“Num mundo onde a inovação e a sustentabilidade são fundamentais, este novo mestrado executivo é uma resposta às exigências crescentes do mundo financeiro e empresarial e das transformações no setor bancário, tendo como principal objetivo preparar os nossos estudantes para enfrentarem os desafios contemporâneos e encontrarem soluções eficazes para problemas reais”. É desta forma que Manuel Duarte Rocha, diretor do Mestrado Executivo em Banca, Instrumentos e Mercados Financeiros, explica as motivações e objetivos da nova proposta de formação executiva da Faculdade de Economia da Universidade do Porto (FEP).
O novo mestrado executivo na área financeira tem a duração de dois semestres e, como explica o seu diretor, oferece uma formação sólida, avançada e atual, focada no papel da banca e do ecossistema de instrumentos de financiamento empresarial. Paralelamente, aborda os desafios da sustentabilidade, do enquadramentoregulatório e da mitigação de riscos, garantindo que os formandos sejam preparados para enfrentar as complexidades do mundo financeiro atual.
Professor Manuel Duarte Rocha, diretor do Mestrado Executivo em Banca, Instrumentos e Mercados Financeiros, da FEP.
Com as candidaturas a decorrerem até 14 de agosto, e o início de aulas previsto para setembro, o novo mestrado dirige-se sobretudo a profissionais de áreas como Economia, Gestão, Finanças e Contabilidade, com pelo menos cinco anos de experiência, e promove uma forte ligação entre o conhecimento científico e a sua aplicação prática.
Através do apoio de parcerias estratégicas com instituições financeiras e empresas, o plano curricular delineado permitirá que os estudantes fiquem capacitados para assumir posições de relevo em empresas e instituições financeiras, entre outras valências. Tudo com o apoio de um corpo docente que resulta da fusão entre a expertise académica com a experiência prática bancária e empresarial. O mestrado realiza-se em regime pós-laboral, e combina ensino presencial com a componente remota.
O diretor da Faculdade de Economia da Universidade do Porto, Óscar Afonso, congratula-se pelo facto de a “FEP continuar a liderar na oferta de programas que respondem às exigências do mercado”, e afirma que “este curso é uma oportunidade única para os profissionais do setor financeiro aprofundarem os seus conhecimentos e desenvolverem competências essenciais para enfrentar os desafios contemporâneos. Estamos confiantes de que este mestrado irá preparar estudantes para se destacarem e influenciar positivamente o futuro dos mercados financeiros”.
Formação diversificada
A FEP mantém a sua aposta constante na formação para executivos e de 22 de julho a 14 de agosto tem a decorrer a última fase de candidatura para o Mestrado Executivo em Gestão de Operações de Retalho. O curso destina-se a profissionais com pelo menos cinco anos no ativo e de preferência no setor de retalho. O programa foca-se no desenvolvimento de competências em gestão em operações de retalho.
Por acreditar que os mestrados executivos têm um impacto significativo na vida dos formandos, capacitando-os para enfrentar os desafios do mundo empresarial, a FEP prepara-se para lecionar, em breve e pela primeira vez, o Mestrado Executivo em Finanças que entretanto já foi acreditado..
Esta é uma daquelas perguntas que não é de resposta única, mas na lógica das médias, em que cada um de nós tem direito a um frango e meio, sei que o caro leitor irá muito provavelmente responder “sim” e começar a fazer contas à vida.
Se estiver a ler esta newsletter ao acordar, desejo-lhe um bom dia e aconselho-o a não puxar muito pela cabeça, porque é uma pergunta retórica. Mas, seja qual for a sua resposta, tenho aqui uma boa notícia e mais fresquinha do que o requentado debate do Estado da Nação de ontem.
A avaliação de desempenho é, no nosso país, um eterno problema por resolver. Sejam quais forem as razões, há uma evidente dificuldade em implementar bons sistemas ou sequer, em muitos casos, qualquer método razoável, e isso contribui em boa medida para a nossa tradicional baixa produtividade nos setores público e privado. Basta acompanhar, por exemplo, os resultados das avaliações aos juízes, ver o tempo de serviço como principal critério para subir na carreira ou conhecer a realidade empresarial para termos uma amostra do panorama geral.
Seria assim uma boa notícia a elaboração dum ranking de escolas. No fundo, estaríamos perante um instrumento de trabalho para saber o que se está a fazer no nosso ensino público e privado. Infelizmente, o que é largamente publicitado (basta ver o destaque que se dá ao simples ranking e ao esforço que o jornal o Público e a Universidade Católica fizeram com o chamado ranking da superação onde se inclui o contexto familiar) em nada ajuda para esse objetivo. Apresentar as escolas de onde vieram os alunos com as mais altas médias nos exames nacionais como as melhores é um mau modo de avaliação, em nada ajuda a melhorar a escola em geral e em nada contribui para aprofundar problemas sociais graves.
Uma escola que pode selecionar os alunos nunca se pode comparar a uma que tem de aceitar todos independentemente da sua origem social e económica. Avaliar da mesma forma uma escola em que os alunos vêm de famílias pobres, sem acesso a livros ou ao mínimo de cultura básica, e outra em que os rapazes e raparigas chegam em bons meios de transporte, têm acesso a livrarias, a explicadores dentro e fora da escola, a atividades extracurriculares, a bons cuidados de saúde, de alimentação e de tudo o resto é simplesmente brincar às tabelas. Serve apenas como publicidade gratuita para os colégios e para que estes aumentem os valores das propinas.
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Porém, o marketing das escolas privadas é um assunto menor nesta conversa. A exibição destes rankings causa problemas graves e perceções erradas e perigosas sobre o papel da escola. Em primeiro lugar, vende-se a imagem de que a escola privada é a mais capaz. Como na nossa sociedade o sucesso escolar está intimamente ligado ao profissional, a ideia que se transmite é que, se um pai quer dar boas perspetivas de vida a um filho, só há uma solução: ir para um colégio privado e quanto melhor for, ou seja, quanto mais bem posicionado estiver na tabela, melhor será para o futuro do moço ou da moça.
As consequências disso são várias e é impossível elencar todas, mas algumas parecem evidentes. Logo à partida, o ferrete que se aplica à escola pública: a que não oferece perspetivas. Quanto maior for essa a perceção pública, menos meios ela terá, mais será a pressão política para que o Estado financie o setor privado e mais provimento terão os defensores de disparates como o cheque-ensino e demais promoções da escola privada. Não será necessário explicar até onde isso levará a escola pública, mas basta ver os países em que este processo aconteceu (os EUA são um bom exemplo). Depois, o esforço financeiro que irá ser exigido aos pais para pagar as propinas pode induzir em erro. Frequentar uma escola de gente abastada não traz os explicadores, o contexto social, a frequência de eventos culturais, etc., etc. Mas, claro, estes pais que ainda conseguem fazer o dito esforço são uma pequena minoria. A imensa maioria que sobra irá viver com a ideia, vendida por estes rankings, de que há uma elite que inevitavelmente o continuará a ser e de que os outros não passarão da cepa torta, porque não têm acesso a boas escolas. Não é o momento para desenvolver o tema, mas são também sentimentos deste tipo que levam ao crescimento de populismos e à descrença na democracia.
A escola não é um universo independente do resto da estrutura comunitária, bem pelo contrário: a escola é basilar, é nela que começam e se desenvolve grande parte das qualidades e dos defeitos da comunidade. Um sistema escolar que encoraja a divisão entre escolas para ricos e escolas para pobres não estimula só a desigualdade, é também fonte direta de desagregação social, de perda de sentido comunitário e, no limite, de conflitualidade. A escola não pode e não deve ser apenas um local onde se ensina. Tem de ser um local de aprendizagem sobre o mundo que nos rodeia. Uma escola onde não estejam filhos de diferentes origens económicas e sociais, que não tenha gente de todas as cores, religiões, línguas, experiências de vida será sempre pobre. Uma escola que não incuta a igualdade como valor essencial, que não promova a tolerância através do conhecimento do outro, do diferente, não é um espaço educativo, é uma fábrica de desigualdades, de criação de polarização e de fraturas sociais. E, já agora, um Estado e um Governo que não percebam que só a escola pública pode garantir isto tudo estarão sempre a aprofundar os problemas do País.
Portugal tem uma avaria complicada no seu elevador social. A pobreza reproduz-se geracionalmente e somos um dos mais desiguais da Europa. Não investir na escola pública e fomentar o ensino privado serve apenas para multiplicar estes problemas. Convém sempre lembrar que, para o elevador social funcionar, o acesso à educação e à saúde é fundamental. Num país como o nosso, isso é vital.
