1. É Uma Esplanada

Num Chiado pejado de turistas, é bom saber que existe um sítio assim, com sombra e sossego. Chama-se É Uma Esplanada e funciona como cafetaria do Museu de São Roque. A esplanada que lhe dá nome está posta ao canto do Largo Trindade Coelho, mas é lá dentro, no antigo claustro do convento, onde também existem mesas e cadeiras, um pequeno lago e plantas, que mais apetece estar. Trata-se do quinto projeto de restauração da associação Crescer, para formar e integrar pessoas em situação de sem-abrigo, refugiados e requerentes de asilo no mercado de trabalho. Não sendo novo (abriu no final de 2022), renasce agora com outro vigor.

Foto: DR

A carta, sob a orientação de Nuno Bergonse, chefe consultor de todos os projetos gastronómicos da Crescer, reúne sobretudo tapas e petiscos (bolinhos de bacalhau, húmus de espinafres com pão pita, cornetos de salmão fumado com beterraba, tábuas de queijos e enchidos), saladas, um hambúrguer de novilho, tosta de frango e sobremesas caseiras. Também há propostas de brunch, como os ovos Benedict, tostas, croissants e panquecas (à carta ou num menu de €16). Sumos naturais, cerveja, chá, sangria, vinhos e cocktails acompanham os diferentes momentos do dia. Museu de São Roque, Lg. Trindade Coelho, Lisboa > T. 96 831 1760 > ter-sáb 10h-19h

2. Hemisfério

Quem conhece bem Oeiras lembrar-se-á do restaurante vegetariano Govinda, no alto do jardim municipal da vila. No seu lugar abriu, em junho, o Hemisfério, e quem passar por lá vai encontrar uma zona exterior, com mesas e uns bancos forrados com almofadas confortáveis que recortam o muro – onde se está muito bem, ao fim da tarde, a beber uma cerveja e a petiscar um trio de húmus, as batatas cortadas fininhas com maionese de trufa ou uns croquetes –, e uma sala envidraçada para refeições, decorada a palhinha e madeira e com vista para o jardim.

Do bar, no pequeno edifício octogonal classificado que aqui existe, saem cocktails de autor e clássicos (havia em Oeiras um sítio para beber um paloma ou um bellini?). A ideia inicial dos amigos e sócios André Simões e António Ricciardi, que cresceram em Oeiras, era que o Hemisfério fosse um sítio onde comer um brunch a qualquer hora (servido à carta) e um bar. Mas a reação das pessoas tem sido boa, conta António, de tal forma que começaram a servir também jantares de quarta a sábado. Na ementa fixa constam a shakshouka (prato do Médio Oriente, feito com ovos escalfados num estufado de tomate e harissa, queijo feta e creme de iogurte), um hambúrguer de carne com queijo cheddar e um molho secreto servido com chips de batatas, taças de salmão ou frango e um rosbife de vitela. R. Desidério Faria, 31, Oeiras > T. 91 394 9615 > ter-dom 10h-19h, qua-sáb até 24h

3. Madrasta

Instalou-se num edifício histórico dos anos 50, no Jardim Municipal de Paço de Arcos, à beira da Avenida Marginal, e logo nos últimos dias de março deu nas vistas, conquistando uma clientela que vai das famílias (mãe, pai, avós e netos) aos grupos de amigos, com e sem crianças (o jardim tem um parque infantil).

Foto: Hares Pascoal

O Madrasta, do grupo Non Basta, funciona como restaurante, com duas salas interiores decoradas com um painel da Oficina Marques e peças em cerâmica de Bela Silva, e uma generosa esplanada, onde se serve uma carta que combina as cozinhas portuguesa e italiana. Subindo uma escada em caracol, chega-se ao terraço (em inglês rooftop, como se prefere dizer agora) com vista para a outra margem, do Cristo-Rei à Costa da Caparica. A funcionar desde o final de maio, está decorado com cadeirões, pequenas mesas de madeira e chapéus de sol amarelos de pano. A carta é mais curta do que no restaurante, mas não menos apetecível. A arte de petiscar faz-se com ostras, pastéis de massa tenra, cachorro de lavagante, salmão de cura caseira com leite de tigre, carpaccio de polvo, prego do lombo e panuozzo de camarão ou de polvo. Na secção Estes Cocktails só no Rooftop, leem-se nomes como Palomita Express, Moscow Roof, Cumbia Sour e Nonna Spritz, mas também há vinho a copo e cerveja. R. do Jardim Municipal de Paço de Arcos > T. 21 151 3012 > seg-qui e dom 12h-00h30, sex-sáb 12h-1h

