Deixa ver se percebi bem: a Galp, que acha que não está a dever às Finanças 140 milhões de euros, ofereceu ao senhor do governo responsável pelas Finanças uma ida à final do Europeu, e o senhor do governo foi? Foi isto? E a maneira que o senhor António Costa arranjou para se livrar deste incómodo foi ‘está tudo bem, já devolvemos o dinheiro das viagens, assunto encerrado agora estou de férias”? Isto tem tanto de absurdo como de genial. Parece quase um sketch dos Monty Python! Ou quando o Will Ferrell foi ao talk show do Conan O’Brien com um papagaio vivo no ombro e, cada vez que o Conan lhe perguntava sobre o papagaio, ele só dizia com ar ofendido que não queria falar sobre o assunto. O que eu me ri! Ora bem, limpando as lágrimas dos olhos, eis a maneira como encaro isto, baseado em experiência própria: quando me deparei com esta coisa da fama, e atenção que no meu caso não é tanta assim, percebi não só que era mais fácil entrar em discotecas como também que havia uma tendência de nos oferecerem coisas. Desde roupa, a viagens, as marcas começam a interessar-se em ter a “pessoa famosa” a usufruir dos seus produtos porque “em troca” usam a exposição que essa pessoa poderá ter para chegar a determinado público. Quanto mais exposição, mais coisas oferecem. É normal, acontece por todo o mundo. Isto é uma coisa extremamente tentadora, mas pode também haver, principalmente nesta era dos hashtags, o perigo de cairmos no exagero e tornarmo-nos numa montra de marcas, deixando o conteúdo do nosso trabalho em segundo plano. Para isto não acontecer temos que aprender a dizer que ‘não’, gerindo assim a nossa imagem, não deixando que o fascínio tome conta das prioridades. Noutro dia ligaram-me de uma marca de malas de viagem para me oferecerem todo um conjunto novo.
Eu, que normalmente comprava malas naquela feira da Praça de Espanha, pensei: “Pois claro que quero malas!!”. No entanto, respirei fundo e respondi: “Teria todo o prazer em aceitar esta parceria, mas se olharem para as minhas redes sociais, veem que não faço publicidade, e quando o faço, é de maneira muito pontual, discreta, e por vezes humorística. Acredito que nestes moldes não lhes interesse levar avante a vossa proposta.” Dito isto, esperava que o assunto acabasse ali, mas a verdade foi que a marca quis ir para a frente, mesmo sem eu me comprometer a fazer post algum em redes sociais.
Combinámos um dia e fui buscar o magnífico conjunto de malas a uma loja onde foram tão simpáticos comigo que naturalmente senti que qualquer coisa deveria fazer para retribuir a confiança e simpatia.
No dia seguinte arranjei maneira de, por minha vontade, fazer um post com as malas, onde no fundo agradecia à marca, publicitando-a. Agora, imaginemos os senhores que acabaram de chegar ao governo, todos contentes, vendo-se a braços com a fama que o poder lhes traz. É uma fama diferente, em círculos mais fechados, mas uma fama bastante mais poderosa e, para os mais permeáveis, mais fascinante ainda. Ora vem o dia em que alguém lhes oferece uma viagem para ir ver o Europeu à borla e eles pensam: ‘Pois claro que sim! Vamos a isso!’ Agora imaginem-se nesta viagem com toda a emoção daquela noite em que fomos campeões e essa emoção partilhada entre os senhores do governo responsáveis das Finanças e os seus anfitriões, que não querem pagar às Finanças os 140 milhões que acham que não devem – “Viva Portugal! Somos campeões!! Eh pá isto é que foi um fim de semana, hem? Dá cá uma abraço! Temos que combinar mais coisas lá por Lisboa! Olha, vens lá jantar a casa! Não digas que não. Tenho que te agradecer de qualquer maneira não é? Qual ‘não é preciso’? Vens e acabou! Fica combinado.'” Depois voltam, esta amizade dá bronca. O Costa liga e diz: “Eh pá devolvam lá o dinheiro da viagem ao vosso amigo e não se falem mais que eu estou aqui na Praia da Falésia e não param de me fazer perguntas sobre este papagaio que vocês me puseram no ombro!”.