A entrevista de Lucília Gago já foi tão comentada que em princípio não valeria a pena voltar a ela nesta coluna. Até porque esses comentários, os que li ou ouvi, em geral foram de acertada crítica à postura, às posições e afirmações da procuradora-geral da República. No entanto, volto porque: a) já escrevi tanto sobre os problemas da Justiça, em meu juízo dos mais graves, complexos e menos resolvidos do País, que se me impõe agora não a ignorar; sobretudo para b) salientar quatro importantes aspetos ou questões de fundo. O que de modo o mais simples e claro possível ensaiarei fazer.
1. Lucília Gago (LG) enfatizou que o processo que visou e atingiu António Costa (AC) não foi arquivado. Assim, a posição nele do ex-primeiro-ministro continua a mesma. Ou seja, nenhuma: não sendo processualmente nada – só foi ouvido, e depois de muito o pedir –, na prática mantém-se (ou alimenta-se?) a falsa ideia de continuar suspeito. Apesar de mesmo do comunicado do MP resultar flagrantemente que nenhum procedimento ilícito ou desconforme com o bom exercício do cargo lhe foi atribuído, antes apenas haver referência a escutados “invocarem” o seu nome para uma possível intervenção no âmbito das suas competências!
A procuradora-geral sugeriu, pois, ou mesmo afirmou, que só o arquivamento do processo permitirá pôr termo a todas as suspeições. Arquivamento que não tem prazo legal para ocorrer, sabendo-se bem haver processos parados ou a arrastarem-se anos e anos. Acresce que quanto mais afastado no tempo for o arquivamento, mais apagado ou diluído ficará o efeito do que sobre a ação do MP se possa dizer… Tudo isto é lamentável, perigoso, desconforme com as garantias que qualquer cidadão deve ter num Estado de direito.
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2. A procuradora-geral acentuou muito que todos os cidadãos são iguais perante a lei, ninguém pode ter um tratamento especial. É mais do que óbvio ser assim, e dizê-lo como disse no contexto em que o fez pode assumir contornos populistas e demagógicos. E para lá de não ser correto negar a legitimidade/necessidade de ter em conta certas consequências, quando estejam em causa titulares de órgãos de soberania, é o procedimento do MP que pode conduzir a não se verificar tal igualdade. Se o caso fosse com um “cidadão comum”, não viria a público, se viesse não haveria a referência específica a um nome, nem teria as consequências graves para o cidadão – e para o País – que teve tratando-se de um chefe de governo.
3. Ainda em matéria de igualdade, claro que ela tem de existir também em matéria de obrigação de todos os órgãos de soberania, organismos e serviços do Estado prestarem contas, estarem sujeitos a escrutínio democrático, não gozarem de impunidade. Ora, na prestação de LG não pareceu ser esse o seu entendimento, e não se ouviu uma só palavra a defender a imprescindibilidade dessa igualdade em relação ao MP – chegando a afirmar até que as críticas que lhe são feitas se inserem numa “campanha orquestrada”!
4. Enfim, ao não admitir nenhum erro ou desvio de magistrados do MP, apresentando-o como uma espécie de bloco, toda a instituição responsável por todos os atos de todos os seus integrantes, creio que Lucília Gago lhe presta um mau serviço. Embora agrade a quem padeça de “corporativismo” – que em nenhuma classe, como a dos magistrados, pode ser tão nefasto. Em todas as classes há bons, sofríveis e maus profissionais, do ponto de vista técnico e não só. E para defender o prestígio, o bom nome, até a honra de uma classe ou de uma corporação, o que se impõe é reconhecer os erros e as fragilidades, evitar ou punir os desvios e abusos.
Por exemplo, são conhecidos muitos casos de arbítrio e violência policiais. Ora, para defender as polícias, essenciais em democracia agindo dentro da legalidade, o que há a fazer é denunciar, investigar, punir o que está mal, não fazer de conta que está tudo bem. A confiança na Justiça é cada vez menor, como mostra uma sondagem acabada de publicar – e mesmo para a defesa da democracia, o progresso do País, é indispensável uma Justiça justa.
À MARGEM
Mas é só o MP?
A pergunta em título faz sentido e há quem no MP naturalmente a faça. Então os graves problemas na Justiça decorrem apenas da ação do MP? Não, de maneira nenhuma. Nunca – nem mesmo agora. Também há problemas com a legislação, a falta de funcionários, a conduta de advogados (mas, atenção, a Ordem não o oculta, instaura não poucos processos disciplinares). E, obviamente, há problemas com magistrados judiciais. Aliás, por exemplo, as escutas têm de ser autorizadas por um juiz… Mas, neste momento, tem maior relevância o que se passa com o MP e por ele devem começar as mudanças indispensáveis. Com urgência.
Do ódio às elites ao nacionalismo, da corrupção à imigração, é bom de ver que, entre nós, André Ventura não se distingue por ser original, seguindo o cardápio dos temas dos partidos radicais. Mas também é fácil de ver que, para o bom e para o mau, tudo chega tarde a Portugal. Nem o líder do partido Chega se atreve a pôr em causa a União Europeia, ímpeto populista que há oito anos deu origem ao Brexit, com consequências desastrosas para o Reino Unido, nem a tensão social que se vive em Portugal tem comparação possível com a dos EUA.
Do lado de lá do Atlântico, existem analistas que defendem que se está à beira da explosão. Há muito que também se fala, inclusivamente, no modo como a política contaminou as próprias relações, com relatos de histórias tristes, amigos que deixaram de o ser e famílias que passaram a evitar encontros por causa de partilhas nas redes sociais. Nos republicanos, mas também nos democratas, o discurso político tem acompanhado a subida da temperatura: os adversários são encarados como inimigos, e muitas vezes, até numa lógica de caça ao voto, são as vozes mais moderadas que se deixam contaminar pelo radicalismo.
É neste contexto que acontece a trágica tentativa de assassínio de Donald Trump, no comício de Butler, na Pensilvânia. Mesmo que não tenha sido falhada, a verdade é que tem tudo para incendiar ainda mais a situação. Autêntico animal político, Trump reagiu segundo o cânone, ou seja, de forma heroica: a imagem do homem ensanguentado – que se levanta de punho erguido e que, apesar de ferido, ainda arranja forças para gritar “fight, fight, fight” – ficará na História. Seguramente que também vai alimentar teorias conspiracionistas e, do ponto de vista simbólico, já houve até quem a comparasse à célebre imagem da Batalha de Iwo Jima, na II Guerra Mundial. Na lógica emocional das campanhas eleitorais, é certo que será aproveitada pela narrativa republicana: aquele já não é sequer o homem que incentivou o assalto ao Capitólio, no dia 6 de janeiro de 2021; aquele é o homem providencial, que luta contra o sistema instituído, contra tudo e contra todos.
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Nesta trincheira, não são apenas ideias políticas que separam os dois lados: vermelhos e azuis, republicanos e democratas, à direita e à esquerda, existe também outra lente de compreensão do mundo, um sistema de valores e até um modo de vida completamente distintos (e, por isso, os temas ditos fraturantes, como o aborto, são chamados à discussão). Na noite de sábado, a partir da Casa Branca, Joe Biden reagiu ao atentado contra Trump, apelando ao diálogo e à unidade nacional. “Aqui na América, temos de sair dos nossos silos, onde só ouvimos aqueles com quem concordamos”, afirmou o Presidente. “Apesar de discordarmos, não somos inimigos. Somos vizinhos, amigos, colegas, cidadãos e, mais importante do que tudo, somos compatriotas americanos.”
Um artigo recente na revista Time, que publicámos na VISÃO da semana passada, punha a hipótese de esta polarização não passar de um mito. Os autores citam inquéritos recentes que dão conta do facto de a oposição propagada pelos noticiários ser mais do domínio da perceção e não ter correspondência total com a realidade. De acordo com esses dados, nem os extremistas superam os moderados nem os americanos estão irremediavelmente divididos. Pode até parecer um cenário demasiado otimista, mas vale a pena perguntar: e se Butler for a confirmação de que, afinal, não vivemos na era dos extremos que nos vendem?
