As Jornadas Mundiais da Juventude têm sido o assunto dos últimos tempos. Para além da polémica orçamental da mesma, e da ausência do reconhecimento e apoio às mais de 4800 mil vítimas de abuso sexual pela instituição, temos vindo a assistir a episódios que nos mostram o caminho que a igreja católica ainda tem que percorrer no que toca à aceitação da população LGBTQI+.
A existência de vários casos provam como estas jornadas estão longe de reconhecer pessoas LGBTQI+, apesar das mensagens de apoio e empatia por parte do Papa ao dizer que “as pessoas trans também são filhas de Deus”. Contudo, não podemos ignorar o facto de quem o segue não partilhar do mesmo sentimento, perpetuando atos transfóbicos e homofóbicos.
Um destes episódios foi o caso da pessoa que levou a bandeira trans para um dos recintos onde decorriam momentos do evento, e em que existiam outras e diversas bandeiras, acabando por ser questionada e confrontada por peregrinos que se encontravam no local. Estes exigiam que a bandeira, erguida com orgulho, fosse retirada com o argumento de que esta não era “adequada”, e que representava uma ideologia que não pertencia ali. Também o Centro Arco-Íris viu uma iniciativa sua invadida por um grupo de católicos ortodoxos, quando numa igreja na Ameixoeira interromperam uma eucaristia de pessoas católicas LGBTQI+. Este grupo tinha como propósito “reparar” aquilo que consideram ser “os pecados mortais de uma ideologia LGBT que hoje existe no seio da igreja católica”.
O movimento LGBTQI+, aliado ao movimento feminista, têm dado respostas a nível internacional ao crescimento do conservadorismo, sendo que em Portugal são dos maiores motivos de mobilização à esquerda e, sobretudo, de gerações cada vez mais jovens. É então em momentos em que episódios como estes que nos chegam que importa reforçar que ser-se queer que não se trata de uma ideologia, mas sim da identidade das pessoas LGBTQI+ e o nosso direito a ser e a existir em todos os espaços em que os nossos corpos se movem.
Não podemos também esquecer que o Papa não é progressista. Este assume-se contra a eutanásia e o aborto, e que é uma figura vinculada a uma instituição hierárquica, que continua a perpetuar relações de poder ao longo da história, com controlo tanto social como cultural, o que acaba por interferir com a liberdade e autonomia de populações marginalizadas, como é o caso das pessoas queer. Não colocamos em causa o direito à liberdade religiosa, porém não se pode fazer uso da religião para espalhar o ódio contra minorias, assim como o estigma, a precariedade, a opressão, a violência e o abandono, tanto social como político. Podemos aqui questionar se estas narrativas homofóbicas e, sobretudo, transfóbicas que temos vindo a assistir serão cristianismo ou não e se até a figura do Papa defende a inclusão de “todos, todos, todos” então porque é que os seus fiéis têm mostrado o contrário? De que vale a palavra do Papa para quem o segue se o caminho que fazem é diferente?
Enquanto pessoas LGBTQI+, católicas ou não católicas, é importante estarmos juntas, solidárias umas com as outras, de forma a sermos e a nos celebrarmos, fazendo este debate do orgulho contra o conservadorismo em qualquer espaço em que estejamos presentes.
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