Os discursos, o magnetismo, já foram. Obama foi eleito presidente dos EUA e agora a história é outra. O seu discurso de vitória foi já um discurso sobre a realidade, sobre os tempos complicados que se avizinham. O tal discurso de Estado que, nestas alturas, se impõe às ilusões criadas.
Obama está agora no fio da navalha. As expectativas foram colocadas numa fasquia muito alta e qualquer sinal de lentidão ou retrocesso saberá sempre a desilusão. Talvez nem o próprio tenha noção do fardo que carrega. Ao fazer história, exigem-lhe que a construa, em permanência. “Quem sabe faz hora, não espera acontecer”, diz uma velha canção.
Obama não terá direito a meio-termo. No seu país, esperam que ele restaure, num curto espaço de tempo, a confiança e a integridade de uma nação actualmente descrente e, em parte, despojada da sua dignidade. O mundo espera dele uma atitude pacificadora, cooperante e tolerante, despida a farda de cowboy planetário. O cidadão comum europeu olha-o como a última esperança para resgatar velhos sonhos de igualdade, justiça e prosperidade, agora que o modelo capitalista mais selvagem definha. Mas quando se tem consciência do deserto em volta, qualquer miragem parece real. Cabe, pois, ao novo presidente norte-americano provar que é muito mais do que a imagem que fazemos dele.
Tendo em conta os tempos duros que se avizinham, ser eleito acabou por ser a mais fácil das batalhas de Obama. O significado histórico da eleição do primeiro afro-americano para a Casa Branca não pode ficar-se pela cor da pele nem pelas boas intenções. Obama tem uma responsabilidade perante os seus e o mundo: mostrar que os sonhos, as esperanças e os desejos de mudança são de carne e osso. Qualquer traição a este caminho arrastará, por muitos anos, os votos da decência para a lama.