A antiga sala de reuniões do grupo parlamentar do PS foi transformada num gabinete para Pedro Nuno Santos. Mas, por enquanto, o secretário-geral socialista para pouco por lá. Na maior parte do tempo, está no primeiro andar do Largo do Rato. É ali que se concentra o seu quartel-general e onde tem recebido nas últimas semanas todo o tipo de pessoas, das que lhe pedem audiências até às que chama para ter opiniões sobre os mais diversos assuntos. “Ele ouve pessoas do seu inner circle, mas também pessoas que não estão ativas no PS e outras não socialistas”, conta à VISÃO um dirigente socialista, explicando que grande parte destes primeiros três meses na oposição foram passados a arrumar a casa.
A ressaca do poder é complicada. Depois de oito anos no governo, muitos militantes colocados em gabinetes perderam os lugares, numa altura em que o grupo parlamentar também encolheu e, com ele, o financiamento do partido. Foi preciso fazer uma reestruturação, que ainda está em curso. Mas que Pedro Nuno aproveitou também para renovar e reformular a equipa que estava no Rato, com uma aposta grande na comunicação. “O PS precisa de melhorar muito a sua comunicação e de rejuvenescer a sua informação”, diz um dos responsáveis pela estrutura socialista. Para o conseguir, Pedro Nuno Santos contratou uma equipa para fazer “assessoria política robusta” e preparar argumentário político.
As mudanças não deixaram todos contentes e, durante semanas, foi preciso resistir a essa pressão, mas pela primeira vez em muitos anos não há assessores a trabalhar no Largo do Rato pagos pelo Parlamento. Esse foi um ponto de honra para a líder parlamentar do PS, Alexandra Leitão, que foi aceite pelo secretário-geral. “Foi preciso fazer uma reorganização financeira. O Pedro Nuno nessas coisas é profundamente rigoroso e exigente. Tem muito cuidado”, assevera um dos seus mais próximos, explicando que houve uma necessidade de trazer para o Rato “novas pessoas, novas políticas”.
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Os conselheiros de Pedro Nuno
Hugo Mendes, o antigo secretário de Estado do Ministério das Infraestruturas que esteve no centro da polémica indemnização da TAP a Alexandra Reis, é uma das peças-chave da equipa que está com Pedro Nuno Santos no Rato. Apesar de todas as polémicas (que incluem indicações à TAP para alterar um voo para ficar nas boas graças do Presidente da República) e de haver no PS quem torça o nariz a esta escolha, Pedro Nuno Santos confia em Hugo Mendes, com quem trabalha há muitos anos e cujo pensamento respeita. Hernâni Loureiro, com quem também esteve no governo, é o seu chefe de gabinete. E Márcia Galrão, sua assessora de imprensa desde os tempos em que era secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, é quase a sua sombra, segue-o para todo o lado.
Pedro Nuno está a fazer uma reestruturação do PS. Pela primeira vez, não há assessores no Rato pagos pela AR. E há uma equipa de assessoria política renovada na direção
Além desta equipa, Pedro Nuno Santos tem um núcleo duro político que inclui Alexandra Leitão, o deputado Pedro Delgado Alves, Pedro Vaz, que tem a pasta da organização do partido, mas também António Mendonça Mendes e Mariana Vieira da Silva, que eram muito próximos de António Costa e que são agora conselheiros de Pedro Nuno. Duarte Cordeiro, que esteve sempre ao seu lado, está agora mais afastado da política, agastado por ter sido envolvido na Operação Influencer, mas continua a aparecer no Rato sempre que é necessário. “Está a trabalhar na sua vida privada e tem menos tempo, mas não falha as reuniões do secretariado”, garante um dirigente socialista. Outros dos próximos de Pedro Nuno Santos desde os tempos da JS que se mantêm nesse grupo são Francisco César (hoje mais ocupado com a liderança do PS Açores) e João Paulo Rebelo, que é agora secretário nacional para administração do PS, herdando um cargo que em tempos foi do já falecido Luís Patrão. Em regra, estas são as pessoas que se sentam no Largo do Rato todas as terças-feiras para as reuniões de coordenação política com Pedro Nuno Santos.
Fora deste núcleo duro mais jovem, há uma figura que continua a ter um peso fundamental: o presidente do PS, Carlos César. “Há uma dimensão geracional neste grupo que acompanha o líder, mas César é uma das pessoas com quem Pedro Nuno mais se aconselha e é de outra geração”, diz Alexandra Leitão à VISÃO. De resto, por norma, é Carlos César quem acompanha sempre Pedro Nuno Santos nas idas a Belém.
A surpresa de Marta Temido e o “trabalho de formiguinha”
Descrito como alguém que gosta muito de ouvir os que o rodeiam, Pedro Nuno Santos consegue, ainda assim, surpreender o seu núcleo duro e até contrariá-lo. Foi o que aconteceu quando escolheu Marta Temido para cabeça de lista às europeias. Na disputa pela liderança, Temido não tinha apoiado publicamente nem Pedro Nuno nem José Luís Carneiro, mas tinha na concelhia do PS alguma oposição interna de pedronunistas e o apoio de carneiristas, pelo que por aí não seria uma escolha óbvia. “Marta Temido não colhia muita unanimidade [no núcleo duro]”, revela um dirigente socialista. Mais: vários dirigentes do PS garantem à VISÃO que a lista para as europeias foi mantida em segredo por Pedro Nuno quase até à sua apresentação. “Soube das listas quando elas foram ao Secretariado Nacional”, confessa um membro daquele órgão.
A forma como geriu esse dossier foi sinal de que não se deixou influenciar e um argumento de peso interno fundamental para um líder que tem de fazer o caminho das pedras da oposição. “As europeias eram um teste. Se tivesse perdido, internamente agitavam-se mais as águas”, diz uma fonte próxima de Pedro Nuno. “As europeias já foram um bom sinal. O normal era o Governo limpar essas eleições. O Pedro Nuno arriscou, foi à luta e ganhou, mesmo que não seja por muitos votos”, nota outro socialista.
Depois de semanas mais fechado no Largo do Rato, Pedro Nuno vai voltar à estrada e ouvir o partido. Foto: José Carlos Carvalho
O empenho de Pedro Nuno Santos nas eleições para o Parlamento Europeu foi tal que esteve quase sempre na estrada, ao lado de Marta Temido. Depois de semanas fechado no Rato, fez a campanha e voltou à sede socialista. “Está a ouvir imensa gente da sociedade civil no Rato, de forma discreta”, revela Alexandra Leitão. O trabalho de bastidores, que um membro da sua equipa descreve como sendo “de formiguinha para construir uma alternativa ao Governo”, faz com que tenha voltado a fechar-se mais. E isso leva alguns críticos internos a falar num “grande fechamento” desta direção.
As pressões internas e o “gelo fino” do OE
Quem esteve com José Luís Carneiro nas diretas lamenta que o candidato derrotado não tenha sido “chamado nem ouvido, nem sobre as listas para as legislativas e europeias nem sobre a composição de comissões parlamentares nem sobre opções políticas”. Na ala carneirista também se aponta o dedo à forma como a geração de Pedro Nuno (que anda pelos 40 do líder e os sub-40, em que estão os também cada vez mais influentes Marina Gonçalves e Miguel Costa Matos) está a comandar o partido. “Há um sentimento de que se está a desguarnecer a relação intergeracional. Esse é o aspeto mais negativo desta liderança.”
Há semanas que Pedro Nuno ouve no Rato socialistas e independentes. O líder quer usar os Estados Gerais para renovar o programa do PS “à esquerda”
Na cúpula do PS desvalorizam-se essas críticas. “Os partidos têm todos estas coisas e muito mais quando o líder não é primeiro-ministro. A 6 de novembro, no PSD todos diziam que Luís Montenegro não tinha gravitas nem estofo para ser líder”, diz um dirigente socialista. “Não vejo onde há fechamento. Há é duas ou três pessoas que queriam fazer parte do círculo e não fazem. Mas há na direção pessoas que vêm do círculo próximo do governo anterior”, frisa Alexandra Leitão.
Conquistado o desafio das europeias, a pressão sobre a liderança do PS está toda no Orçamento do Estado para 2025. “Há opiniões para tudo. Ninguém sabe qual é a melhor linha”, desabafa um elemento do Secretariado Nacional, admitindo que o tema “está a ser sufocante” para o PS. “Está-se sobre gelo muito fino mesmo”, declara outro dirigente. A saída, para já, foi encontrada na Comissão Política Nacional do PS que, nesta segunda-feira, mandatou o líder para negociar com o Governo “sem linhas vermelhas”.
Problema? O PS vê já, com a soma das medidas anunciadas, a margem orçamental de Costa muito comprometida. “O Governo vai viabilizar a matéria fiscal com a direita e depois vão negociar connosco um Orçamento com menos dois mil milhões de euros?”, questiona um dirigente. “Ou o PS deixou os cofres mais cheios ainda do que andou a dizer ou isto vai ter de ter um fim.”