4. Selllva

A novidade aqui é que este restaurante cheio de boas vibrações, muito graças aos murais pintados pela ilustradora francesa Henriette Arcelin, que se inspirou no exotismo da fauna e flora selvagens, tem uma segunda morada. Se, na zona do Marquês de Pombal, o Selllva (assim mesmo com três “l”) fica numa rua sem saída, e por isso o trânsito não incomoda quem está na esplanada, em Campo de Ourique ganhou um pátio com muitas plantas nas traseiras. Ali, podemos tomar o pequeno-almoço ou um brunch (todos os dias até às 18h), petiscar, beber um sumo natural, almoçar e jantar. A carta, na qual não entra carne vermelha, tem opções saudáveis e pratos inspirados em cozinhas internacionais. Outra novidade é o bar de crudos, nome para sugestões que não passam pelo lume. Pode pedir sem grandes pressas e horários, pois o restaurante não encerra entre refeições. R. 4 de Infantaria, 29, Lisboa > T. 21 599 9631 > seg-dom 9h30-24h

São 19 horas e ameaça cair umas pingas de chuva (o que felizmente não aconteceu). Mas no terraço do The Rebello, junto ao cais de Vila Nova de Gaia, não há condição meteorológica que apague a belíssima vista que se alcança para o rio Douro, o casario do Porto e de Vila Nova de Gaia, com a Ponte Luíz I ao fundo.

A somar à paisagem, neste verão há uma carta com cocktails de autor (€12, cada) que nos quer levar numa viagem pelas Sete Maravilhas do mundo, preparados com licores, destilados, frutos, ervas e especiarias, característicos de cada país. 

Escolhemos o Chichén Itzá, que leva o nome das ruínas maias no estado de Yucatán, no México, feito com tequila, abacate, nachos e jalapeño. Poderíamos ter optado por viajar até ao Brasil, saboreando o Cristo Redentor, uma mistura de cachaça, catuaba, goiaba e lúpulo; ou à cidade perdida dos Incas no Peru, sorvendo um copo de Machu Picchu com pisco, ruibarbo, citronela e frutos vermelhos.

Na carta, constam ainda os cocktails Petra (Jordânia), Coliseu (Itália), Taj Mahal (Índia), Grande Muralha (China), mas estes destinos terão de ficar para outro dia. Quem prefira uma “viagem” sem álcool (mocktails €8) poderá experimentar três Maravilhas da Antiguidade: Babilónia (cenoura, gengibre e limão), Alexandria (flor de sabugueiro, maracujá e toranja) e Gizé (melancia, hortelã e gin sem álcool).  

A acompanhar estes destinos pelo mundo, também a nova carta de petiscos – da responsabilidade do chefe André Coutinho – nos leva para outras paragens, sempre a partir das 12 horas em diante. O difícil será escolher entre o antipasti de queijos e enchidos (de Itália), os tacos de birria ou espadarte fumado com guacamole (do México), o pastel de vento com carne de sol (do Brasil) e, entre outros, o kibe com molho de iogurte e especiarias (da Jordânia).

Descemos para jantar no Pot & Pan, o restaurante no rés do chão com uma decoração industrial e um nome alusivo à antiga fábrica de tachos e panelas que aqui funcionou. O chefe André Coutinho também fez mudanças na ementa, optando por uma viagem pela cozinha portuguesa com uma passagem pelo País Basco representado pelo arroz caramelizado de pato à antiga (€24). Nas carnes, as opções podem recair num frango piri-piri, feito no churrasco e servido numa travessa de inox (€18), ou num tornedó com molho de pimenta verde (€26).

Nos peixes, serve-se o pescado do dia com açorda (€25), aletria de lagostim e lulas (€29), arroz caldoso de sames e lombo de bacalhau (€22) ou, por encomenda, um robalo ao sal com arroz malandro de camarão e coentros (€110, 4 pessoas) e leitão assado a baixa temperatura (€220, 6 pessoas). Tudo para partilhar à mesa, porque a quantidade de comida é, dizem, “demasiado para um, insuficiente para dois”.

Começámos esta jornada pelas Sete Maravilhas do Mundo (no terraço) e terminámos em terras lusas (no restaurante Pot & Pan), mas fazer o contrário também é possível, encerrando a noite a olhar as luzes no rio e viajando, por exemplo, até à India com o cocktail Taj Mahal.

