No início deste ano, um painel de especialistas das Nações Unidas divulgava os resultados de uma avaliação ao ozono na atmosfera e as notícias não podiam ser melhores: a camada de ozono, que protege a Terra de raios ultravioleta, tem estado a recuperar e tudo indica que o problema estará totalmente resolvido nas próximas quatro décadas, voltando a valores de 1980.
O mesmo relatório referia que as estimativas eram de que o buraco sobre a Antártida já não existiria em 2066, ao passo que no resto do mundo a camada de ozono deveria estar consolidada até 2040. No Ártico, apontava-se para 2045.
Estas previsões, que asseguravam estarmos perante um dos grandes sucessos ambientais modernos, são agora rebatidas num novo estudo, realizado por investigadores da Nova Zelândia e publicado no início desta semana, que afirma que, afinal, o buraco pode não estar a recuperar e, pelo contrário, pode estar até a expandir-se.
A mais recente investigação está em desacordo completo com as avaliações amplamente aceites sobre o estado da camada de ozono.
A equipa deste novo estudo queria perceber porque razão o buraco, que aumenta de dimensões na Antártida durante a primavera, antes de diminuir novamente no verão, tinha atingido recordes entre 2020 e 2022 – em 2020, anunciava-se que o buraco era, novamente, dos maiores e mais profundos identificados nos últimos 15 anos e que tinha começado a crescer rapidamente a partir de meados de agosto e alcançado o seu pico no início de outubro.
Após a análise dos resultados, descobriu que os níveis de ozono diminuíram 26% desde 2004 no centro do buraco, durante a primavera, o que significa, segundo Hannah Kessenich, estudante de doutoramento na Universidade de Otago, em Dunedin, Nova Zelândia, e principal autora do estudo, que este buraco “não só permaneceu grande em área, mas também se tornou mais profundo durante a maior parte da primavera”.
“Os buracos de ozono de longa duração de 2020 a 2022 enquadram-se perfeitamente neste quadro, uma vez que o tamanho/profundidade do buraco durante o mês de outubro foi particularmente notável em todos os três anos”, acrescenta ainda a investigadora.
Como foi realizado o estudo
“As nossas descobertas revelam que os recentes e grandes buracos na camada de ozono podem não ser causados apenas pelos CFC”, afirma Kessenich, acrescentando que “embora o Protocolo de Montreal tenha sido indiscutivelmente bem-sucedido na redução dos CFC ao longo do tempo e na prevenção de catástrofes ambientais, os recentes e persistentes buracos na zona da Antártida parecem estar intimamente ligados a mudanças na dinâmica atmosférica”.
O Protocolo de Montreal, estabelecido em 1987 e ratificado pelos 198 membros das Nações Unidas, que determinou a eliminação progressiva dos químicos que afetam a camada de ozono, nomeadamente os CFC (clorofluorocarbonetos, então muito usados como gases para refrigeração), foi definido apenas dois anos depois de o buraco ter sido descoberto na Antártida, durante uma expedição científica britânica. Poucos anos antes, tinha já sido identificado o impacto dos CFC na atmosfera.
Para chegar às suas conclusões, a equipa de investigação, publicada na revista Nature Communications, analisou o comportamento da camada de ozono entre setembro e novembro, através de um instrumento de satélite. A partir da utilização de dados históricos, os investigadores compararam também as mudanças nos níveis de ozono e avaliaram os sinais de recuperação da camada de ozono.
Após esta análise, os investigadores concluíram que a destruição da camada de ozono e o aprofundamento do buraco foram resultado de mudanças no vórtice polar antártico, um ciclone persistente de grande escala, baixa pressão e ar muito frio, bem acima do Polo Sul.
Contudo, a equipa não investigou mais a fundo as causas destas mudanças, reconhecendo, ainda assim, que existem vários fatores que também podem contribuir para a destruição da camada de ozono, tal como a poluição, que provoca o aquecimento do planeta, ou partículas minúsculas transportadas pelo ar e emitidas por incêndios florestais e vulcões.
Há muito ceticismo na comunidade científica quanto a este novo estudo, por se focar nos buracos observados entre 2020 e 2022 e ter em conta apenas um curto período de análise, o que significa que é pouco tempo para tirar estas conclusões.
Além disso, Martin Jucker, cientista no Centro de Investigação sobre Alterações Climáticas da Universidade de Nova Gales do Sul, na Austrália, disse, em declarações ao Science Media Center, que os autores do estudo removeram dois anos na análise, 2002 e 2019, para garantirem que “eventos excecionais” não distorciam as descobertas.
Contudo, “foi demonstrado que esses eventos diminuíram fortemente o tamanho do buraco na camada de ozono”, e “portanto, incluir esses eventos teria, provavelmente, anulado qualquer tendência negativa de longo prazo”, remata.