Apesar destas dúvidas, na terça-feira ficou a saber-se que o Governo chamou todos os partidos da oposição para negociar o Orçamento. O resultado dessas conversas é uma incógnita, mas na direção do PS viu-se a iniciativa com agrado.
A tática para esvaziar a ala direita
Há semanas que Pedro Nuno ouve no Rato socialistas e independentes. O líder quer usar os Estados Gerais para renovar o programa do PS “à esquerda”
Na direção do PS sublinha-se a ideia de que Pedro Nuno Santos tem tentado fazer acordos com a AD. “Ele queria muito que houvesse acordo no IRS”, diz um dirigente, enquanto outros notam o repto para um pacto sobre a Justiça que, até agora, ainda não teve sequência da parte do Governo, mas no qual o PS já está a trabalhar para avançar com propostas que sirvam de base a uma conversa que os socialistas gostariam que resultasse num “consenso” com a AD.
Independentemente do resultado das negociações sobre o Orçamento, o núcleo duro de Pedro Nuno vê já na afirmação de abertura ao diálogo que saiu da Comissão Política Nacional uma forma de arrumar a ala direita do partido. “Nem a ala direita aceita que viabilizemos sem diálogo, seria uma humilhação para o PS.” É que a aprovação do Orçamento do Estado para garantir a governabilidade e a execução do PRR era um dos grandes argumentos dos socialistas que estavam com José Luís Carneiro na disputa pela liderança.
Mas não é só a ala direita que pressiona internamente para a viabilização do Orçamento. Os autarcas socialistas, encabeçados pela pedronunista Luísa Salgueiro, têm deixado clara a importância de haver estabilidade para executar fundos comunitários num ano que é de contagem decrescente para as autárquicas. “Qual é a véspera de ano eleitoral em que não há autarcas nervosos? É o normal, é o clássico”, reage-se no Rato.
O “carinho” de que o partido precisa
“Houve uma diminuição do grupo parlamentar, deixámos de ter governo, mas o partido tem uma vida que vai para lá disso”, afirma Pedro Vaz, o dirigente responsável pela estrutura que garante que “o partido está vivo” apesar de estar ainda a adaptar-se a estar na oposição. “O PS tem uma capacidade muito grande de se regenerar”, declara, lembrando que há duas semanas houve 50 mil militantes a votar nas eleições internas para as concelhias, o que considera ser uma mostra de vitalidade, num momento em que já se veem as autárquicas de 2025 no horizonte.
Durante anos, Pedro Nuno Santos fez aquilo a que se costuma chamar “a rota da carne assada”. Poucos conhecerão tão bem o aparelho socialista como ele. Essa proximidade era uma das marcas que o tornaram tão desejado no PS. Mas ser líder, ficar na oposição e ter pelo meio eleições na Madeira e europeias tornou mais complicado manter o registo de proximidade e resposta rápida que sempre teve quando era o putativo candidato a secretário-geral. Há quem se ressinta disso. “Hoje, é mais difícil falar com Pedro Nuno”, admite um deputado que o apoiou nas diretas.
José Luís Carneiro, pelo contrário, tem aproveitado para fazer o seu caminho, ensaiar aproximações, criar pontes. “Se Carneiro se eclipsasse, seria estranho. Está a esbracejar para se manter à tona”, diz um membro do secretariado. Até agora, sem grandes resultados visíveis e sem que as recentes eleições para as concelhias e secções sejam mostra de uma onda carneirista. Aliás, as eleições para as federações, que estão marcadas para setembro, também não parecem permitir (pelo perfil dos candidatos) fazer leituras nacionais. “Se há coisa que o Pedro Nuno Santos tem bem oleada é o aparelho”, diz um alto dirigente socialista.
De resto, Fernando Medina, visto como outro potencial futuro candidato a líder, tem estado discreto. “Vai pouco às comissões no Parlamento”, nota um dirigente, enquanto outro releva a forma como Medina veio a terreiro defender as contas do PS e ajudar no combate à narrativa que a AD ensaiou sobre um possível desaire orçamental atribuível ao PS que até agora tem sido desmentido por todas as instâncias.
Mesmo assim, há pelo menos uma contenda nas eleições federativas que pode constituir um embaraço para o líder: Aveiro, o seu distrito, tem dois candidatos pedronunistas que são seus amigos próximos. Hugo Oliveira disputa o lugar de Jorge Sequeira, numa guerra fratricida que dentro do PS é vista como potencialmente criadora de problemas para Pedro Nuno. Apesar disso, Pedro Nuno Santos preferiu manter-se neutro. A explicação, dada por quem lhe é próximo, prende-se com o histórico de os secretários-gerais do partido se manterem afastados das disputas pelas estruturas.
Consciente da importância da máquina partidária, no núcleo duro de Pedro Nuno compreende-se que “o partido também precisa de carinho” e que nesta fase será preciso dar “carinho redobrado” às estruturas. O que acontecerá terminadas as eleições federativas.
Pedro Nuno, o ponderado
Quem está mais próximo de Pedro Nuno Santos garante que a imagem de alguém impulsivo já não faz sentido. “Hoje em dia, é ponderado. Não era. Mas é de convicções fortes. Discute, debate e decide. Quando decide, vai até ao fim”, descreve quem o conhece desde os tempos da faculdade. “Pedro Nuno Santos é bastante institucional, ouve bastante. Não é impulsivo. Eu próprio conhecia-o mal”, diz um dos socialistas que só começaram a aproximar-se de Pedro Nuno depois de ele ter chegado a secretário-geral.
A inesperada crise política que fez cair o governo de maioria absoluta de Costa baralhou os tempos de Pedro Nuno Santos, que tinha acabado de se estrear como comentador na SIC Notícias e que procurava distanciar-se das polémicas relacionadas com a TAP e com a localização do novo aeroporto. “Estava a fazer o seu percurso, a dar-se a conhecer ao País. De um dia para o outro, mudou tudo. Ele sentiu muito isso na pele”, admite um amigo, que diz que o resultado nas europeias ajudou a dar-lhe outro fôlego, e que as sondagens que mostram o PS em (ligeira) vantagem em relação à AD também ajudam.
Leitura para essas sondagens? “As pessoas não confiam, não acreditam na AD”, diz uma fonte próxima de Pedro Nuno Santos, notando que em 2016, depois de ter ido para o governo sem ser o partido mais votado, o PS já liderava as intenções de voto, pelo que o natural, “ainda para mais a anunciar milhões”, seria a AD ter uma vantagem nestes estudos de opinião.
Depois da rentrée, Pedro Nuno Santos deve voltar a sair mais do Largo do Rato e a usar aquele que é um dos seus maiores trunfos: o contacto pessoal. “Ele é fortíssimo no contacto pessoal. Nunca estive numa reunião com ele em que não sentisse uma verdadeira surpresa de agrado nos interlocutores. Mistura uma densidade ideológica com o lado pragmático daquela coisa de fazer e não arrastar os pés”, descreve um dirigente socialista. Por enquanto, Pedro Nuno tem feito algumas saídas temáticas (nas últimas semanas, fez visitas sobre Habitação, Saúde e empresas), que servem também para falar à comunicação social, mas em breve a dose de rua deve aumentar.
“É preciso ter calma”, o ciclo não é um sprint
O próximo passo serão os Estados Gerais, que ainda não têm data, mas que poderão acontecer só depois do Orçamento do Estado. “Estamos a montar uma estrutura”, diz Pedro Vaz. Os contactos que Pedro Nuno Santos tem feito nas últimas semanas com muitos não militantes de várias áreas da governação têm ajudado a preparar o evento que o PS espera que sirva para retomar a iniciativa política e dar resposta à campanha de apresentação de pacotes que tem sido feita pelo Governo.
O calendário para o anúncio dos Estados Gerais está a ser apontado para o último trimestre do ano e o trabalho está a ser feito sem ter em conta o Orçamento do Estado. “Não estamos a tomar decisões em função disso”, assegura uma fonte próxima de Pedro Nuno Santos, que não está a olhar para este ciclo político como um sprint, mas antes como uma maratona. Os Estados Gerais são a prova disso: está ser gizado um evento que se prolongará com iniciativas ao longo de meses.