Bello Rooftop. Foto: Luís Ferraz

The Rebello > R. Cais de Gaia, 380 > T. 22 002 8940 > Bello Rooftop 12h-24h; Pot & Pan 19h-23h

1. Verdelago Beach Club, Altura

Ambiente descontraído e vista para o mar. Eis o que promete o clube de praia do Verdelago Resort, com acesso direto à praia Verde através de passadiços de madeira. Na carta, aposta-se nos sabores locais para petiscar: ostras, ceviche de peixe do mercado, salada de muxama do Algarve, lingueirão da Ria Formosa, amêijoa boa à Bulhão Pato e um hot dog de lavagante. À zona de refeições, com 54 lugares, soma-se um lounge no terraço, com 32 lugares e uma seleção de cocktails de autor, champanhes e espumantes. Verdelago Resort, Praia Verde, Altura > seg-dom 10h ao pôr do sol, restaurante seg-dom 12h-16h

2. Marina com Noélia, Olhão

Descansem os frequentadores do restaurante de Noélia Jerónimo em Cabanas de Tavira que é por lá que a chefe algarvia se mantém, embora vá até Olhão para assegurar que tudo corre bem neste novo restaurante. Trabalhar com aquilo que o mar e a terra dá em cada época também é regra no Marina com Noélia, situado no Real Marina Hotel & Spa e em frente à Ria Formosa que tanto inspira a chefe de cozinha. Aqui, é possível pedir, por exemplo, um crudo de robalo (€20), um arroz de lingueirão (€26), um arroz de tamboril e tosta de fígados (€58), uma raia alhada (€23) ou um bacalhau à Brás (€29). Para as sobremesas, Noélia escolheu pudim abade de priscos e citrinos (€8), quindim de amêndoas e cerejas ao Marrasquino (€7) e mousse de chocolate com caramelo de azeite (€8). Real Marina Hotel & Spa, Av. 5 de Outubro, Olhão > T. 91 330 8129 > seg-dom 12h-15h, 19h-23h

3. Armação Beach Club, Armação de Pera

Na praia de Armação de Pera, este clube que reúne os restaurantes de praia do Vila Vita Parc tem novas propostas para aproveitar o verão. Todas as sextas-feiras e sábados, até 14 de setembro, o Sunset Beach Lounge encerra o dia e inaugura a pista do lounge do restaurante Praia Dourada. Com entrada gratuita e música garantida por DJ convidados, a festa começa às 19h e convida a um pézinho de dança. Também no Praia Dourada, ao domingo das 13h às 16h, é dia de Chiringuito Chic. A música ao vivo, a ementa com ingredientes frescos e locais e o ambiente descontraído convidam a um almoço demorado. A entrada tem o valor de €46 e inclui entradas (presunto ibérico, queijo manchego, boquerones, croquetas de bacalhau, entre outros…), paella e sobremesa. Aconselha-se reserva prévia. À quinta-feira, na esplanada do NANA on the Beach, o restaurante que aposta nos sabores mediterrânicos, há Kalamata Vibes, um convite para terminar o dia a beber um cocktail enquanto o sol se põe. R. da Praia, Praia de Armação de Pera > T. 282 310 230

4. Playa, Olhão

Jantar, beber e dançar conjugam-se no Playa, um restaurante que também é bar, situado em Olhão, em frente à Ria Formosa. Na ementa constam pratos de inspiração latina para partilhar: quesadillas (a partir de €7), tacos (a partir de €8), burritos (a partir de €12), ceviches (a partir de €12) e tábuas de carnes provenientes do Brasil e da Argentina (a partir de €49). Cocktails, margaritas e sangrias, feitos com fruta fresca, são os acompanhamentos ideais para assistir ao pôr do sol ou dançar ao som de um DJ set a partir das 22h30. Os candeeiros de palma de São Brás de Alportel e as fotografias das ruas de Olhão, com a sua arquitetura cubista, criam o ambiente. Marina Ria Center, Av. 5 de Outubro, Lojas 9 e 10, Olhão > seg-dom 17h-22h30, bar e esplanada até às 2h

