Alexandra Correia
Vamos reclamar do quê?
O que leva as pessoas à greve (ou não) é a tal gotinha decisiva que provoca a inundação, um cansaço de tudo e não só de propostas laborais, um protesto contra a inação política em áreas sufocantes como a habitação, os transportes, o custo de vida, os salários, sim, e contra o ar que vai ficando irrespirável para certos grupos sociais, como as mulheres e os imigrantes
Dos pequenos poderes
Os pequenos poderes mostram o tom da hipocrisia podre e sem valores de certos discursos políticos, anti-imigração e cheios de masculinidades mais do que tóxicas, criminosas, que, mais do que qualquer partidarismo, demonstram uma falta de humanidade (ainda) chocante
O que é ser homem?
O galo já não canta de galo e parece-lhe o fim do mundo que a galinha já não precise dele numa união que só valha pelo afeto e não pela dependência
Coitada da Cláudia
Não basta cada um fazer a sua parte no dia a dia; a luta, colocada ao nível da responsabilidade dos consumidores, fica sempre aquém do que o planeta pede. A questão é governamental e a “guerra”, como bem lhe chamou a ministra do Ambiente e Energia, trava-se contra um sistema poderosíssimo
Os biscates da saúde
Os hospitais já não vivem sem eles – seria quase impossível manter uma urgência a funcionar sem os tarefeiros, enquanto os concursos para o quadro ficam vazios
Vamos morar juntos?
A economia, esquecemos muitas vezes, não é uma ciência exata, às vezes parece tão incerta como a meteorologia e só ligeiramente mais fidedigna do que a astrologia. Tal como nas previsões dos signos, especula-se muito nestas bolhas imobiliárias
Isto não é um acordo de paz
Esta paz é como o plano de Donald Trump: vaga, ambígua, insegura, podendo desabar a qualquer momento. E ficar em ruínas, como a Faixa de Gaza, com os seus milhares de refugiados a chegarem agora às suas casas, sob os escombros
A ação e a irritação
O outro plano é o das pessoas que não negam as atrocidades que estão a ser cometidas em Gaza, mas ficam irritadas com os ativistas. Fizeram o seu número, sim, e foram bem-sucedidos, pois agiram para chamar a atenção – que é muito mais do que qualquer um dos que destilam o seu ódio faz. E não, gritar nas redes sociais não é agir
Beijinhos para todas
Qualquer mulher sabe – porque já o experienciou – o que é não ser levada a sério, numa conversa séria, pelo simples facto de ser mulher. Os beijinhos têm como objetivo desnortear quem usa da palavra, assim como os apartes, funcionando como agressões para desviar o orador da sua linha de pensamento
Marcelo no país das maravilhas
O delírio está no encantamento com o facto de Portugal estar na moda, ser escolhido por cidadãos de certo tipo de países que cá vêm tanto para “turistar” como para viver, sem entender o alcance das consequências desta moda no preço das casas e o drama de milhares de famílias, que não conseguem pagar uma habitação com o seu salário
A hora para partir ossos
Tudo o que construímos após a II Guerra Mundial sobreviveu à ultraindividualista e gananciosa cultura yuppie dos anos 80, mas sobreviverá à “modernidade líquida” anunciada pelo filósofo Zygmunt Bauman e que parece estar a atingir o seu máximo esplendor na era das redes sociais?
Os bancos e o predador
O grande banco norte-americano, o J.P. Morgan, foi cúmplice, durante anos a fio, de transações suspeitas de Jeffrey Epstein, sabendo-as duvidosas, processando cerca de mil milhões de dólares nessas transações, incluindo os muitos pagamentos que foi fazendo às suas vítimas, por acordos
Aqui não partilhamos casas
O problema aqui é encontrar quem queira investir em habitação acessível, já que os investidores privados encontram maior fonte de lucro em habitação de luxo. Ou em fazer prédios novos, bem mais barato do que recuperar antigos. E assim seguimos em ruínas
A política das “orelhas de burro”
Os governos dizem que os alunos chegam mal preparados às universidades e os exames são o filtro necessário. Em vez de se olhar para o sistema que os leva até às portas da universidade, mas lhes trava as entradas, inventa-se mais um exame para remendar o estrago
As rendas e a extrema-direita
O fascismo funciona na lógica do “nós” e “eles”. E a esquerda não tem funcionado assim, dividida como sempre?
Ainda estamos aqui
Ainda “ontem” as mulheres eram consideradas inaptas para votar, quanto mais para ter autonomia sobre o seu corpo para decidir ter ou não um filho
O que se passa com os rapazes?
A ideia tradicional de masculinidade está ultrapassada e entrou em crise. O problema é quando são os próprios jovens a preferir olhar para trás em vez de seguir em frente
Mulas de carga e bodes expiatórios
Os imigrantes têm sido o bode expiatório do mundo ocidental. E as suas mulas de carga também, apenas tolerados na medida em que precisamos de quem faça os piores trabalhos pelo mínimo possível de salário
As correntes que importam
Não há nada de romântico aqui, exceto na versão “brincar aos pobrezinhos” enquanto não se reinstala a normalidade, com posts no Facebook, palmas, foguetes e gritos de emoção, depois de umas poucas horas de desorientação
A paz está pela hora da morte
Tal como num filme maniqueísta, de um lado os bons, do outro os maus, o herói e o vilão, e no fim tudo se resolve, o bem triunfa sobre o mal, varre-se a casa e o normal volta a ocupar-nos os dias. Não iremos ver nada disto na atual guerra em solo europeu, desenrolada na Ucrânia
O choradinho dos impunes
Só André Ventura destoou. Afinal, estamos em campanha eleitoral (ou quase), teremos eleições legislativas no próximo mês e o Chega está cheio de casos e casinhos a braços com a Justiça. Ventura aproveitou a deixa para comparar a agora ex-amiga Marine ao nosso primeiro-ministro. Neste ponto, temos mesmo de citar Fernando Pessa. “E esta, hein?”