Depois disso, terá de encontrar soluções para as autárquicas, com Lisboa à cabeça, numas eleições que se complicam por grande parte dos autarcas socialistas ter atingido o limite de mandatos e por, na capital, Carlos Moedas estar só no primeiro. E há ainda que cumprir a promessa de o PS ter um candidato forte para as presidenciais, um desafio que se torna mais difícil sem poder contar com António Costa, no Conselho Europeu, nem com António Guterres, na ONU.
“Temos de ter calma e paciência e recuperar pessoas”, diz uma fonte da cúpula do PS, explicando que a estratégia passará por fazer “uma renovação programática do partido à esquerda”, mas rejeitando a ideia de que Pedro Nuno Santos vá posicionar-se como um Jeremy Corbyn à portuguesa. “O que é que fizemos de esquerdista até agora?”, pergunta um dirigente socialista, enquanto uma fonte da direção da bancada parlamentar nota que o PS “votou sempre ao lado do Governo nas matérias que envolviam a Administração Pública”, incluindo para travar as propostas do Chega, do PCP e do PAN para aumentar as forças de segurança.
A aposta será, por isso, em “conquistar quem está na abstenção”. O PS tem feito estudos eleitorais que ajudaram a firmar a ideia de que o partido perdeu poucos votos para a AD e “quase nenhuns para IL”, mas que “há um eleitorado que está desmobilizado” e que “se desencantou com os partidos do centro”. É para esses que Pedro Nuno quer trabalhar.
HABITAÇÃO
A par da Saúde, a Habitação é quase unanimemente considerada um dos problemas mais graves que os portugueses enfrentam. O Governo parece ter também elegido esta área como “a” prioritária, tendo apresentado o plano (30 medidas distribuídas por cinco áreas) apenas um mês após a tomada de posse.
Para incentivar a oferta, o Executivo propõe disponibilizar imóveis públicos com renda ou preço acessível, aproveitando, por exemplo, imóveis devolutos ou subutilizados, alterar a Lei dos Solos para facilitar a construção, além de medidas de estímulo à construção (bónus construtivo para aumentar os índices de densidade urbanística, garantias e linhas de crédito do Estado, estímulo à atração de mão de obra e redução do IVA para 6% na construção e na reabilitação, até 2028).
Na promoção de habitação pública, promete-se desbloquear 25 mil casas do PRR e reforçar o financiamento para projetos não abrangidos pelo PRR, ao mesmo tempo que são revogadas iniciativas do governo anterior, como o arrendamento forçado e a substituição do Estado como arrendatário, do Mais Habitação.
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Há ainda várias medidas a que o Governo chama “simplificação”, que passam por uma maior liberdade na escolha do seguro (não terá de ser um prestador escolhido pela entidade que financia a compra do imóvel), iniciativas de desburocratização, aprovação do Código da Construção, implementação de tecnologias digitais para acelerar os processos de licenciamento e revogação da Contribuição Extraordinária sobre o Alojamento Local.
Finalmente, para fomentar a habitação jovem, avançam a garantia pública aos jovens para compra de casa, a isenção de IMT e do Imposto de Selo até aos 35 anos (cujo decreto-lei já foi aprovado), um programa de emergência para o alojamento estudantil e um plano nacional de alojamento com mais 18 mil camas até 2026 e a reformulação do Porta 65, para “colocar a realidade económica do jovem em primeiro lugar, acabando com exclusões em função de limites de rendas”.
Os setores da construção, da promoção imobiliária e do mercado de arrendamento receberam bem as medidas, ao passo que associações que lutam pelo direito à habitação criticam o aumento da liberalização, que temem fazer aumentar a especulação imobiliária.
SAÚDE
Cinco dias depois do pacote para a Habitação, o Governo apresentou o Plano de Emergência e Transformação na Saúde. O objetivo, anunciou o Executivo, é combater “a desigualdade no acesso à Saúde, melhorar a resposta do SNS” e “valorizar os profissionais de Saúde”, contando com “parceiros do setor social e privado como complemento na prestação de serviços”, quando “esgotada a capacidade de resposta do SNS”.
O pacote está também dividido em cinco áreas, ou “eixos estratégicos”: Resposta a Tempo e Horas, Bebés e Mães em Segurança, Cuidados Urgentes e Emergentes, Saúde Próxima e Familiar e Saúde Mental.
Entre as medidas relativas à primeira área, destaca-se o regime especial para admissão de médicos, com mais de 2 200 vagas, incluindo 900 para médicos de família. O Governo promete também eliminar a lista de espera para cirurgias de doentes oncológicos (há mais de nove mil em lista de espera acima dos Tempos Máximos de Resposta Garantidos), criar um programa de cirurgias para outros doentes, reforçar a aposta no serviço telefónico SNS 24 e o acesso às consultas especializadas, implementar um programa de monitorização à distância de doentes crónicos e alargar a hospitalização domiciliária.
Para a maternidade, a atenção vai para a criação de um canal de apoio telefónico especializado (linha SNS Grávida) e de um regime de atendimento referenciado de Ginecologia de Urgência, atribuição de incentivos financeiros para aumentar a capacidade de realização de partos e reforço de convenções com os setores social e privado.
No que respeita às urgências, o programa promete requalificar as infraestruturas dos Serviços de Urgência (incluindo Psiquiátrica), criar centros de atendimento clínico para situações agudas de menor complexidade e urgência clínica e implementar o conceito de consulta do dia seguinte nos Cuidados de Saúde Primários. Pretende-se ainda libertar camas hospitalares indevidamente ocupadas, através de protocolos com lares e instituições sociais (além da hospitalização domiciliária).
No caso da saúde familiar e mental, além do aumento de vagas para médico de família, o Governo pretende reforçar a resposta pública aos cuidados de saúde primários “em parceria com o setor social” e criar uma linha de atendimento para utentes que necessitem de acesso a médico no dia. No caso da saúde mental, anuncia-se ainda a contratação de 100 psicólogos para centros de saúde e de um programa específico para as forças de segurança.
As maiores críticas a este plano são ideológicas: à esquerda, aponta-se uma demasiada aproximação ao setor privado. Do lado dos médicos, há reservas quanto à forma dos incentivos, com os sindicatos a acusarem o Governo de optar por incentivos temporários e não por uma aposta na valorização da carreira.
ECONOMIA
O programa Acelerar a Economia – Crescimento, Competitividade, Internacionalização, Inovação e Sustentabilidade consiste em 60 medidas fiscais e económicas para “responder a 20 desafios para acelerar o crescimento da economia”. Aprovado em Conselho de Ministros no início deste mês, o pacote divide-se, tal como os da Saúde e da Habitação, em cinco vetores de intervenção. Na Escala, Consolidação e Capitalização, o Governo pretende reduzir o IRC até 15% (“gradualmente”), criar um novo conceito de grupos de IVA para reduzir a burocracia e melhorar a tesouraria das empresas e “oferecer” benefícios fiscais para mais-valias e dividendos obtidos por pessoas singulares na capitalização de empresas. No capítulo Financiamento, o Executivo compromete-se a lançar o plano Estado a Pagar em 30 Dias (os tempos alargados de pagamentos do Estado aos fornecedores constituem uma importante causa de constrangimento económico das empresas), alargar a isenção de imposto de selo às operações de gestão centralizada de tesouraria, assim como aumentar a elegibilidade do regime de IVA de caixa e lançar as Obrigações Turismo 2024 para diversificar as fontes de financiamento (ideia do ex-ministro da Economia, Pedro Siza Vieira).
No campo do Empreendedorismo, Inovação e Talento, o pacote passa pelo reforço do programa Doutorados nas Empresas, pela colocação de investigadores e professores nos órgãos sociais ou como acionistas de startups e pela revisão do Sistema de Incentivos Fiscais à Investigação e ao Desenvolvimento Empresarial. Segue-se a Sustentabilidade, com iniciativas de prémios e apoios para incentivar os critérios ESG (sigla internacional para Ambiente, Social e Governança), o turismo sustentável e a biotecnologia azul. A Clusterização remata o plano, com o lançamento de um programa para a Defesa, a aceleração da economia circular no comércio e nos serviços, a conclusão do Plano de Ordenamento do Espaço Marítimo Nacional, o reforço da marca “Portugal” além-fronteiras e a aposta na reindustrialização.
