Fiquemos com a descrição do jornal inglês “The Guardian”:
Em criança, Hari Pippal dormia no chão juntamente com sete irmãs e oito irmãos. Em adolescente, pedalava um riquexó para ajudar a alimentar a família. Agora, dono de um grande e rentável hospital, uma fábrica de sapatos, um revendedor de motos [Honda] e um bem sucedido restaurante, Hari Pippal tornou-se o símbolo das enormes possibilidades existentes na Índia para alguém com espírito empreendedor. O facto de este milionário feito pelo seu próprio esforço ter chegado ao topo apesar de ser um Dalit (um intocável), levou alguns a considerar as suas realizações como uma prova de que, à medida em que a Índia acelera as suas transformações económicas, uma sociedade mais igualitária está a emergir. As revistas tratam-no como uma história Dalit de sucesso. Pippal, todavia, está apreensivo com o seu status de rapaz-propaganda de uma Índia moderna sem castas. Ele acredita que o seu sucesso veio apesar da sua casta, e avisa que, à medida em que a Índia se torna mais rica, as divisões por casta são cada vez mais pronunciadas. (…) “O governo acredita que a ‘scheduled caste’ (o termo oficial para Dalits) está a erguer-se, que o sistema de castas está a desaparecer. Isto está errado. A separação entre scheduled castes e castas altas está a aumentar”, diz Pippal. “As castas mais baixas continuam a ser muito pobres. Sem dinheiro é difícil aproveitar as novas oportunidades, e assim eles continuam pobres e todos os outros ficam mais ricos”. Pippal ficou consciente do seu status no primeiro dia na escola. Os seus professores resmungavam na sua direcção: “Vocês são mal-educados, mal vestidos e não sabem comportar-se”. (…) “Eu respondi decidindo que tinha de ser melhor do que os outros – mais esperto, mais bem vestido, mais bem comportado, mais bem sucedido,” disse. Mas o desprezo e insultos subtis duraram uma vida inteira. O seu sobrenome identifica-o como um Dalit, e assim, quando abriu a sua primeira empresa, deu-lhe o nome de “Exportação do Povo”, que soa quase ao mesmo, mas não tinha as mesmas conotações negativas. Quando abriu o seu hospital em 2004, foi difícil recrutar médicos das castas superiores, muitos dos quais não aceitavam trabalhar às suas ordens. Na medida em que o hospital, a poucos quilómetros do Taj Mahal, ganhou reputação, as atitudes mudaram e actualmente emprega 25 médicos da classe alta. Mesmo hoje, alguns médicos Dalit evitam revelar o seu sobrenome, utilizando iniciais, para não alarmar pacientes das castas superiores. Quando o mais velho dos seus cinco filhos disse que estava noivo de uma rapariga pertencente a uma casta superior, Pippal ficou feliz pelo seu filho ter encontrado alguém que amava. Os pais dela, também, não se opuseram ao casamento, mas alguns dias depois, cerca de cem pessoas da comunidade da noiva chegaram ao apartamento de Pippal, ameaçando matar os pais da rapariga se o casamento fosse avante. “Eu disse ao meu filho que ele iria destruir toda a família dela se persistisse no casamento, e ele percebeu”, disse Pippal. O filho casou-se recentemente com uma médica Dalit do hospital do pai. “Agora acredito que os meus filhos devem casar dentro da sua casta. É melhor assim.” (…) Pippal sabe como tem sido excepcional a sua vida quando se encontra com os seus contemporâneos da escola primária. “Todos os meus amigos da escola, pertencentes à minha casta, continuam a sentar-se no chão a fazer sapatos,” disse. “Estão irritados com o sistema, mas o que podem eles fazer?” * *Gentleman, Amelia (2007) “India’s untouchable millionaire”, The Guardian, 6 de Maio. Página consultada a 18 de Outubro de 2009, http://www.guardian.co.uk/world/2007/may/06/india.ameliagentleman.
Terminada a visita do cenotáfio, seriam umas 5 da tarde, regressei ao hotel. Considerei o barulho do trânsito, com as constantes e intermináveis buzinas, mais a poluição, uma coisa insuportável, pelo que me refugiei no hotel. É hora de descansar, de sair do calor, de usufruir do ar condicionado. A piscina não tinha água transparente, como se terão apercebido na crónica 79, pelo que não cheguei a utilizá-la. Aproveitei o tempo para aceder à internet. Foi a única vez que acedi, durante este mês. E foram menos de trinta minutos. Em viagem desapareço, não dou notícias. Qualquer dia sou raptada e só um mês depois é que se sabe. Já estão tão habituados ao meu desaparecimento mesmo. O telemóvel está sempre desligado, também. Mas estas fotos mostram o divertido e agitado regresso ao hotel, num riquexó. Disse ao Kailash que estava dispensado, que não precisaria mais de si o resto do dia, e que desejava agora regressar de riquexó ao hotel. O Kailash tratou de me arranjar este, e por segurança, não fosse eu ser raptada pelo pobre homem, foi-nos seguindo. O melhor de tudo foi quando o motorista do riquexó resolve entrar em contramão na avenida onde fica o hotel. Pois claro, para quê ir dar uma volta enorme, se podia entrar já na avenida e deixar-me logo ali?… Então o Kailash foi-nos seguindo do outro lado da estrada, com separador central. E eu a ver os carros a toda a velocidade direito a nós. Ninguém pareceu estranhar o facto de ele ir em contramão, ao que parece é normal. Se o hotel é ali, é evidente que não se vai dar uma volta enorme para andar sempre no sentido correcto… Estes condutores indianos até têm uma boa lógica, sem dúvida.
Uf!!!!
Aproveitei o magnífico LCD existente no quarto para experimentar ver televisão indiana. Aguentei uns 4 ou 5 minutos, nada mau. Vi anúncios no intervalo de uma telenovela, ou série, ou não sei o que seria. Descobri que eles intercalam hindi com inglês, quer na telenovela, quer nos anúncios. Fantástico. Coexistem pacificamente, como se já fizessem parte uma da outra, ambas as línguas.
Peixe para o jantar, uma vez mais. Hoje temos konkani fish curry: fish cooked with yellow masala and cocunut milk. Estava delicioso. Enfim, era sempre igual, fosse que nome fosse.