A atual situação no Brasil é dramática, assustadora. Para não dizer aterradora. Vejamos alguns dos seus aspetos: 1) a terrível e generalizada corrupção, sobretudo na “classe política”, que vem muito de trás e nunca cessou de crescer, em particular, contra todas as expectativas, com os governos do PT; 2) a enorme miséria ou pobreza, só diminuída ou amenizada nas presidências de Lula, e as tremendas desigualdades sociais; 3) a extrema violência, com altíssimos índices de criminalidade, que não tem cessado de crescer; 4) um sistema político podre e inviável, em que só se pode “governar” com corrupção, negociatas, cedências e alianças espúrias (por isso na “base” de apoio dos governos de Lula e Dilma estiveram partidos dos mais à direita, corruptos e “fisiológicos”, estiveram Maluf, Collor de Mello, IURD, etc.).
Tudo isto está ligado e não é de todo novo. Novo é o grau a que tudo isto chegou. Novo é que, não obstante a difícil realidade, havia ou presumia-se na sociedade uma capacidade de resistência e regeneração, no povo uma natural convivialidade e uma sempre renovada esperança, que morreram. Novo é que num país em que mau grado tudo isto ainda havia espaço para a convivência, o diálogo, o debate com a liberdade garantida – hoje não há. Novo é um país dividido até ao osso, em que a racionalidade, a tolerância e o simples bom senso têm desaparecido, dando lugar à cizânia e ao ódio. Novo é que o país mesmo nos piores momentos visto como “do futuro”, que há uma dúzia de anos era já um celebrado “país do presente”, hoje pareça sem futuro e sem sequer, a curto prazo, com a democracia assegurada.
Vai para oito anos Lula saía da Presidência, admirado a nível internacional e com um índice de aprovação superior a 80% no Brasil; “oceanos” correram sob as pontes e agora, após condenado em duas instâncias, está na cadeia e foi impedido de se candidatar às presidenciais de domingo – eis, julgo, uma expressiva imagem do que mudou. E ser ou não, de forma radical, contra Lula e o “petismo” é a clivagem mais funda, marcante e geradora de ódios. Situação, no contexto que sugeri, com razões diversas e culpas repartidas, entre elas as de Lula e do “petismo”, que raros têm ao menos a lucidez e a humildade de admitir. Situação que conduziu àquilo a que chegámos – e faz dela, volto ao início, dramática, assustadora, para não dizer aterradora: o candidato talvez mais votado no domingo, e que irá à 2ª volta com efetivas possibilidades de ser eleito Presidente, Jair Bolsonaro, que não é “de direita”, mas sim, de facto, um verdadeiro fascista. Sem aspas, defensor da ditadura e até da tortura e dos torturadores!
E se em matéria de racismo, sexismo, homofobia, etc., por vezes há exageros em certas acusações, não os há em relação às feitas a Bolsonaro e até na Wikipédia se podem encontrar citações suas que as confirmam. Quanto ao seu vergonhoso fascismo, ele foi mesmo assumido em plena Câmara dos Deputados, aquando do impeachment de Dilma: ele acompanhou o seu voto com uma expressa homenagem ao torturador da então Presidente, durante a ditadura militar. Não pode acontecer uma coisa assim ao amado Brasil, “cais do lado de lá do nosso destino”, como escreveu Torga.
(Artigo publicado na VISÃO 1335, de 4 de outubro de 2018)