5. Maré e Mirador, Albufeira

Maré do Pine Cliffs. Foto: DR

O sítio não é novo, a vista sobre a praia da Falésia é a mesma. Ainda assim valerá a pena assinalar que é com novos pratos, novos cocktails e nova decoração que o Pine Cliffs Resort celebra este verão. No areal, o Maré apresenta na carta peixe e marisco do dia e uma seleção de saladas e hambúrgueres, acrescentando-lhe as batatas bravas (€14), o guacamole & chips (€15), ceviches (€25), salada de quinoa e tofu (€19), espetada de frango tandori (€31) e costelinha de porco BBQ (€32), entre outras opções. Também o Mirador Champagne Bar, poiso perfeito para assistir ao pôr do sol, foi renovado e conta agora com maior capacidade e um ambiente mais acolhedor. Localizado no topo da falésia, tem uma seleção de bebidas na qual se destacam champanhes, cocktails e digestivos. Pine Cliffs Resort, Praia da Falésia, Albufeira > T. 289 500 100 > Maré: seg-dom 11h-18h, qui-sáb 18h30-23h > Mirador Champanhe Bar: seg-dom 16h-24h

6. ÀCosta by Olivier Algarve, Albufeira

Foto: Hayley Kelsing

Inspirado no oceano, aposta no peixe e marisco, combinados com receitas tradicionais servidas no areal da praia da Falésia. Aberto em julho, um mês depois do restaurante lisboeta com o mesmo nome, o ÀCosta by Olivier Algarve está integrado no resort Domes Lake Algarve, em Vilamoura, e conta com 78 lugares, espalhados pela sala e pelo terraço. Nas entradas, apresenta ostras ao natural com molho mignotte e limão (€13, 3 ostras), carpaccio de beterrabas (€15), carpaccio de peixe do dia (€19), amêijoas à Bulhão Pato (€26), lingueirão grelhado com manteiga de alho e ervas (€26), Ovo ÀCosta (€27), composto por maionese, tártaro de camarão e caviar, e as Lulas ÀCosta (preço sob consulta) servidas com molho de manteiga, limão, alho e alcaparras. As especialidades, todas para duas pessoas, começam na feijoada de choco (€55), passam pelo arroz de lavagante (€59), pelo Gamberini (€60) e terminam no Arroz ÀCosta (€71), feito com arroz nero, lula, camarão, tamboril, pimentos, bacon e limão. O peixe do dia, bem como o marisco, é apresentado na vitrina à entrada do restaurante. Domes Lake Algarve, Praia da Rocha Baixinha Nascente, Albufeira > T. 92 446 2154 > seg-dom 12h-23h

7. Vila Joya Sea, Albufeira

Foto: DR

Na praia do Xiringuito, o Vila Joya Sea renova-se todos os verões com uma nova ementa e, também, com uma nova decoração. Este ano, há dois menus, um da América Latina e outro japonês, para saborear com vista para o mar. Com o chefe Hiram González viaja-se até ao México, ao sabor de um ceviche vuelve a la vida (€22) com camarão, polvo e jus de carabineiro, uma tostada de milho frito, atum, abacate e maionese de chipotle (€17), Anticucho (€23), nome para o polvo grelhado com batata e molho rocoto. Já o chefe brasileiro Rafael inspira-se no Japão, país dos seus avós, e apresenta usuzukuri (€22) de peixe do dia e ponzu, aburi hotate (€30) de vieiras e caviar Oscietra, sashimi (€49) de carabineiro com caviar Oscietra e o Sashimi Mix (€30) com 12 peças à escolha do chefe. Vila Joya, Estrada da Galé, Albufeira > T. 289 591 795 > seg-dom 13h-15h, 18h-20h

Há pouco mais de meio ano, escrevi uma carta aberta ao então Ministro da Saúde, Dr. Manuel Pizarro, sobre os graves problemas que afectavam o sistema de saúde em Portugal, com destaque para a crise nas urgências e a falta de recursos nos hospitais. Infelizmente, apesar das promessas eleitorais e da recente mudança no governo, a situação continua alarmante e com pouco ou nenhum progresso visível. A chegada de Ana Paula Martins ao Ministério da Saúde trouxe a esperança de uma nova abordagem, mas a realidade parece resistir a qualquer tentativa de mudança.

Quando o governo atual assumiu funções, a promessa de uma reforma significativa no Serviço Nacional de Saúde (SNS) foi central na campanha. Ana Paula Martins, conhecida pela sua competência técnica, foi vista como a pessoa certa para implementar essas reformas. No entanto, os primeiros meses do seu mandato mostram que, apesar das boas intenções, o sistema permanece inflexível. As dificuldades em fazer diferente, mesmo com uma liderança experiente, revelam que o problema não está apenas nas pessoas, mas num sistema que parece não permitir mudanças eficazes.