CORRUPÇÃO
A Agenda Anticorrupção é composta por 32 medidas, englobadas em prevenção, punição, celeridade processual e proteção do setor público. Entre elas encontram-se a regulamentação do lóbi (que foi recebida com críticas da esquerda), a redução do recurso a assessoria externa, o aumento da disponibilização de documentos administrativos do Estado, a obrigação de as vendas judiciais serem feitas em leilão eletrónico, a reversão de bens e proventos económicos da corrupção a favor do Estado, o agravamento da pena acessória de proibição do exercício de funções públicas e a criação de uma “lista negra” de fornecedores do Estado e de um canal de denúncias único, além de um mecanismo de proteção de denunciantes. Aposta-se igualmente em novas capacidades de obtenção de prova (alargando os mecanismos de colaboração premiada e de trocas de informação entre autoridades judiciárias, e ainda atualizando o regime legal dos meios de obtenção de prova em ambiente digital, por exemplo). E há ainda investimento no reforço de conteúdos curriculares sobre ética, literacia financeira, corrupção e a relação dos cidadãos com o Estado. A criminalização do enriquecimento ilícito, no entanto, ficou de fora.
MIGRAÇÕES E ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
A face mais visível do Plano de Ação para as Migrações é o fim da figura de “manifestação de interesse”, que permitia aos imigrantes virem para Portugal em busca de emprego – agora, é necessário pedir um visto no consulado, com contrato de trabalho (com exceção dos imigrantes da CPLP). Será também reforçada a capacidade de resposta dos serviços consulares, com 45 novos elementos, e criado um sistema de atração de capital humano, assente nas carências de mão de obra. Entre as 41 iniciativas, está ainda a Estrutura de Missão para a Recuperação de Processos Pendentes da AIMA, com 300 novas pessoas. No setor da Administração Pública, destaca-se a obrigação de todos os serviços públicos terem atendimento diário sem marcação, interrompido por vários serviços durante os confinamentos e não retomado por diversas entidades.
O Portugal vs Eslovénia foi um jogo sofrido, que só se resolveu (a favor da Seleção Nacional) nas grandes penalidades. Mas o que aconteceu a seguir com a comitiva do Governo que se tinha deslocado até Frankfurt é usado por Miguel Pinto Luz, um dos ministros do núcleo duro de Luís Montenegro, para descrever a forma como o primeiro-ministro se tem mantido “terra a terra” e sabido criar um espírito de equipa e proximidade entre os que o rodeiam. “O Falcon que ia transportar-nos avariou em Frankfurt. Era uma e tal da manhã e só havia voos comerciais lá para as 6h. Apesar de ser um aeroporto enorme, estava tudo fechado. Não havia nenhum lounge aberto”, relata Pinto Luz à VISÃO, contando o que considera ser um episódio revelador do que tem sido Montenegro como primeiro-ministro. “Outro teria pedido para se arranjar um hotel. Ele pediu um escritório dentro do aeroporto e para se ir buscar a comida ao Falcon.”
Na comitiva, que incluía umas dez pessoas, estavam também o ministro dos Assuntos Parlamentares, Pedro Duarte, o omnipresente assessor de imprensa Pedro Esteves, o seu chefe de gabinete, Pedro Perestrelo Pinto, e dois seguranças. Ficaram todos “num escritório de uma pequena companhia aérea de charters”, espalhando-se como podiam por cadeiras e sofás. Pela noite fora, comeram-se as sandes, os pregos e os pastéis de nata que estavam no avião avariado e foi-se conversando, enquanto um ou outro passava pelas brasas. A noitada acabou por ser mais leve porque Portugal ganhou. “Isto demonstra que continua um homem humilde, próximo dos seus”, insiste Miguel Pinto Luz.
Nestes primeiros três meses de Governo, não têm faltado noitadas a Luís Montenegro, mas, garantem os que lhe estão mais próximos, também não lhe têm faltado energia e a vontade de criar um núcleo coeso. O tal “Governo de combate”, como lhe chamaram muitos comentadores quando tomou posse, tem sido gerido por Montenegro como uma malha apertada, de onde não escapa nada. Toda a informação que sai é gerida com cuidado extremo. E esse é talvez um dos aspetos em que Luís Montenegro mais segue a cartilha de um dos políticos que mais admira e que mais o influenciam, Aníbal Cavaco Silva.
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A malha apertada e os testes de lealdade
Tal como Cavaco, Montenegro faz pequenos testes de lealdade. Dá informações a alguns que não dá a outros, para perceber de onde podem vir possíveis fugas para a imprensa. “Percebi que estava a fazer isso quando foi da constituição do Governo. De mim, ninguém soube nada”, comenta um dirigente do PSD. “Isso é profissionalismo. As mensagens não podem ser desconexas e avulsas. Mas Luís Montenegro tem a preocupação de privilegiar o conteúdo das medidas”, declara à VISÃO o ministro Adjunto e da Coesão, Manuel Castro Almeida.
Tal como Cavaco, Montenegro faz testes de lealdade. Dá informações a alguns e não a outros, para perceber de onde podem vir possíveis fugas para a imprensa
Uma gestão muito meticulosa da informação é, aliás, uma das principais características deste Governo. “O Pedro Esteves é que coordena tudo. Pede que se envie para ele todo o tipo de informação e ele é que valida o que comunicamos”, explica um dos assessores de imprensa do Executivo. Esteves, que trabalhou muitos anos com Paulo Rangel em Bruxelas e que veio para Lisboa ajudar na campanha de Carlos Moedas nas últimas autárquicas, é uma das peças do núcleo duro de Luís Montenegro, essencial para controlar, validar e distribuir informação.
Hugo Soares, mesmo fora do Governo, é ainda o braço direito do líder. Não só controla o partido, como secretário-geral do PSD, mas também gere a bancada social-democrata, como líder parlamentar. E, acima de tudo, é o mais próximo de todos os que rodeiam Luís Montenegro, aquele com quem o primeiro-ministro mais fala e que todos os ministros sabem que tem a autoridade de ser esse elo preferencial de ligação ao líder.
Os homens que contam e a família montenegrista
Muito próximo de Luís Montenegro há vários anos, Hugo Soares faz parte de um grupo que o acompanha desde os tempos em que era líder parlamentar no governo de Pedro Passos Coelho. Ana Cristina Gaspar, outra assessora de imprensa, faz parte desse núcleo, como a própria secretária, Célia, que esteve consigo no Parlamento, na sede do partido na São Caetano à Lapa e está agora em São Bento.
António Leitão Amaro, o ministro da Presidência, também está neste inner circle desde os tempos do governo de Passos. Afastado da política durante a maior parte do tempo da governação socialista, é agora um dos elementos-chave do Governo.
O círculo não se esgota, porém, nestes fiéis de há muitos anos. Ricardo Carvalho, um dos secretários-gerais adjuntos do PSD, por exemplo, só conheceu Luís Montenegro há dois anos, no Congresso do Porto que o consagrou como líder do PSD, mas já está entre aqueles em quem mais confia. “Acabamos por criar relação com estas pessoas. Somos uma família dentro da família política. Isto é muito intenso”, descreve à VISÃO Ricardo Carvalho.
Outros exemplos de membros recentes desta “família” montenegrista são Paulo Rangel ou Castro Almeida, dois dos ministros que lhe são agora mais próximos e que, como nota um dirigente do PSD, chegaram a ser seus adversários internos. “Isso só mostra como tem gerido o partido com total integração e abertura. Já tinha feito essa aproximação aos que não tinham estado consigo no partido, antes de chegar ao poder.”
Joaquim Miranda Sarmento, ministro das Finanças, é outro que, apesar de alguns desacertos públicos na comunicação e de ter vindo das fileiras de Rui Rio, faz parte desta entourage, mesmo que seja visto mais como “um académico” e menos como alguém com habilidade política. “O ministro das Finanças tem imenso respeito do Conselho de Ministros e do primeiro-ministro. Não há quebra de autoridade dentro do Governo”, declara Castro Almeida.
Reportagem na noite eleitoral com a Aliança Democratica ( AD) de Luis Montenegro (PSD) e Nuno Melo (CDS7PP) no Hotel Sana em Lisboa.
Vitória da AD, com o lider Luis Montenegro a poder formar governo.
10 Março 2024
Foto: José Carlos Carvalho
Quem não está entre aqueles que Luís Montenegro ouve com regularidade, ao contrário do que se tem dito, é Cavaco Silva. “Ele tem uma enorme admiração por Cavaco, mas não vem daí nenhum aconselhamento. Fala com os ex-líderes, mantém esse respeito, mas eles não fazem parte do núcleo duro”, afiança um dos mais próximos de Montenegro.
