A generalidade dos cidadãos assiste estupefacta aos vertiginosos acontecimentos políticos das últimas semanas. É incompreensível como os partidos políticos não foram capazes de interpretar o sentimento da população.
Ainda não completamente refeitos da última crise financeira do país e que culminou com a intervenção da troika, afetados pelo impacto da pandemia na economia, os portugueses ficaram finalmente a conhecer o “pântano”. Esse pântano corporiza-se na não aprovação do Orçamento do Estado para 2022, – que é o resultado do fim de uma relação poliamorosa entre PS, Bloco de Esquerda e PCP – e na realização de eleições legislativas antecipadas (por causa de um capricho de Marcelo Rebelo de Sousa, diga-se).
Vale a pena começar por analisar desapaixonadamente a legislatura entre 2015 e 2019. Os portugueses sentiram na pele e na carteira o fim do pesadelo que foi um governo da coligação de Pedro Passos Coelho e Paulo Portas.
A começar pelo desanuviar de um clima psicológico depressivo que foi propositadamente instalado pela referida coligação. Graças a essa estratégia meticulosamente implementada por PSD e CDS, as mais drásticas medidas – como poderemos algum dia esquecer a famosa expressão “ir para lá da troika?” – se tornavam aparentemente legítimas e justificáveis.
Passando pela efetiva reposição de rendimentos das família e do reforço dos apoios sociais. O primeiro governo de António Costa não defraudou, assumiu uma verdadeira matriz de esquerda e soube corresponder aos anseios que as pessoas sentiam nesse momento.
O que lá vai, lá vai. O contexto desta segunda legislatura do governo PS mudou, os anseios dos cidadãos são hoje outros e há que saber interpretá-los.
O problema é que aparentemente poucos souberam fazê-lo. E aqui estamos nós a assistir boquiabertos.
Assistimos à tentativa de um Bloco de Esquerda em retomar a sua matriz de protesto. É esse o seu ADN: governar exige responsabilidade e compromisso e essas duas palavras não constam do léxico desse partido.
Assistimos também a um asgar agónico do PCP, que a cada dia que passa percebe que a sua base populacional de apoio desaparece a olhos vistos. O que não consegue perceber é que esse definhamento não está relacionado com o apoio que vinha sendo dado ao PS, mas sim com a desintonização das verdadeiras prioridades dos eleitores e com um discurso desadequado aos tempos que vivemos.
Assistimos também ao triste espetáculo do CDS, o partido que já foi do táxi e que muito brevemente caberá numa trotinete. Mas o que poderíamos esperar de diferente de um partido que tem no ringue da luta pela liderança um trauliteiro encartado e um menino-bem arruaceiro?
Assistimos ainda a um PSD enebriado pelo cheiro a poder, cheiro esse que é mais ilusório que real. Rui Rio é vítima das suas incongruências quase diárias e Paulo Rangel já mostrou que não descolará nunca da sua estratégia política de casos, casinhos e insinuações incendiárias sobre todos os seus opositores internos e externos.
Pego agora no título escolhido para este artigo. Há adultos na sala?
Há, mas são poucos. Mas há.
Aparentemente o PS continua ainda a ser o único partido político que soube colocar as responsabilidades do momento à frente dos interesses circunstanciais da política partidária. Governar é um exercício em que é preciso encontrar um equilíbrio entre aquilo que os cidadãos ambicionam e aquilo que os recursos do país (Portugal é um país pobre, convém não esquecer) permitem efetivamente concretizar.
Esse é um exercício muito difícil. Exige um objetivo de longo-prazo para a nação, exige coerência nas políticas que se implementam e exige a capacidade de compreender o contexto que existe em cada momento.
O PS deu mostras de o conseguir em 2015 e 2019. O atual mandato ficou inevitavelmente marcado pela pandemia, mas o objetivo de longo-prazo e a coerência nas políticas continuaram presentes.
Em breve seremos chamados às urnas. Será então esse o momento de os cidadãos mostrarem que são verdadeiramente adultos e que compreendem (ao contrário da generalidade dos nossos responsáveis políticos) o contexto atual do nosso país.
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.