Quando se soube que um iraquiano acusado de terrorismo tinha tirado uma fotografia com Marcelo Rebelo de Sousa quando o Presidente visitou o restaurante Mezze, em Arroios, onde o suspeito trabalhava, ficou muito clara a diferença entre a ficção americana e a realidade portuguesa. A realidade portuguesa é mais inverosímil. Nos filmes americanos – como, por exemplo, o Força Aérea Um –, o Presidente dos Estados Unidos enfrenta pessoalmente os terroristas, luta com eles corpo a corpo, mata-os com as suas próprias mãos. Em Portugal, o Presidente e o terrorista tiram um retrato juntos e depois cada um vai à sua vida. Harrison Ford, no papel de Presidente dos EUA, talvez seja durão no filme, mas não é suficientemente assustador para que os terroristas fictícios tenham medo de o enfrentar. Contra Marcelo, terroristas reais não têm coragem de levantar sequer um dedo.
Creio que a indústria cinematográfica portuguesa devia dedicar-se a produzir um filme baseado no encontro entre o Presidente da República e o suspeito de terrorismo. Um realizador competente pode transformar a história numa sucessão de incidentes interessantes e tensos. Por exemplo, Marcelo entra no restaurante e senta-se. Ao som de uma música sinistra, o terrorista aproxima-se do Presidente por trás e, com um gesto rápido, aponta um objecto ao Presidente! É a ementa. Marcelo escolhe os pratos que deseja mas, sem que nada o faça prever, temos um momento dramático: o Presidente quer moussaka para entrada, mas o terrorista diz-lhe que não há! “Esta semana não conseguimos boas beringelas”, lamenta. Ultrapassada essa contrariedade, Marcelo faz o seu pedido, mas logo depois há nova peripécia emocionante: o terrorista traz para a mesa um kebab, quando o Presidente tinha pedido baba ganoush! Houve uma troca na cozinha! O público agarra-se à cadeira, na expectativa de saber se ainda é possível desfazer o imbróglio. E é mesmo! O kebab acaba por vir para a mesa, para alívio de todos. Chega então o momento de tirar a selfie. Presidente e terrorista estão mais perto do que nunca. O terrorista aponta o telemóvel de modo a enquadrar-se a si mesmo e a Marcelo. Quase ouvimos o pulsar do coração do iraquiano. Alguma coisa não está bem. Penosos segundos passam. Excede-se em muito o tempo que uma selfie leva a ser captada. E é então que, com horror, descobrimos o que se passa: o telemóvel estava a filmar! Havia que colocá-lo em modo de fotografia e tentar outra vez. Fim.