Duas guerras de grandes dimensões e repercussões, um continente fustigado por alterações climáticas, regimes autocráticos e conflitos regionais seriam o bastante para afirmarmos que este é um mundo perigoso.
Os ventos que nos chegam da América Latina aumentam ainda mais a preocupação sobre o futuro, com a recente eleição de Milei como presidente da Argentina.
Trata-se da chegada ao poder de mais um extremista, que, como todos, sejam eles de direita ou de esquerda (esquecemos muitas vezes estes últimos), utilizam como argumento as falhas das linhas democráticas que nem sempre estiveram à altura do seu papel.
O aumento destes movimentos deve merecer uma profunda e rápida reflexão sobre as ações e trajetórias dos partidos ditos moderados.
Não são os Milei, os Orban ou os Venturas que nos devem preocupar, mas sim os seus apoiantes, as razões que os levam a optar por políticas desumanas e, em muitos casos, absurdas, estapafúrdias, dementes.
Olhar para o despenteado e com ar demente do argentino munido de serra elétrica, ouvir o senhor Orban falar contra os homossexuais ou os imigrantes, assistir aos tristes espetáculos do Chega no plenário ou ainda verificar que partidos ditos jovens se alegram com a eleição dum boçal que se diz enviado de Deus faz-nos questionar se não teremos entrado numa qualquer twilight zone ou desenho animado do qual é urgente sair.
Esta loucura generalizada, fruto duma insatisfação ou desilusão do eleitorado, não pode ser combatida por populismos de outro sinal ou por discursos inflamados.
A cada dia que passa, todas estas tenções fazem aumentar o número de deslocados que a ONU estima em 114 milhões. Nenhum país será igual, pois não haverá barreiras que possam suster uma tal população em marcha, nem espaço que não seja envolvido neste êxodo
Todos nós temos a experiência de discussões travadas nas quais o vencedor não é o que contrapõe decibéis aos decibéis, mas sim o que mantem a calma e é capaz de argumentar serenamente de tal maneira que desarma a vozearia.
Serenidade, paz, estabilidade é o que, um pouco por todo o mundo, o comum dos cidadãos pretende. Um futuro pacífico, sem sons de armas ou de narrativas extremistas, algumas a tocar o advento do apocalipse.
É esta serenidade, esta paz e este futuro que são negados a milhares de homens, mulheres e crianças forçados a abandonar as suas vidas para tentar reconstrui-las em lugares distantes.
Infelizmente já não são apenas as guerras que criam refugiados na completa aceção da palavra.
À medida que estes extremismos aumentam, grassa também a intolerância em relação ao outro, empurrando para os limites sociais grandes franjas da população que a dada altura se vê obrigada a partir.
Em 2019 o Brasil viu-se a braços com uma enorme vaga de gente vinda da Venezuela, fugindo à miséria e ao caos político que ameaçava vir a tomar proporções graves.
Não obstante uma bem montada Operação Acolhida, a não existência duma “operação integração” em paralelo deu origem a violentos confrontos entre os residentes e a população em mobilidade.
O resultado dessa movimentação teve como consequência o aparecimento de máfias de exploração e tráfico, disseminadas por todo o território brasileiro.
As várias missões internacionais, entre elas a MIEUX + europeia, deram conta dessa realidade que veio aumentar ainda mais a grave situação dos deslocados no continente americano.
O êxodo venezuelano não teve grande repercussão na Europa, mas lançou milhares de migrantes/refugiados para uma marginalidade social, ainda hoje bastante problemática no Brasil, já de si a braços com uma população atirada para o extremo da pobreza e que viu, com esse êxodo, agravar-se a situação.
Não surpreenderia que o mesmo viesse a acontecer em relação à Argentina.
A cada dia que passa, todas estas tenções fazem aumentar o número de deslocados que a ONU estima em 114 milhões.
Nenhum país será igual, pois não haverá barreiras que possam suster uma tal população em marcha, nem espaço que não seja envolvido neste êxodo.
Resta saber se as respostas dadas serão de forma a integrar ou aumentar a fricção entre quem está e quem chega. E isso depende das políticas e dos políticos no poder. E isso depende de cada um de nós.
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.