marítimo e os terminais portuários de energia; o do combate às alterações climáticas que dependerá em parte do conhecimento que venhamos a adquirir sobre o funcionamento do sistema oceânico; ou outros desafios, como os da sustentabilidade ambiental e preservação da biodiversidade; ou o desafio da segurança, num continente a Europa em que dois terços das fronteiras são marítimas.
A EUROPA AINDA É A SUPERPOTÊNCIA DO MAR. Com uma linha de costa que é sete vezes a dos EUA e quatro vezes a da Rússia, a Europa é, pela geografia, o continente mais marítimo do mundo. Com cerca de metade da sua população e do seu PIB gerado nas zonas costeiras, a Europa, mesmo numa conjuntura de crise, continua na frente da exploração do mar a nível mundial. Controla 40% da frota mundial de marinha mercante, dispõe da maior rede de portos de mar a nível mundial, conta com a indústria n.º 1 no mundo de turismo marítimo e é líder na produção de equipamento naval, tecnologia subaquática e na construção naval de alta complexidade.
Neste quadro, a União Europeia começou há cinco anos a desenvolver novas políticas inovadoras para o mar, com destaque para a Política Marítima Europeia Integrada e a Estratégia Marítima do Atlântico.
Portugal, com a maior Zona Económica Exclusiva da União e com a perspetiva de ter uma das maiores plataformas continentais do mundo é um país avassaladoramente marítimo, tendo como rival em dimensão, na Europa, apenas a Noruega. Portugal conta ainda com uma localização geográfica privilegiada, no centro das rotas de navegação mundial, na encruzilhada de três continentes e à porta da bacia do Atlântico Sul, dispondo também de relevantes recursos naturais.
Apesar deste potencial natural, a economia do mar continua a ser pouco produtiva.
Todavia, começamos a ver sinais cada vez mais nítidos de que está em curso no país a construção de um novo desígnio marítimo nacional que, se espera, vise transformar essa economia antiga numa economia de ponta e dar ao país uma nova base produtiva para o século XXI.
Bibliografia recomendada:
- O OCEANO, NOSSO FUTURO
Relatório da Comissão Mundial Independente para os Oceanos (Cambridge University Press) - PARA UMA FUTURA POLÍTICA MARÍTIMA DA UNIÃO: UMA VISÃO EUROPEIA PARA OS OCEANOS E OS MARES
Livro Verde da Comissão Europeia - O OCEANO: UM DESÍGNIO NACIONAL PARA O SÉCULO XXI
Relatório da Comissão Estratégica dos Oceanos (Presidência do Conselho de Ministros) - O HYPERCLUSTER DA ECONOMIA DO MAR
Estudo elaborado por SAER (Associação Comercial de Lisboa)
Quem é Tiago Pitta e Cunha?
Nascido em 1967, Tiago Pitta e Cunha é licenciado em Direito pela Universidade Católica Portuguesa e Legis Magister em Direito Europeu e Internacional pela London School of Economics and Political Science. Especialista em política e economia do mar, foi representante de Portugal em várias instâncias internacionais, sendo atualmente consultor do Presidente da República