O cenário nas urgências hospitalares, um dos principais focos da carta aberta enviada, permanece crítico. O setor da saúde continua a receber um número crescente de reclamações dos utentes, com mais de 2.500 queixas registadas, só este ano. Entre as especialidades mais afetadas, a obstetrícia é líder, o que sublinha a gravidade da situação nos cuidados às grávidas e recém-nascidos. Relatos como o de Sara Martins, no Portal da Queixa, que foi recusada numa urgência em Leiria, são exemplos concretos de como a crise se perpetua.

As razões para as queixas mantêm-se inalteradas: demoras inaceitáveis no atendimento, que frequentemente ultrapassam as 12 horas; mau atendimento por parte dos profissionais de saúde; e uma falta crónica de informação clara e precisa para os utentes. Esses problemas, já destacados anteriormente, continuam a gerar frustração e sofrimento, sem que as soluções prometidas pareçam estar a caminho.

Por sua vez,Ana Paula Martins, que apesar de toda a sua experiência e conhecimento, enfrenta a dura realidade de um sistema de saúde onde as mudanças prometidas esbarram numa estrutura inflexível e num SNS que resiste à modernização. As expectativas eram elevadas, mas a incapacidade de implementar reformas rápidas e eficazes coloca em risco a confiança que a nova ministra poderia ter conquistado.

Conclui-se, portanto que Portugal continua a gritar por socorro na área da saúde. A promessa de mudança que acompanhou a chegada da nova liderança parece estar a dissipar-se, confrontada com a realidade de um sistema que não se permite mudar. Enquanto o governo não consegue encontrar uma forma de superar estas barreiras, o futuro da saúde em Portugal permanece sombrio, com os cidadãos a pagar o preço pela sua inércia.

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Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.

Palavras-chave:

O PM teve um discurso conseguido na tradicional festa de Verão do Pontal. Deu novidades, assumiu as dificuldades, em particular no SNS, que levarão tempo a resolver, e mostrou-se empenhado num ritmo de governação acelerado e eficaz. Luís Montenegro tem uma característica política importante: não gosta de perder tempo.

Quer governar, deseja dialogar, mas está indisponível para vergar, e esse teste de resistência chegará muito brevemente com o Orçamento de Estado para 2025. Sabe como vai ser o seu, mas não antecipa crises cenarizadas. O que vier vem.

No Pontal, a única nota fora da pauta foi o sucessivo desconforto verbalizado contra os comentadores, quase comentadores, e futuros comentadores. Isso não deveria ser assunto para um PM. Ou para este PM. Genericamente são os mesmos que sempre disseram que não iria ganhar, formar Governo, e governar. Cada um no seu papel, e todos fazem falta. Aqui e em todas as democracias.

Finalmente, a nota alta do discurso: o Governo vai abrir mais vagas em Medicina. Até que enfim que alguém percebeu! Levará mais de uma década a produzir efeito, mas para se terem mais graduados que formem os futuros especialistas é necessário começar pela base da pirâmide. E autorizar rapidamente mais Faculdades de Medicina privadas, mas não ridiculamente inacessíveis, como o caso de uma que está a formar médicos em inglês, certamente para preencherem as vagas na Europa ou Estados Unidos. Que ideia mais do que generosa: nós formamos aqui, e os outros contratam lá para fora.

No início dos anos 80, quando os corredores portugueses davam cartas nas competições de meio-fundo e fundo, existia apenas, e há pouco tempo, uma pista de tartan em Portugal. Nessa época, todos os que quisessem seguir os passos de Carlos Lopes, Fernando Mamede e outras estrelas do atletismo não tinham instalações convenientes para o fazer fora de Lisboa. Indignada, Rosa Mota chegou a liderar uma forte campanha para obrigar o governo a construir uma pista de tartan no Porto, única forma de satisfazer a procura de todos os que sonhavam vir a ser atletas. Algumas décadas depois, em 2008, a motivação dos dirigentes do ciclismo e da Câmara Municipal de Anadia foi de sentido inverso, mas com os resultados que se conhecem: apesar de não terem ciclistas de pista, decidiram elevar a aposta e construir um velódromo, em Sangalhos. E em grande: um edifício em forma de elipse, quase todo de madeira, com uma pista inspirada no de Bordéus, França, considerado, então, o mais emblemático do mundo velocipédico.

