Esta semana, Luís Montenegro conseguiu marcar a agenda política, com uma entrevista à RTP e declarações relacionadas com o caso Tutti Frutti. “Foi algo que não aconteceu muitas vezes num ano de liderança, de difícil afirmação. Ao retirar a confiança política a um dos seus mais próximos, o deputado Pinto Moreira, que suspendeu o mandato, por ter sido constituído arguido no processo Vortex e agora quis voltar de surpresa à AR. Também ordenou uma sindicância à forma como foram escolhidos os candidatos autárquicos do PSD, em Lisboa, em 2017, na sequência do processo Tutti Frutti. Com isto, quis demarcar uma diferença face a António Costa, que defende que ‘à política o que é da política e à Justiça o que é da Justiça’. Ora, Montenegro explicou que há uma dimensão política em processos judiciais que envolvem políticos. Com isso, marcou alguns pontos”, diz Filipe Luís, editor-executivo da VISÃO.
Mafalda Anjos concorda, mas foca num ponto: saber por onde ir, e saber por onde não ir. “Eis uma característica importante quando se está na política. Esta semana, entre outras coisas, Luís Montenegro disse que não se ‘desviava um milímetro da estratégia política’ sobre o Chega. O problema é perceber exatamente em que centímetro está essa estratégia”, enquadra na abertura do programa Olho Vivo. “Luís Montenegro foge como o diabo da cruz de se demarcar pronunciando a palavra Chega. Isso tem, obviamente, um significado político. É porque não fecha essa porta”, diz a diretora da VISÃO.
Filipe Luís concorda: “Na entrevista à RTP, Montenegro mantém a ambiguidade. Nunca nomeia a Chega nem se demarca explicitamente do partido de André Ventura. E isso – além do resto e do plano dos princípios – prejudica-o eleitoralmente. Porque o PS não vai largar esse filão, que já rendeu nas últimas legislativas. E porque os eleitores de direita, se interiorizarem que PSD e Chega se entenderão, tanto podem votar num como no outro. E o PSD encolhe…”
Sobre as eleições europeias, o líder do PSD disse que “perder por dois ou três pontos não é um mau resultado”. Declarações que mostram pouca ambição ou realismo? “Luís Montenegro é um político com discurso agressivo, mas na entrevista à RTP pareceu um líder da oposição com medo”, conclui o jornalista Nuno Aguiar. “Com medo de ir já a eleições, com medo de perder as eleições europeias e, como consequência, com medo de perder o PSD. Com medo de dizer se faz ou não acordos com o Chega e também com receio do caso Tutti-Frutti, que envolve membros do seu partido. Sente-se um calculismo enorme em todas as suas intervenções.”
Mafalda Anjos sublinha que Luís Montenegro marcou agenda, mas que “a perceção, para as pessoas cansadas com as confusões do Governo e do PS é a de que não existe propriamente uma alternativa”. “No caso Tutti Frutti os indícios chamuscam sobretudo os dirigentes sociais-democratas, e sobre a privatização da TAP, em 2015, parece que também padecem de amnésia, não é só no ministério das Infraestruturas, já que Miguel Pinto Luz não se lembra de documentos que têm a sua assinatura, como a VISÃO mostrou. Ora esta ideia de que ‘afinal são todos iguais’ é terrível para a alternância democrática, e beneficia sobretudo as franjas radicais”, diz.
Outro tema em análise foi a nova coordenação do Bloco de Esquerda, eleita esta semana. Para Nuno Aguiar, “Mariana Mortágua era a escolha óbvia para suceder a Catarina Martins, talvez a única possível se o BE não quisesse fazer uma travessia do deserto”. Se é verdade que não se espera uma mudança programática, talvez fosse uma boa oportunidade para o partido se definir. “As grandes causas fraturantes que defendia foram sendo conquistadas e as que sobram não mobilizam, nalguns casos até dividem”, acrescenta. “O BE quer ser um partido de classe? Quer ser um partido com rua? Com implementação nacional?”
“As sondagens mostram que o BE está a recuperar, mas não tanto como se esperaria com um PS afundado. O Bloco terá de encontrar uma forma de capturar esse descontentamento que está a ir para o Chega”, refere Nuno Aguiar. “BE e PCP terão de pensar se o espaço à esquerda do PS não terá diminuído mesmo e, por mais difícil que seja, se não farão sentido algumas alianças”, destaca Filipe Luís.
Para Mafalda Anjos, “Mariana Mortágua tem a fama da competência, mas precisa de trabalhar a proximidade.” “A Mariana tem um registo visto como superioridade moral e intelectual que é prejudicial, afasta as pessoas. è um impecilho na hora de recuperar os votos perdidos de 2019 para 2022, em que passou de 19 para 5 deputados”, comenta.
Debaixo de olho estiveram ainda o rol de boas notícias económicas, o papel do SIS em 1994, durante o bloqueio da Ponte 25 de Abril, e o sucesso da série Rabo de Peixe, da Netflix, que já chegou ao top 10 em 35 países.
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