Quem se senta nos Conselhos de Ministros assegura que Luís Montenegro tem sabido criar “uma equipa que trabalha como equipa”, para já ainda “sem competições” e com todos os governantes a remar para o mesmo lado. “Tem havido um enorme espírito de colaboração e acho que se deve a ele. A equipa é muito coesa”, declara um ministro, explicando que nas reuniões do Conselho de Ministros, Montenegro tem tido o cuidado de “dar a palavra a todos” e de conduzir as reuniões “sem conflitos”. Manuel Castro Almeida reforça a ideia: “É um líder que fomenta muito o espírito de equipa. Tem a consciência de que o bom governo se faz em equipa e não com a procura de estrelato.”
O método dos pacotes
Os pacotes com que o Governo tem pontuado a governação e controlado a agenda política são outra prova da forma como Luís Montenegro parece ter aprendido a importância de comunicar. Não só há uma preocupação em preparar os PowerPoints e em construir um calendário à volta disso, mas também em controlar a informação, para que nada saia antes do tempo decidido pelo Executivo. “Mantemos tudo em segredo até a última”, nota um governante, que revela como é que isso tem sido conseguido. “São poucos os intervenientes que sabem o que está a ser decidido. Quando as coisas vão a Conselho de Ministros, já está tudo decidido”, explica a mesma fonte.
Hugo Soares é com quem o primeiro-ministro mais fala e tem a autoridade de ser esse elo preferencial de ligação ao líder
Um exemplo? Quando Luís Montenegro avançou com o anúncio da localização do novo aeroporto de Lisboa, a 14 de maio, só o ministro Miguel Pinto Luz sabia do que estava a ser preparado. Esse momento foi, de resto, uma viragem na imagem pública do Governo, que tomou posse a 2 de abril. A forma como o primeiro-ministro cumpriu a promessa de decidir sobre um dossier que se arrastava há mais de 50 anos serviu para o Executivo se afastar de uma imagem de casos e casinhos que tinha ficado nas primeiras semanas de governação e para Luís Montenegro começar a apresentar-se como um fazedor.
A partir daí, o método foi sempre o mesmo. O Governo marca cada semana com um grande anúncio, seja ele um pacote de legislação ou o agendamento de reuniões com a oposição no Parlamento para discutir medidas, ou até a mudança de instalações de seis ministérios e duas secretarias de Estado para o edifício da Caixa Geral de Depósitos, na Avenida João XXI, em Lisboa.
A decisão tinha sido de António Costa, as obras já andavam a bom ritmo, mas o Governo decidiu antecipar a mudança e garantir que 400 funcionários entravam na nova sede no dia 1 de julho. Na véspera, um domingo, o ministro Leitão Amaro foi até ao edifício acompanhar os últimos preparativos e dar uma palavra aos trabalhadores que lá estavam (uma equipa que já vinha dos tempos de Costa). O gesto foi bem-visto por quem estava nessa equipa.
Com seis ministérios já no mesmo edifício, garantir uma comunicação permanente e sem sobressaltos entre as várias áreas governativas ficou ainda mais fácil. “Falamos com mais facilidade. O contacto pessoal tornou tudo mais fácil”, admite Castro Almeida, que diz que não é raro andar uns metros para bater à porta de outro ministro e discutirem algum aspeto prático. Apesar disso, os grupos de WhatsApp são, tal como no governo anterior, uma das vias mais frequentes de contacto. Há vários grupos de WhatsApp a funcionar que, diz Castro Almeida, servem “para pequenos recados”. Mas, em qualquer via, Luís Montenegro é descrito por todos como muito disponível. “Tem uma vida de inferno, mas tem uma grande disponibilidade”, observa o ministro Adjunto e da Coesão.
A fórmula de apresentação de pacotes parece estar a ser ganhadora. Pela primeira vez, uma sondagem da Aximage para TSF-JN-DN, publicada no dia 15 de julho, mostra que os portugueses têm mais confiança no primeiro-ministro do que em Marcelo Rebelo de Sousa. São 35% aqueles que confiam mais em Montenegro, contra 27% que dizem confiar mais no Presidente da República. Dados como esse e outros estudos de opinião feitos pelo PSD são lidos com entusiasmo e cautela, em doses repartidas, em São Bento.
Na oposição aponta-se o dedo à forma como são construídos os pacotes apresentados pelo Governo: com muitas medidas que já vinham de trás sem que isso seja sinalizado, quase sempre sem calendarização e sem os respetivos custos. Uma governação de propaganda? Manuel Castro Almeida rejeita a ideia. “Chamo a isso planeamento. O primeiro-ministro gosta de planear. Há programação política e isso é visível. Isso parte dele. Não está dependente da iniciativa política dos ministros”, afirma, asseverando que há calendários definidos, mesmo que não sejam tornados públicos para serem escrutinados. “Claro que há calendários internamente. Não são apresentados nem é preciso que sejam. As pessoas querem é resultados e é preciso que os resultados apareçam.”
Luís Montenegro tem definido um calendário político a vários tempos, com planos para fazer apresentações a 30, 60, 90 dias ou um ano. Quem trabalha com ele insiste que isso é método de trabalho. “Não há vento que ajude quem não sabe para onde quer ir”, comenta Castro Almeida.
Com experiência política sobretudo no combate parlamentar, Luís Montenegro chegou este ano pela primeira vez a um cargo executivo. Quem o rodeia garante que procura preparar-se a fundo. “É um profundo conhecedor dos dossiers. Gosta de saber tudo em pormenor em todos os pacotes. Ele questiona e corrige, quer saber a explicação das coisas”, descreve um dos ministros do seu núcleo mais próximo, admitindo que essa atitude “é, de alguma forma, uma surpresa”.
A estratégia para governar em minoria
“O Governo construiu uma aceitação. Os estudos de opinião mostram isso. Os acordos com os polícias e os professores, a localização do aeroporto… Há uma imagem de Governo de realização”, diz à VISÃO uma fonte próxima de Luís Montenegro. Apesar disso, no Governo há cada vez mais a ideia de que o melhor será não ir a eleições caso o Orçamento do Estado chumbe em outubro. “Não há ninguém no País que queira eleições”, comenta um dos principais conselheiros do primeiro-ministro.
Nos últimos dias, tem sido notória a preocupação do Governo em passar a mensagem de que não está a seguir a cartilha de Cavaco Silva em 1987 para provocar uma crise política e ir a eleições reforçar a maioria para governar. “Leia os meus lábios: não vai haver eleições antecipadas”, dizia no início do mês o ministro Adjunto e da Coesão, Castro Almeida, numa entrevista ao Expresso. “Não se deita abaixo um governo com boa imagem, fazedor, que está a criar esperança. Os eleitores iriam penalizar nas urnas quem o fizesse”, reforça Castro Almeida à VISÃO, admitindo que a mensagem que transmitiu ao Expresso tinha sido articulada, como são sempre as comunicações dos membros deste Governo, “implícita ou explicitamente”.
Há várias razões para o Executivo querer passar a mensagem de que não quer ir a eleições. A primeira tem que ver com a noção, que existe no núcleo duro de Montenegro, de que “as pessoas estão cansadas” e não querem ir a votos novamente. A isto junta-se a derrota sofrida nas eleições europeias, cuja sombra Montenegro se tem esforçado por apagar, mas que não deixou de ser um sinal para a AD, e sobretudo a ideia de que quem aparecer como responsável por uma crise política será penalizado por ela nas urnas.
Além disso, as sondagens (muito favoráveis no que toca à popularidade do primeiro-ministro e mostrando uma clara maioria à direita) continuam a dar vantagem ao PS, mesmo sem maioria absoluta. Ou seja, ir a votos pode deixar tudo na mesma, com a agravante de haver o risco de os socialistas terem o candidato mais votado, quando Luís Montenegro sempre disse que só governaria ficando à frente em votos e não numa versão de direita da Geringonça.
A geometria parlamentar é difícil, mas quem está com Luís Montenegro garante não lhe notar sinais de frustração. “Não está frustrado, porque não sente inibição nenhuma na execução do programa do Governo. Está a cumprir o programa. Está até muito entusiasmado”, afirma uma fonte próxima do primeiro-ministro. “A geometria parlamentar em nada o frustra. Sabíamos das dificuldades que íamos enfrentar”, acrescenta o secretário-geral adjunto do PSD, Ricardo Carvalho. Sem maioria, Montenegro evita, porém, negociar com a oposição. E prefere mostrar que vai fazer tudo para aplicar o seu programa.