Quando, a 11 de setembro de 2009, o edifício cuja construção teve um custo superior a 12 milhões de euros, desenhado pelo arquiteto Rui Rosmaninho, foi inaugurado com uma volta simbólica à pista pelo histórico Alves Barbosa, o primeiro português a participar no Tour de France, também ainda não existiam ciclistas em Portugal especializados em provas de velocidade em circuitos fechados. Sobrava, no entanto, por parte dos responsáveis pelo projeto, a vontade de desenvolver uma das modalidades mais populares, em todas as suas vertentes.

Histórico Iúri Leitão e Rui Oliveira conquistaram o ouro, logo na estreia do ciclismo de pista masculino português em Jogos Olímpicos Foto: COP/ Francisco Paraíso

“Ainda bem que houve um maluco que aqui há uns anos pensou em arranjar uma pista, custasse o que custasse”, exultou, por isso, Artur Lopes, pouco depois de Iúri Leitão ter ganhado a medalha olímpica de prata em omnium, na quinta-feira, 8, no Velódromo de Saint-Quentin-en-Yvelines. Para o vice-presidente do Comité Olímpico de Portugal, esse foi o primeiro grande momento de concretização do sonho que ele teve e pelo qual lutou, há década e meia, quando era presidente da Federação Portuguesa de Ciclismo.

O Velódromo de Sangalhos, que alguns temeram poder ser um “elefante branco” semelhante a outras infraestruturas desportivas construídas nesses anos, por causa do Euro 2004, acabou por se tornar, afinal, uma espécie de ponto de inflexão para o desenvolvimento do ciclismo. A pista coberta de 250 metros, que continua a ser a única em Portugal e que permite que os ciclistas treinem e compitam nas mesmas condições que encontraram agora nos Jogos Olímpicos, é um dos pilares do Centro de Alto Rendimento do Ciclismo que, entretanto, ganhou também a companhia da pista olímpica de BMX e, ali bem perto, da pista permanente de BTT (XCO), na Curia. Essas infraestruturas permitiram desenvolver uma equipa de ciclismo de pista, então inexistente em Portugal, e, mais importante ainda, criar na Anadia um polo dinamizador daquele desporto em todas as suas vertentes, estabilizando um trabalho com técnicos de grande qualidade, num ambiente propício à progressão dos atletas, semelhante ao que se encontra nos países em que o alto rendimento é encarado com responsabilidade e como uma prioridade.

Começar do zero

Quando no sábado, 10, a dupla Iúri Leitão e Rui Oliveira se sagrou campeã olímpica, após 100 voltas emocionantes à pista, ficou comprovado que, há década e meia, valeu a pena pensar em grande e acreditar que era possível vir a ter bons resultados numa modalidade em que foi preciso, literalmente, começar do zero. Em 2009, já havia velódromo, mas quase não existiam ciclistas. Nem sequer um treinador a quem se pudesse confiar o projeto.

Uma das formas de resolver essa lacuna foi, porventura, a menos óbvia, mas que acabou por se revelar completamente acertada: a Federação de Ciclismo abriu um concurso para o preenchimento de uma vaga de treinador, que teria como função o desenvolvimento do ciclismo de pista.

Mais do que ouro

Os campeões olímpicos portugueses que ganharam mais de uma medalha

Carlos Lopes
Medalha de prata nos 10 000 metros,em Montreal 1976, e medalha de ouro na maratona,em Los Angeles 1984

Rosa Mota
Medalha de bronze em Los Angeles 1984 e medalha de ouro em Seul 1988, ambas na maratona

Fernanda Ribeiro
Medalha de ouro em Atlanta 1996 e medalha de bronze em Sydney 2000, ambas nos 10 000 metros

Pedro Pichardo
Medalha de ouro em Tóquio 2020 e medalha de prata em Paris 2024, sempre no triplo salto, atletismo

Iúri Leitão
Medalha de ouro em madison e de prata em omnium, no ciclismo de pista, em Paris 2024

Foi dessa forma que, em 2010, o atual selecionador nacional Gabriel Mendes entrou pela primeira vez no Velódromo de Sangalhos, depois de ter sido o escolhido. Na bagagem trazia uma licenciatura em Ciências do Desporto, na Universidade da Beira Interior, um mestrado em Biomecânica e Fisiologia, na Universidade de Coimbra, e já anos de trabalho técnico-científico no estudo do ciclismo, de que chegou a ser praticante federado, embora sem resultados dignos de nota. Após mais umas especializações no estrangeiro, passou a ser o treinador da equipa que, aos poucos, se foi formando e que hoje já conta com mais de 60 medalhas em importantes provas internacionais.

