É provável que já tenha ouvido dizer que “o pássaro madrugador é quem apanha a minhoca” (“The early bird catches the worm”). Sim, os seres humanos são, de uma forma geral, uma espécie diurna. E, em condições normais, a estrutura circadiana (de ciclos regulares de 24 horas) está organizada de forma a sustentar uma rotina de atividades durante o período de luz natural do dia e de sono durante o período de escuridão da noite.
Existem, no entanto, diferenças individuais que levam a que as pessoas tenham preferências distintas por realizar atividades de manhã (os matutinos) ou mais tarde (os vespertinos). A tendência relativa ao horário preferido para dormir ou estar ativo denomina-se cronótipo. Este vai além de uma simples propensão ou preferência, tendo, também, uma base fisiológica. Indicadores como a temperatura corporal, tensão arterial e cortisol atingem o seu pico mais tarde no dia nos vespertinos comparativamente aos matutinos (Adan et al., 2012).
O foco no cronótipo tem evidenciado um efeito importante na análise da performance cognitiva. A hipótese associada a um “efeito de sincronia” (May & Hasher, 1998) é, de resto, intuitivamente clara: matutinos terão um melhor desempenho de manhã e vespertinos um melhor desempenho à tarde/noite (Nowack & Van Der Meer, 2018).
Sob uma perspetiva do desempenho das equipas, o efeito de sincronia será previsivelmente mais complexo na medida em que a diversidade de cronótipos dos seus diferentes membros entra em jogo
Apesar da sua aparente simplicidade, as implicações deste efeito são longe de triviais. Nas organizações, o alinhamento entre o cronótipo do colaborador e o horário de trabalho tem consequências importantes no desempenho–e tem sido alvo de atenção recente. Kühnel e colegas (2022) demonstraram em três estudos com 817 colaboradores que o cronótipo influencia a criatividade em momentos distintos do dia: vespertinos foram mais criativos durante a tarde e matutinos durante a manhã. Igualmente relevante foi o facto de o alinhamento entre o cronótipo e a altura do dia ter promovido estados de humor mais positivos e níveis superiores de sentimentos de autoeficácia. Sob uma perspetiva do desempenho das equipas, o efeito de sincronia será previsivelmente mais complexo na medida em que a diversidade de cronótipos dos seus diferentes membros entra em jogo. Neste sentido, abordagens recentes (Volk et al., 2017) sugeriram um modelo de assincronia energética de equipa que propõe que processos associados à coordenação, processamento de informação e apoio nas equipas, poderão beneficiar desta diversidade cronotípica, quando reconhecida pelos seus membros e quando timings e ritmos de trabalho são ajustados aos seus diferentes picos de energia.
A inquestionável relevância do cronótipo (também no ensino, desporto e avaliação em processos de recrutamento) associa-se à necessidade de identificar uma pessoa como matutina ou vespertina. Como fazê-lo?
No nosso laboratório (Loureiro & Garcia-Marques, 2015), percebemos que basta pedir às pessoas que se autoidentifiquem, perguntando “É comum ouvirmos falar de tipos de pessoas matutinas (matinais) e pessoas vespertinas (noturnas). Qual destes tipos se considera?”, dando como opções: 1) Definitivamente, uma pessoa “matinal”, 2) Mais uma pessoa “matinal” do que “noturna”, 3) Mais uma pessoa “noturna” do que “matinal” e 4) Definitivamente, uma pessoa “noturna”. Tal é tão eficaz quanto usar a escala mais aplicada para o medir (rMEQ; Adan & Almirall, 1991).
Entre corujas e madrugadores, a maioria de nós provavelmente já tem uma ideia clara sobre o seu cronótipo. O passo seguinte será o de aprender a trabalhar com ele para se sentir e funcionar no seu melhor.
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.