Apesar disso, Hugo Soares reconhece à VISÃO que “até agora, o momento mais duro no Governo foi não ter baixado os impostos à classe média por entender que era justo” o modelo de descida do IRS que a oposição travou no Parlamento. “Para ele foi difícil não ter conseguido”, diz o líder parlamentar e secretário-geral do PSD, que acha que, pelo contrário, o melhor momento até agora foi “a apresentação do pacote de medidas para os idosos”, que incluía o aumento do complemento solidário e medicamentos gratuitos para os cerca de 140 mil que beneficiam desta prestação social. “Foi a decisão que mais gozo lhe deu. Creio que isso se notou. Até se comoveu a falar disso nas jornadas parlamentares do PSD.”
Se não há frustração em Luís Montenegro, houve pelo menos um momento em que deu um murro na mesa, quando anunciou que não haveria “nem mais um cêntimo” para dar aos polícias além dos 300 euros que tinham sido oferecidos durante as negociações e em relação aos quais cinco sindicatos acabariam depois por fechar um acordo. Uma fonte que acompanhou de perto o processo diz à VISÃO que Montenegro falou sem avisar a ministra da Administração Interna, Margarida Blasco, do que ia dizer, embora Blasco já tivesse feito saber aos sindicatos que aquela era a última proposta.
Para quem está com Luís Montenegro, essa frase foi importante para passar a mensagem de que não vai ceder a todas as reivindicações, que são muitas, nem pôr em causa as contas certas. “É ele a ser ele mesmo. Tem um objetivo e cumpre. Há uma decisão, que é a que vai ao encontro do que foi o seu compromisso, e cumpre”, comenta Ricardo Carvalho. “Foi absolutamente intransigente. Mostrou que não está refém de ser primeiro-ministro de um governo minoritário”, acrescenta um dos seus ministros mais políticos.
O que é que tira, então, Luís Montenegro do sério? “Só a deslealdade ou um erro grosseiro. É muito difícil irritá-lo”, diz um dos seus amigos mais próximos. Outra característica: “Ouve muito, mas depois de decidir ninguém lhe muda as ideias.”
Distante de Pedro Nuno e Ventura, mas também de Marcelo
A relação com Pedro Nuno Santos tem sido até agora distante. Só por uma vez se encontraram presencialmente para falar, depois das eleições de 10 de março, e os contactos não têm sido frequentes. “Pedro Nuno Santos ainda está com dificuldade em decifrar este Luís Montenegro”, vangloria-se um dirigente social-democrata.
Com André Ventura, tem havido ainda mais distância. Sempre que a AD tentou fazer acordos com o Chega, as conversas foram entre Hugo Soares e Ventura, nunca com Montenegro. “É mais o Ventura que queria uma proximidade que nunca existiu”, garante um dos próximos de Montenegro.
Com Marcelo Rebelo de Sousa, a proximidade também não tem sido grande. O Presidente chegou, aliás, a admitir publicamente, num jantar com correspondentes da imprensa estrangeira em Portugal, que tem dificuldades em compreender o primeiro-ministro. Montenegro “é completamente independente, não influenciável e improvisador”, disse na altura Marcelo. Este perfil tem dado dores de cabeça a Belém, que se queixa de a articulação entre Governo e Presidência ser quase nenhuma. Mas é também uma marca de Luís Montenegro que, como Rebelo de Sousa descreveu nesse jantar, “só começou a convidar os ministros na manhã do dia” em que deveria levar ao Palácio de Belém a composição do Governo.
“Só ele tem isso na cabeça” é, de resto, uma resposta que se ouve muitas vezes aos colaboradores mais próximos de Luís Montenegro sobre decisões que guarda para si até ao último minuto, como aconteceu quando escolheu Sebastião Bugalho para cabeça de lista da AD às europeias em detrimento de Rui Moreira, com quem já tinha falado logo no congresso do PSD em que foi eleito.
Um ritmo frenético
O ritmo frenético começou no dia em que foi indigitado e partiu de madrugada para Bruxelas para um encontro do PPE. A indigitação foi decidida por Marcelo Rebelo de Sousa já passava da meia-noite e às 5h30 da manhã Luís Montenegro estava no Aeroporto Francisco Sá Carneiro, no Porto, pronto para apanhar o voo, depois de ter passado em casa, em Espinho, para fazer a mala e tomar um duche.
“Estava com energia, extremamente feliz e motivado”, conta Ricardo Carvalho, que o acompanhou nessa viagem e assistiu ao pequeno-almoço, “muito descontraído”, que Montenegro tomou com António Costa, que tinha ficado instalado no mesmo hotel de Bruxelas. “Sempre foi uma relação com grande cordialidade. António Costa é simpático e terra a terra e Luís Montenegro é igual. Foi um momento especial”, descreve.
Essa energia faz com que Montenegro se mostre sempre disponível para contactos com quem o aborda, mesmo que isso por vezes exaspere quem está na comitiva. “A proximidade é uma das características dele. Quando está, está mesmo. Às vezes, o difícil é tirá-lo dos sítios”, confessa uma fonte próxima.
A habitual silly season não lhe deve dar muito descanso, mesmo que faça questão de ter uns dias em família. Nos ministérios já se começa o trabalho preparatório para o Orçamento, as viagens internacionais têm sido mais que muitas (a próxima é para Angola, no dia 22) e, pelo meio, Luís Albuquerque já fez saber que gostaria de o ter na tradicional Festa do Chão da Lagoa, na Madeira, no dia 21.
No calendário, o PSD tem já umas diretas (sem história) a 6 de setembro e um congresso em Braga nos dias 21 e 22 desse mês, mesmo em cima do arranque da discussão orçamental e já com as autárquicas do ano que vem a obrigarem a aquecer os motores partidários. “O partido está muito mobilizado”, assegura Ricardo Carvalho, notando que houve 6 600 novas inscrições de militantes de janeiro a dezembro de 2023 e só 301 desfiliações. “Há muitos anos que não havia um crescimento destes.” Para já, o vento parece soprar de feição a Luís Montenegro, mas ainda vem aí muita turbulência.
Luís Montenegro
Um primeiro-ministro em construção
Foto: Tiago Miranda
Como pensa e decide o primeiro-ministro, quem o aconselha e que estratégia tem para liderar um governo minoritário. A VISÃO foi aos bastidores do Executivo para dar pistas sobre como funciona Montenegro. LEIA AQUI
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Pedro Nuno Santos
O renovador do PS
Foto: Marcos Borga
Ressente-se do “sufoco” da pressão para aprovar o Orçamento, mas pensa neste ciclo político como uma maratona. Eis o retrato e a estratégia de um líder a quem uma crise política trocou as voltas. LEIA AQUI
Quase a completar 30 anos, o mais camaleónico dos grandes festivais de verão nacionais parece ter encontrado não só um poiso definitivo como um perfil que o diferencia da concorrência. Recuemos até 1995, quando o Super Bock Super Rock, então realizado no Passeio Marítimo de Alcântara, no centro de Lisboa, deu início à idade moderna dos festivais de música em Portugal. Desde então, passou por muitos locais, e até cidades, mudando-se em 2019 para a Herdade do Cabeço da Flauta, no Meco.
Com a mudança para esta nova casa, parece ter mudado também o perfil do festival, que passou a assumir-se como uma alternativa aos blockbusters quase sempre repetidos de uma concorrência cada vez mais forte, chamando artistas mais fora da caixa, porventura mais de nicho e direcionados para um público mais jovem e conhecedor, muitas vezes em estreia nos palcos portugueses. Como acontece nesta edição com os italianos Måneskin, responsáveis pela ressurreição do glam rock junto de toda uma nova geração de ouvintes, especialmente depois da surpreendente vitória no Festival da Eurovisão, em 2021.
É à banda de Roma que cabe o estatuto de cabeça de cartaz do primeiro dia, quinta, 18, em que se destacam também a DJ e produtora russa Nina Kraviz, os britânicos Royal Blood, os “nossos” Capitão Fausto ou o norte-americano Tom Morello, eterno guitarrista dos Rage Against the Machine.
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Como já é habitual, desde há alguns anos, o SBSR volta a ter um dia dedicado ao hip-hop, quase sempre um dos mais concorridos, como se espera que volte a acontecer neste ano com a presença do anglo-americano 21 Savage e do português Slow J, que partilham entre si o protagonismo do segundo dia, sexta, 19. A cultura hip-hop volta ainda a estar em destaque, no sábado, 20, com as atuações do rapper britânico Stormzy e do seminal coletivo portuense Mind da Gap, de regresso ao ativo após nove anos de hiato.
Super Bock Super Rock > Herdade do Cabeço da Flauta, Sesimbra > 18-20 jul, qui-sáb a partir das 17h > €72 a €164