Todos os especialistas concordam que a melhor maneira de desenvolver o desporto de alto rendimento é através da criação de equipas fortes, em que os melhores podem treinar uns com os outros, no dia a dia. E a existência de um velódromo, com as valências e características dos melhores, ofereceu ainda outra vantagem: permitiu que grandes nomes do ciclismo internacional por ali passem, aproveitando as instalações até para realizarem estágios antes de grandes competições. Essa partilha de experiências é fundamental para aprofundar o conhecimento, testar novos métodos e procurar corrigir pequenos erros que outros, mais experientes, já ultrapassaram.

“A existência do Velódromo Nacional foi a oportunidade de o ciclismo português assumir uma verdadeira cultura global de alto rendimento, alinhada com as melhores práticas internacionais”, gosta de afirmar, publicamente, o presidente da Federação Portuguesa de Ciclismo, Delmino Pereira. E lembra que o benefício não se restringe à pista: “Esta infraestrutura veio permitir desenvolver também o trabalho de qualidade, científico, nas restantes vertentes do ciclismo, contribuindo para mostrar novos talentos nacionais ao mundo e para a conquista de resultados de relevo.”

No desporto, cada vez menos as coisas acontecem por acaso. Para se alcançar a glória olímpica, é preciso criar estruturas sólidas, que saibam integrar e desenvolver talentos, num ambiente atento a todos os pormenores. A seguir ao 25 de Abril de 1974, o prof. Mário Moniz Pereira foi, no atletismo, o primeiro a anunciar que era esse o caminho. Foi ele quem primeiro disse que se dessem condições de treino aos portugueses, eles também poderiam ser campeões, como outros, recusando qualquer sentimento de inferioridade.

Meio século depois, essas premissas são mais verdadeiras do que nunca. E, por isso mesmo, a medalha de ouro de Iúri Leitão e Rui Oliveira não foi fruto de um golpe de sorte ou de acaso, mas antes o corolário de uma estratégia de longo prazo, que soube, sem alardes, ir caminhando, passo a passo, até à glória olímpica final. E tudo começou, não nos esqueçamos, com a insistência na construção de um velódromo para o qual, na época, não existiam atletas. Mas eles apareceram. E vão continuar a aparecer.

Foto: Francisco Paraíso/LUSA

Iúri Leitão

Campeão olímpico de madison e primeiro português a ganhar duas medalhas (ouro e prata) numa única edição dos Jogos Olímpicos

Data de nascimento
3/7/1998 (26 anos)

Local de nascimento
Viana do Castelo

Altura
1,75 m

Peso
70 kg

Treinador
Gabriel Mendes

Clube
Caja Rural – Seguros RGA

Principais resultados em pista
2024 Medalha de ouro de madison e medalha de prata de omnium, em Paris 2024; Campeão europeu de scratch

2023 Campeão do mundo de omnium

2022 Campeão europeu de scratch

2020 Campeão europeu de scratch

2016 Campeão nacional de juniores

Resultados em estrada
2024 Duas etapas na Volta à Grécia, vencedor da classificação por pontos na Volta ao Alentejo

2023 Vencedor da Volta à Grécia

2022 Vencedor de etapa na Volta ao Alentejo

2021 Vencedor de duas etapas na Volta ao Algarve

2018 Vencedor de etapa na Volta a Portugal do Futuro

Rui Oliveira

Campeão olímpico de madison, na sua estreia em Jogos Olímpicos, e fiel escudeiro do campeoníssimo Tadej Pogacar, em grandes voltas

Data de nascimento
5/9/1996 (27 anos)

Local de nascimento
Vila Nova de Gaia

Altura
1,84 m

Peso:
70 kg

Treinador
Gabriel Mendes

Clube
UAE Team Emirates

Principais resultados em pista
2024 Medalha de ouro de madison, em Paris 2024

2023 Vice-campeão europeu de eliminação

2021 Campeão europeu de scratch

2020 Vice-campeão europeu de madison

2019 Vice-campeão europeu de eliminação

Resultados em estrada
Três vezes medalha de bronze nos nacionais de fundo (2021, 2023 e 2024)

Participou em duas edições da Volta a Itália (2024 e 2022)

Participou em três edições da Volta a Espanha (2023, 2021, 2020)

Campeão nacional de fundo sub-23, em 2018

Tudo começou em 1993 com um punhado de amigos e um sonho, o de criar um festival de rock independente na ruralidade intocada da praia do Taboão. Agora, Paredes de Coura ganha um registo eterno em Paraíso de Coura, um tributo fotográfico de Alfredo Cunha, fotorrepórter do “dia inicial inteiro e limpo” do 25 de Abril de 1974. Pontuado por textos de Valter Hugo Mãe, do jornalista Mário Lopes, da investigadora Sandra Maria Teixeira e do presidente da Câmara Municipal de Paredes de Coura, Vítor Paulo Pereira, este volume é uma poderosa peregrinação visual.

