O que é que leva um político no auge da sua maturidade – 53 anos – e no pleno das suas capacidades a declarar que deve dar o lugar aos mais novos? Paulo Portas está tudo menos cansado. Não é homem para se cansar poreque – tem isso em comum com Mário Soares – respira política por todos os poros. Desde os 14 anos que não pensa noutra coisa. Jamais pensará noutra coisa.
Não obstante, tem outros interesses, hóbis, evasões… A escrita, o cinema… A sua retirada é mais uma pausa. A sua extraordinária intuição diz-lhe que se está a desgastar e tem de desaparecer por uns tempos. E essa intuição acrescenta, antes que os outros o saibam, algo de inquietante: ao contrário do previsto, esta precária maioria de esquerda, que parecia estar a recibos verdes, pode aguentar-se mais tempo do que ele gostaria. De Belém, não virá nada de bom: mesmo que o candidato da direita seja eleito, não haverá eleições antecipadas. Marcelo Rebelo de Sousa já disse que não.
Porque, como muito bem intuiu Portas, Marcelo tudo fará para que Passos Coelho – e sobretudo Paulo Portas! – não voltem ao Poder. O professor não se esquece de que o líder do PSD lhe chamou catavento. E não olvida que a “recomendação” de PSD e CDS no voto nele não é um apoio. E também se lembra que foi por causa de Portas que nunca chegou a primeiro-ministro (ver o artigo “o best of de Paulo Portas”). Contas antigas…
Depois, Paulo Portas intuiu que Passos Coelho pode ter os dias contados. Nunca se viu isto: um líder que ganha eleições e que não arranja maneira de impôr um Governo! A política é cruel, as clientelas e os aparelhos não perdoam. A direita acorda do choque, desperta para a vida, parte para outra: next! – e Portas não se vê com o mesmo protagonismo numa coligação com Rui Rio, ou outro qualquer. Aliás, Portas não se revê numa renovação de uma PàF esgotada. Portas precisa de espaço! De apanhar ar!
Que alternativa lhe restava? A apagada e vil tristeza de uma tribuna parlamentar, para exercitar a retórica e ensaiar uns soundbites. Depois, cantar vitória quando o CDS ultrapassar 10% em eleições. Ser concorrente do Bloco de Esquerda. Ridículo! Para quem já foi vice-primeiro-ministro, sabe a pouco. É andar de cavalo para burro. Uma travessia de um deserto a que já não pertence. Não se sente com energia para começar tudo de novo.
O autor deste texto, que faz parte da geração de Portas, compreende-o bem: há uma idade na vida em que nos podemos começar a dar ao luxo de escolher o que queremos fazer. Antes que seja tarde. Em que não estamos para aturar uma certa malta. Em que escolhemos os confidentes – e esses já não são os colegas de carteira, que estavam mesmo ali à mão, quando éramos mais novos. Os colegas de carteira de Paulo Portas são quem? João Almeida? Assunção Cristas? Mota Soares? Nuno Magalhães? Ao pé deles, sente-se velho. Fazem-lhe dor de cabeça. Está farto. Telmo Correia? Já não tem nada para lhe dizer. É não sair da cepa torta.
Não, Paulo Portas já não se diverte em fazer oposição. Isso perdeu adrenalina. Pode escrever, ver cinema, ensinar, viajar… Não irá tirar um curso de Filosofia a Paris, como o outro, mas é provável que passe uma temporada nos Estados Unidos. E vai escrever um livro. Quem sabe?
Mas o que mais dói a Paulo Portas é que o seu projeto de liderar a Direita, em Portugal, parece cada vez mais distante. Ainda não terá desistido, mas, no obscuro lugar de deputado de um pequeno partido irrelevante no Parlamento é que não vai lá chegar. Daqui a dez anos terá 63. Uma excelente idade para ser Presidente da República, cumprindo, 40 anos depois, o sonho perdido de 1986, com Freitas do Amaral. Só tem que se manter à tona. Preparar, cuidadosamente, os episódicos regressos. Assumir – como já se percebeu na declaração de despedida – a pose do senador. Distanciar-se do jogo partidário. E andar por aí.