O Al Nassr, de Cristiano Ronaldo, fez estágio no Algarve, e o jogador anunciou que não voltará a jogar na Europa. Pudera, depois de levar 5-0 do Celta de Vigo, qualquer um desejaria ter distância de clubes europeus. Os sportinguistas que ainda acalentavam o sonho de ver CR7 de verde e branco deixaram de ter fé nesse regresso, mas o meu coração encheu-se de esperança: pareciam declarações racionais, de um atleta de 38 anos que sabe que já não teria pedalada para certos campeonatos. Afinal, não. O ponto final na carreira europeia vinha seguido de vírgula. “Acho que a Europa perdeu muita qualidade”, disse o capitão da Selecção portuguesa. Coincidência ou não, o decréscimo de qualidade deu-se aquando da partida de Cristiano. Anseio pela autobiografia de CR7… o primeiro parágrafo não deverá fugir muito disto: “Nasci no arquipélago da Madeira, que era, na altura, um verdadeiro paraíso. A partir de 97, começou a ficar mais feio e tem vindo a piorar desde então.” Ronaldo aproveitou a passagem pelo Algarve para sublinhar que continua a bater recordes, mas o lembrete era desnecessário. Todos sabemos que o homem está constantemente a superar-se: antes, eram os golos, os títulos, as internacionalizações; agora, são as declarações à Imprensa: desde a entrevista a Piers Morgan que tem vindo sempre a elevar a fasquia. Quando achamos que não é possível que diga nada mais absurdo, eis que surge CR7 e nos deixa de boca aberta novamente. Ainda há pouco tempo nos espantávamos com o poder de impulsão de Ronaldo; agora, espantamo-nos com a capacidade de se enterrar. O homem que derrubava muralhas defensivas, agora deita abaixo as ligas espanhola, alemã, italiana, portuguesa… Só a Premier League se safou da reprovação de Cristiano Ronaldo (provavelmente porque jogou lá recentemente, e os ingleses ainda colhem os frutos dessa passagem). É certo que Ronaldo tem muitas qualidades, e que a humildade nunca foi uma delas, mas quando andava a par de performances desportivas de outro mundo, a fanfarronice passava mais despercebida. Agora que saiu, a contragosto, de baixo do chapéu de “melhor do mundo”, descobrimos-lhe a careca (e nem as suas clínicas de implantes capilares lhe podem valer). O ponto fraco de Ronaldo é achar que não tem pontos fracos. Um dos pontos fortes é ser muito verdadeiro: tenho a certeza de que ele, neste momento, acredita piamente que a liga árabe é “muito melhor que a dos EUA” e que os jogadores de renome que aceitam ir para lá fazem-no para respirar o mesmo ar que CR7, e não porque recebem milhões. Pena Cristiano já ter dito “adeus” à Europa, senão podíamos fazer o teste: vinha jogar para o Belenenses, e víamos quantos craques estariam dispostos a largar tudo para jogar na segunda liga. “Para onde o Cristiano vai, gera um interesse maior”, disse o próprio Cristiano. E tem razão. Em dia de Al Nassr-Al Wehda, o mundo pára, para ver o grande embate entre os emblemas de Jeddah e de Riade. Durante anos, Cristiano foi uma dor de cabeça para os defesas adversários; agora, é uma dor de cabeça para quem o tenta defender.
MAIS ARTIGOS DESTE AUTOR
+ Ora truz, truz, truz, Alcatraz, traz, traz
+ Ministro em estado de crítico
+ Narcoxenofobia: a paciente zero
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.