A escolha de Mário Centeno para presidente do Eurogrupo foi, fora das redes sociais, a vitória portuguesa menos celebrada de sempre.
O feito vem, afinal, forçar várias clarificações e, mesmo que delas todos tenham fugido a correr, desta vez não há como não reparar em, pelo menos, três coisas:
Trocado por miúdos, nada de essencial vai mudar na União Europeia, a maioria de esquerda não existe e a direita tem de mudar de vida.
Na Europa, o impulso juvenil do Presidente Macron, reclamando mais entrega de soberania em torno de mais partilha de risco, ficou sem resposta. Nada importante vai mudar nos problemas estruturais da União Económica e Monetária (UEM).
Se o PPE, leia-se Angela Merkel, permite a eleição de mais um ministro das Finanças socialista, agora do Sul, é porque até podemos avançar no Fundo Monetário Europeu (pouco acrescentando ao Mecanismo Europeu de Estabilidade que os alemães já aceitaram) mas nada de partilha de risco, mais transferências ou convergência real.
Dito de forma mais simples, isso significaria transferências de recursos que nenhum dos eleitorados do Norte da Europa aceita. É assim a vida: de uma lógica vestefaliana pouco contrariável, aliás.
Em breve se perceberá tudo isto ao mesmo tempo que, esgotadas as reversões e confrontado com as escolhas sérias, se revela com clareza o logro desta aparência de maioria.
O nosso ministro foi escolhido, afinal, por ter os resultados de consolidação que Bruxelas estima e que só não se chamam austeridade porque a onda de crescimento, na Europa, disfarça e o ministro cativa. Muito.
Tanto que o novo paradigma de maioria fica conhecido por originalidades nunca antes reclamadas de esquerda, como fazer desaparecer o investimento público e aumentar a receita fiscal por via dos impostos indiretos.
Não admira, mesmo nada, que a maioria não tenha festejado a escolha. Ela ilustra que não são a maioria que dizem ser.
Vale a pena aprofundar o pensamento dos parceiros da maioria parlamentar, sobre a União e o Euro, de que o Eurogrupo é só um acidente:
Escreve José Manuel Pureza, do BE: “O resgate da democracia passa hoje por uma rutura com a prisão em que a União Económica e Monetária se tornou. Sem essa rutura, a substituição da Troika pelas instituições europeias, sendo simbolicamente importante, é algo que conhecemos bem: alternância sem alternativa.”
Mais claro, João Ferreira, do PCP: “A adesão ao Euro foi um desastre e a permanência é um desastre. Recuperar a soberania monetária é recusar esta sentença… O abandono do Euro não será nenhuma varinha mágica, mas é necessário para recuperar do atraso, da estagnação e da dependência… O Euro e a União Económica e Monetária são um obstáculo ao desenvolvimento. Um obstáculo que tem de ser removido.”
Enquanto isso, o PM vai a Bruges abrir o ano letivo do Colégio da Europa, com um discurso oficial sobre a importância de concluir a UEM e oferece o empenho de Portugal para a coisa, repetindo tudo o que o PSD escreveu em 2015.
A maioria de esquerda é como a anedota do alentejano que se acha casado por amor já que não tem interesse nenhum na mulher. Se não estão de acordo sobre ficar ou não na União e no Euro, estarão de acordo sobre o quê, afinal?
Mas a direita tem pouco de que rir… Depois de dois anos em que não antecipou os efeitos do crescimento que lançou. Mais ou menos artimanha, a consolidação está aí. E precisa falar de outra coisa. Infelizmente não tem sido o caso.
(Artigo publicado na VISÃO 1293, de 14 de dezembro de 2017)