Aqui, contempla-se tanto a celebração orgiástica da multidão de braços no ar como o bulício vivido nas tendas, as tribos diferentes, as performances de bandas que fizeram a educação sentimental de várias gerações – vejam-se as fotografias dos festivaleiros veteranos e de gente com filhos pela mão também a celebrar o “Couraíso”. 

Foto: Alfredo Cunha

Mas há ainda retratos fortíssimos que denunciam o olhar atento, herdeiro da tradição documental humanista, de Alfredo Cunha: o “cromo” de garrafa nos lábios, o agricultor de picareta ao ombro que passa incólume entre festivaleiros, a geometria dos corpos no esplendor na relva, as muitas raparigas captadas em júbilo igualitário, os momentos irrepetíveis – como o da gargalhada da rapariga loura, anjo ancorado numa rocha-asa à beira da água, capa de Paraíso de Coura. “Monumento fotográfico”, capaz de “transformar uma multidão numa nação”, chama-lhes Valter Hugo Mãe. O escritor que escreveu já que Coura devia ser prescrito pelos médicos e descontado no IRS “porque tudo no Festival nos cura”, declara: “O Festival de Coura é o Entroncamento das Sortes, o lugar onde dá certo qualquer estranho e o esplendor humano se nota em qualquer nico de gesto. Já fui mais feliz em Coura do que em dez Venezas ou Novas Iorques.” A felicidade festivaleira continua até 17 de agosto. 

Álbum de glórias  

Paraíso de Coura regista igualmente muitos dos momentos em palco, que construíram a história e a magia dos 31 anos de edições de Paredes de Coura, com Alfredo Cunha a captar retratos de proximidade dos grandes protagonistas. Vejam-se as imagens poderosas de Patti Smith, de braços abertos em comunhão com o público, ou dos Franz Ferdinand, de guitarra a tiracolo, a eletrizar uma multidão, vistos da primeira linha do público, ou ainda da silhueta familiar de Manuel Cruz, vocalista da banda nacional Ornatos Violeta, de microfone na mão e sob os holofotes.

O festival foi palco das primeiras atuações em Portugal de “nomes orelhudos que, com o tempo, se agigantaram”, nas palavras da investigadora Sandra Maria Teixeira. Dessa listagem extensa, constam bandas como Arcade Fire, The National, Coldplay, LCD Soundsystem, Queens of The Stone Age, Sex Pistols, Flaming Lips, Korn, Tame Impala, Yeah Yeah Yeahs, Caribou e The War on Drugs, entre outros.  

Sonho de Verão

Se a história do festival inclui interrupções e sobressaltos, por exemplo, causados por dificuldades económicas, mudanças de estrutura ou ainda os constrangimentos resultantes da pandemia Covid-19, o certo é que Paredes de Coura sobreviveu e se afirmou como um dos incontornáveis acontecimentos estivais.  

“Um sonho de uma noite de verão”, uma experiência com algo de “místico”, resultado de “um desejo inquieto” “de nos sentirmos perdidos entre dois infinitos, entre aquilo que somos e aquilo que queremos ser”, descreve Vítor Paulo Pereira, um dos fundadores do festival, hoje Presidente da Câmara Municipal de Paredes de Coura.

Outra descrição cabe assim no texto de Valter Hugo Mãe, em Paraíso de Coura: “Ano após ano, na religião livre e sã do rock, rumamos à santa terra de Coura para o templo natural do Taboão, e somos abençoados pela falta de peneiras e pela disponibilidade para sermos iguais. É o que mais se aprende em Coura, que isto não é para cagões a mostrar vaidades. Isto é para o amor.” 

Paraíso de Coura (Tinta-da-China, 216 págs., €27,90) estará disponível nas livrarias a partir de 22 de agosto. O livro tem um formato intimista e um design sóbrio, o que deixa brilhar as cerca de 180 fotografias captadas num preto-e-branco irrepreensível por Alfredo Cunha