Dia 105
Regras diferentes para diferentes zonas com níveis de contágio diferentes: é um País a três velocidades. Ao fim de quase dois meses de período de desconfinamento, é esta a nova realidade a partir de 1 de julho na luta contra a Covid-19, que faz sentido tendo em conta situações epidemiológicas distintas em várias regiões nacionais.
O estado de alerta é o nível mais baixo dos estados de excepção, e será esse que vigorará em todo o País já daqui a cinco dias. Na região de Lisboa descemos para o estado de contingência e 19 freguesias de Lisboa, onde há níveis de contágio elevado, ficam ainda em estado de calamidade com dever cívico de confinamento.
Este anúncio deixa uma sensação agridoce. Por um lado queremos desesperadamente boas novas, mas por outro a descida nos níveis de exceção chega no dia em que se soube que os índices de contágio aumentaram para níveis considerados preocupantes e que há epidemiologistas a colocar em cima da mesa hipótese de segunda vaga, ou segunda onda, como alguns preferem chamar, nalgumas regiões do País. Que só se confirmará definitivamente daqui a duas semanas. Certo é que a média de novos casos desde o início de junho anda acima dos 300…
António Costa tentou explicar o aumento dos novos casos com o número de testes, mas os especialistas contradizem esta tese. Fazemos muitos testes, é um facto – somos o sexto país da UE com mais testes por milhão de habitantes –, mas o número de casos positivos por teste é elevado. Não são os testes que criam casos – eles andam por aí, e com 15 a 20% de contágio na comunidade, algo que preocupa os especialistas.
Já sabíamos, também é certo, que a reabertura traria um aumento do risco de transmissão. Com efeito, o risco de se ser infetado com o novo coronavírus, medido pelo Rt, está hoje em 1,19, o valor mais alto entre 27 países europeus, segundo um estudo que foi apresentado na reunião que na quarta-feira, 24, juntou especialistas e políticos no Infarmed. Durante a fase de confinamento, desceu para os 0,86, e chegou a andar acima de 2,4 durante a fase de crescimento da pandemia em Portugal. E ninguém consegue explicar muito bem porque é que tudo isto está a acontecer em Lisboa.
Ainda assim… estado de alerta nacional será, com dois níveis distintos nalgumas regiões. O País precisa de abrir para não morrer da cura – tudo indica que é esta a lógica por trás desta medida. Parece-me um passo arriscado que pode passar mensagens contraditórias, mas não tenho dados nem conhecimentos técnicos de epidemiologia para dizer que é errado.
E assim, mais ou menos assustados, em breve teremos um alívio das medidas de exceção. Mas uma coisa é fundamental: temos de meter na cabeça que não podemos ter um alívio dos cuidados. Todos nós vamos ter de estar cada vez mais atentos e não descurar nos nossos hábitos do dia a dia. Manter distâncias, desinfetar as mãos, usar máscaras, evitar ajuntamentos ou sítios com muita gente e tentar sensibilizar e confinar os jovens (naturalmente menos cuidadosos) são práticas que temos de continuar a ter.
Para os portugueses, ainda tão tementes à autoridade, é mais fácil lidar com proibições do que com liberdades. Mas agora, mais do que nunca, é a altura de percebermos que com mais liberdade vem mais responsabilidade. É mesmo uma questão de vida ou morte.