Quando se elabora uma Orçamento do Estado, ou quando se define o Orçamento de uma organização, os custos são sempre uma preocupação. Isto porque se sabe que os recursos são limitados, enquanto os desejos tendem a ser ilimitados (na fantasia de que se obtinha o que se queria sem custos nenhuns). Na prática, isto significa que se quer gastar o mínimo possível, mas quer-se usufruir no máximo. Para que tal seja possível, temos de fazer escolhas orçamentais: face às receitas de que dispomos, e o crédito a que temos acesso ou queremos suportar, o quanto, e em quê, gastar? Tudo isto, para se gerar um determinado resultado, seja um desígnio nacional ou organizacional. Numa organização, pode ser a maximização do lucro. Numa nação, a maximização da felicidade.
Numa visão muito conservadora de gestão orçamental, olha-se para este problema na óptica dos custos: temos de gastar o mínimo possível para não entrarmos em ruptura financeira e adaptar a satisfação das nossas necessidades a esses limites do que podemos pagar. Esta será a visão austera que, por exemplo, Salazar aplicou a Portugal durante muitos anos e que a Troika glosou aquando do resgate financeiro.
Uma visão alternativa olha para os custos também na sua ótica de investimento/geradores de receitas futuras, uma óptica expansionista, de índole keynesiana ao nível das nações, frequentemente utilizada no mundo empresarial pelas empresas que querem crescer muito e que se socorrem de injecções massivas de capital e dívida quando os negócios ainda dão milhões de prejuízo.
Este confronto estratégico ignora, porém, os casos em que determinados objectivos podem ser atingidos sem que se tenham de incorrer em novos custos. Se pensarmos na felicidade dos povos como o verdadeiro desígnio das nações e dos governos, há uma parte dessa felicidade que não custa mais dinheiro. Ou seja, há dimensões que podem ser melhoradas na vida das pessoas e que não pesam no Orçamento do Estado.
Os estudos científicos sobre os determinantes da felicidade são claros a apontar as dimensões imateriais que, a par das materiais, contribuem para o bem-estar. A qualidade e quantidade de relações interpessoais (para a qual pode contribuir uma diminuição das pressões competitivas na escola e no trabalho), a confiança nos outros e nas instituições (apostando na Qualidade e na Justiça), um bom equilíbrio entre a vida profissional e familiar (algo para o qual os projectos da semana de quatro dias de trabalho visam contribuir) ou uma melhor gestão do tempo (para a qual contribuem redes de mobilidade bem articuladas ou baixos níveis de burocracia) são instrumentos à nossa disposição que, ou não aumentam os custos, ou acarretam custos líquidos irrelevantes.
Sejamos claros, há dimensões da nossa felicidade que necessitam de incrementos de gastos para serem bem satisfeitas, e para as quais a visão expansionista orçamental é mais adequada. Mas, mesmo numa visão austera dos orçamentos, não há desculpa para não se investir nas dimensões imateriais do bem-estar que, não só não trazem custos acrescidos como até podem contribuir para um futuro aumento das recitas (por ganhos de produtividade) e diminuição dos custos (por exemplo, com melhorias na saúde por hábitos de vida mais saudáveis).
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