As celebrações dos 50 anos do Partido Socialista foram interrompidas por três jovens a destapar o rabo. Nota-se que o PS já é cinquentão. Se fosse o décimo oitavo aniversário, três jovens seminus corresponderiam não a uma interrupção, mas ao ponto mais alto da festa. Apesar de já estarem na meia-idade (e também, de certa forma, em crise), os socialistas não ficaram muito chocados com aquela forma de protesto. Não é nada que não estejam habituados a ver na Praia da Rocha.
Esse é um dos problemas do recurso ao striptease: já não é especialmente impressionante. A não ser que a peça de roupa retirada seja o hijab, e o país em que é despida seja o Irão. Aí o caso muda de figura. De resto, mostrar o rabo é uma rebeldia anacrónica. Aqueles três estudantes do movimento “fim ao fóssil” mostraram-no no Largo do Rato, os seus colegas mostram-no no Instagram. Uns querem salvar o planeta, outros querem promover uma nova marca de fatos-de-banho. Nada contra, mas não é marcante. Se queriam mostrar alguma coisa chocante ao primeiro-ministro, levavam os recibos da renda da casa. A comunicação via nádegas sofre do mesmo problema que os telegramas cantados: parece uma ideia gira, mas depois a forma sobrepõe-se ao conteúdo. Todos nos lembramos dos estudantes que, nos anos 90, mostraram o traseiro ao ministro da Educação, mas já não sabemos ao certo o que lá estava escrito. Revendo as fotografias, constatamos que era “não pago”. Faria mais sentido o plural, mas para “não pagamos” eram precisos mais dois voluntários. É outro dos entraves das mensagens em glúteos: a limitação de caracteres. Desta feita podia ler-se “ocupa”. O que é que isto nos diz sobre as intenções dos manifestantes?
Nada. Percebo que o rabo seja um meio de comunicação apelativo, mas pouco prático, já que não é auto-explicativo. Quando nos mostram o rabo, não sabemos se querem reclamar por causa das globais ou do aquecimento global. Foi preciso ler o comunicado, onde os activistas escrevem que vão voltar a ocupar escolas e faculdades, para perceber o que era aquilo. Sonho com um mundo em que o pré-aviso de greve passa a ser assim. “Olha ali, o maquinista da CP com as calças em baixo. Deve haver greve para a semana.” No fundo, a exibição do befe é o equivalente ao título chamativo que damos aos emails, na esperança de que alguém os leia. É um clickbait humano. E comigo resultou. Fui ler o manifesto, e fiquei preocupada. Não tanto com o planeta, mas com estes jovens, que acham que “o PS não devia estar a celebrar, mas sim a fazer um plano compatível com os prazos ditados pela ciência climática para acabar com os combustíveis fósseis”. Esta geração está perdida (e, segundo eles, as outras todas também), então agora os miúdos é que exigem aos velhos que parem uma festa para irem fazer os deveres?! Quem é que é bota-de-elástico aqui, afinal? Os que não pensam na neutralidade carbónica ou os que não admitem diversão antes de fazer os TPC de Ciências?
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+ Boaventura Sousa Sacrossanto
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