Tenho mais medo de envelhecer que de morrer. A morte lenta de uma avó, que primeiro foi perdendo o tino, e eu até lhe achava graça, mas depois definhou uns quantos anos no quarto ao lado do meu, foi o suficiente para desde muito cedo ter esta convicção. Hoje sei que é possível envelhecer de outra forma. Mesmo assim… continuo a temer mais a velhice do que de morrer.
“Já reparaste que só os velhos é que estão a morrer?”, comentava um amigo em abril do ano passado a propósito da pandemia. “Sim, e então?”, perguntei. “Pelo menos já viveram muito”, argumentou, deixando no ar que antes eles do que os mais novos.
O que responder a uma opinião que tem tanto de real, como de duramente cruel? É impossível negar que chegar a velho significa ter tido uma longa vida. Mas o que determina qual é a vida que tem mais valor? E se o novo for inútil e o velho tiver ainda muito para contribuir?
Aos 78 anos, Joe Biden é presidente dos Estados Unidos da América. A idade não foi impeditivo para que o seu partido o considerasse como o candidato com mais capacidade de fazer frente a Trump, embora tenha servido de arma de arremesso a este, que, numa estratégia vil e desrespeitosa de combate, o apelidou de “sleepy Joe”.
Para muitos de nós, deste lado do mundo, a idade de Joe Biden também não foi uma questão. Provavelmente nem pensamos que depois de já ter perdido dois filhos e uma mulher, estaria muito melhor em casa, com a sua família, a desfrutar da eventual pouca vida que lhe resta. Suspiramos, isso sim, de alívio e esperança.
Afinal, ser velho não retira valor. E a partir de que idade mesmo é que se é velho? Juntar-me-ia de bom grado a um pensador para debater qualquer uma destas questões. Mas não queria estar na pele de um médico que diariamente tem de decidir a quem destinar um ventilador, se ao mais novo, se ao mais velho.
A pirâmide populacional de Portugal, como de resto em todos os países do norte, tidos como mais desenvolvidos, está a envelhecer. Caminhamos todos para velhos. Chegaremos lá se tivermos sorte. E seremos muitos. Os desafios enquanto sociedade serão enormes.
As rugas já não me assustam, nem a perda da capacidade física ou até de raciocínio. Assusta-me, isso sim, ao chegar a velha, poder estar à mercê dos outros, não bastasse já poder estar perto do fim. Sobretudo, quando o outro pode ser da estirpe que nos considera uma peste social.
“E se fosse o teu pai ou a tua mãe?” foi o que respondi então ao meu amigo. Hoje ter-lhe-ia perguntado “e se fosses tu”?
Sim, e se fossemos nós?