“O comboio não tem ar condicionado, mas, à noite, não deixem as janelas abertas e tranquem as portas dos compartimentos…vamos parar três horas na Polónia e costumamos ter problemas com assaltos”, disse-nos o revisor do comboio internacional de Praga para Cracóvia, ainda mal tínhamos pousado as bagagens. Foi uma ótima maneira de começarmos a viagem de 11 horas que nos esperava, depois de percebermos que íamos perder o jogo de Portugal com a República Checa.
A sofrer dos mesmos desesperos que nós estavam as duas senhoras com quem íamos partilhar a divisão onde íamos dormir, tão ou mais minúscula do que a última. Eram duas inglesas, com pronúncia acentuada: uma com idade para ser nossa mãe, outra com idade para ser nossa avó. Apesar da empatia inicial, pouco ou nada soubemos sobre aquelas duas senhoras, talvez mãe e filha, que se limitaram a jantar, trocar de roupa, fazer a sua higiene pessoal, colocar os lençóis na cama e (tentar) dormir o máximo possível.
O mesmo não se pode dizer do casal de portugueses que encontramos uns compartimentos mais à frente. Para além de partilharem a mesma ansiedade que nós sobre o jogo que decorria, enquanto viajávamos de comboio, tinham mais ou menos a nossa idade e também estavam a fazer um interrail. Tinham começado uma semana depois de nós, o itinerário escolhido era diferente, mas também eles tinham uma série de aventuras para contar, a começar nos quatro comboios seguidos que tiveram que apanhar para completar o percurso desde Lisboa a Amesterdão – ao que parece, nenhum deles tão mau quanto aquele em que nos encontrávamos.
Ambos residentes em Odivelas, tinham um estilo de viagem ainda menos planeada do que o nosso – só tinham marcado as duas primeiras pernoitas, o que já os tinha obrigado a despender de mais dinheiro do que estavam à espera para dormir com algum conforto. Mas o espírito descontraído que tanto os caracterizou nessa noite estava pouco preocupado com esses pormenores e com outros tantos que estariam para vir.
Depois de algumas horas numa autêntica conversa de partilha de experiências, acabamos por ter que trancar todas as janelas da carruagem que ainda faltavam e tentar descansar, ainda que com um olho aberto e outro fechado.
Em Cracóvia, bem que os procuramos, até porque a cidade não é muito grande. Mas parece que estávamos destinados a seguir viagens diferentes.