Foi aprovado o OE para 2018, ou seja, o terceiro OE deste Governo, com os votos do PS, do PCP, do PEV, do BE e do PAN. O tumulto anunciado (e desejado, ainda que com prejuízo do interesse nacional) não aconteceu. Ao contrário daquilo a que o Governo de Passos e Portas nos habituaram, não caiu qualquer chuva de orçamentos retificativos e acabou o ataque cerrado à Constituição. A paz social e institucional tem sido a regra de vida incutida pela esquerda e estamos a caminho do terceiro ano desta Legislatura.
A democracia saiu enriquecida com uma solução de Governo pluripartidária: ganhou a diversidade com voz parlamentar, felizmente diferente de unanimidade, os Partidos valem efetivamente todos o mesmo e as divergências à esquerda são verbalizadas. Não há, assim, uma governação opaca, como foi a do PSD/CDS, mergulhada em pactos de silêncio, geradora de guerras das quais tínhamos notícia dos resultados (como a demissão irrevogável de Portas seguida do seu resgate com o prémio de novo cargo) sem perceção das respetivas causas.
O diálogo à esquerda melhora a governação sem lhe retirar coerência. A coerência de quem acreditou que havia mesmo uma alternativa à austeridade como escolha ideológica e programática. Chamaram-nos de tudo: os epítetos foram de “irresponsáveis” a “despesistas”, mas a verdade é que a lógica sacrificial, culpabilizante das pessoas e desistente do Estado social foi substituída pela busca da esperança perdida. A esperança perdida de pessoas e famílias de carne e osso, a quem não quisemos dar nada, mas apenas respeitar. Nesse respeito está o ímpeto reformador do Governo. Para nós, reformar não é cortar – a única “reforma” PSD/CDS –, mas antes combater a desigualdade estrutural e chocante que se vive em Portugal.
A aposta nas contribuições sociais, na devolução de rendimentos que foram roubados a funcionários públicos, reformados e pensionistas, o aumento do salário mínimo, o apoio às empresas, a criação de condições para a criação de emprego e descida da taxa de desemprego ou a alteração dos escalões do IRS, são efetivamente reformas, no sentido em que jogam com a viragem de uma das sociedades mais desiguais da Europa para um caminho de igualdade.
A coerência responsável da governação socialista com o apoio parlamentar de toda a esquerda é a resposta à irritação de quem, agoniado, deu posse a este Governo (Cavaco Silva) e à retórica desesperada assente na alegada ilegitimidade da denominada “geringonça”.
Para bem do País e desespero da minoria parlamentar, os indicadores são o que são: há mais 227 mil empregos líquidos e menos 190 mil desempregados desde que o PS está no Governo; há menos 170 mil pessoas em risco de pobreza ou exclusão social em Portugal; o peso dos impostos diretos no rendimento das famílias atingiu o valor mais baixo dos últimos 19 anos. Em 2018, todas as famílias pagarão menos IRS, as despesas ligadas à educação dos seus filhos diminuirão, haverá mais cuidados de saúde à sua disposição, os mais idosos terão pensões aumentadas, o subsídio de desemprego será reforçado e prestações sociais, como o Rendimento Social de Inserção e o Complemento Solidário de Idosos (CSI), serão aumentados.
Está tudo feito? Longe disso, mas hoje as pessoas vivem melhor sem que com isso tenha havido descontrolo (antes pelo contrário) das contas públicas.
Perante isto, que oposição temos? Temos uma oposição que apresenta sem convicção propostas de alteração ao OE que implicariam uma despesa acrescida em mais de mil milhões de euros. A esta irresponsabilidade, a direita junta a exposição do seu apego à desigualdade, chumbando medidas como o alargamento do acesso ao CSI, o apoio extraordinário aos desempregados de longa duração, a gratuitidade dos manuais escolares no 2º ciclo do básico, a redução do número de alunos por turma nos anos de início de ciclo ou o congelamento das propinas.
Para gerir o seu dia a dia, a direita não apresenta alternativas políticas sérias, mas rende-se feliz ao populismo e à demagogia. Hoje, CDS e PSD são o eco de primeiras páginas de certos jornais, a sua política é uma política de casos, tantos deles posteriormente desmentidos. Por outro lado, basta estar atento ao debate parlamentar para perceber que PSD e CDS já começaram a recorrer ao ataque pessoal. Finalmente, apesar dos resultados da política de esquerda aqui evidenciados, a direita recorre à linguagem que pensa poder incutir medo nas pessoas. Os moderadíssimos CDS e PSD apelidam as esquerdas, respetivamente, de “esquerdas radicais” e de “forças radicais comunistas”. Espanta-me sempre esta crença esperançosa na estupidez alheia.
(Artigo publicado na VISÃO 1292, de 7 de dezembro de 2017)