Já ouviu falar de Mérida? Não essa Mérida da nossa vizinha Espanha, mas Mérida no México. Fica no estado de Iucatã e foi edificada sobre as ruínas da antiga cidade maia de T’Hó.
Quando se fala de corrupção, é impossível obnubilar a Convenção de Mérida, que foi assinada precisamente no dia 9 de novembro de 2003. Por isso, simbolicamente, no dia 9 de dezembro de cada ano civil, é assinalado o Dia Internacional contra a Corrupção, como forma de consciencializar a humanidade sobre a problemática.
Um dos temas principais é a prevenção, para que os Estados Partes implementem políticas e normas que promovam a participação da sociedade e reflitam os princípios do Estado de Direito tais como a integridade, a transparência e o muito em voga conceito anglo-saxónico “accountability”. Se querem um exemplo pela negativa do que não fazer, é recordar a instituição que coloca uma única pessoa a controlar dinheiros ou decisões discricionárias (ainda que possam existir várias pessoas) e simultaneamente a autofiscalizar-se – sem controle externo, isento e funcional, a probabilidade de existir corrupção é muito maior. Por isso se exige elevados padrões de auditoria e de contabilidade, regras éticas e legais para prevenir o conflito de interesses ou a proibição do famoso saco azul, prática ainda muito comum em muitas empresas em Portugal associada ao fenómeno irmão da fraude fiscal.
Outro dos temas da Convenção é a penalização. A solução fácil é legislar para distrair, nomeadamente aumentar o tempo de prisão, esquecendo que não é só pela pena que se resolvem os problemas. Na Idade Média, o melhor dia do negócio para o pequeno assaltante de carteiras era o dia que o colega de profissão era enforcado.
Sem dúvida que se exige reponderar em Portugal o mecanismo das denúncias de corrupção por parte dos “whistleblowers”, protegendo-os contra qualquer tipo de retaliação. Como bom exemplo, veja-se a Diretiva (EU) 2019/1937 do Parlamento Europeu e do Conselho de 23 de outubro, relativa à proteção das pessoas que denunciam violações do direito da União.
E dar efetivos meios de investigação a quem tem de investigar a corrupção. Sem deixar de sublinhar que a independência do Poder Judiciário e uma efetiva autonomia do Ministério Público, desde logo financeira, é fundamental para o combate à corrupção.
A temática da recuperação de ativos é igualmente tratada na Convenção. Regra geral, o enriquecimento patrimonial é uma forte motivação para o crime e haverá que assegurar que essas vantagens ilegítimas são devolvidas à comunidade, O crime não pode compensar e não podemos permitir que o produto da corrupção volta à economia lícita, distorcendo o mercado com efeitos no aumento dos preços por força das regras da oferta e procura.
Outra das temáticas da Convenção é a cooperação internacional. Porque num mundo em que o dinheiro e outros ativos viajam à velocidade de um click por este mundo fora cada vez mais dividido em blocos estanques, a humanidade tem de saber encontrar respostas para assistência legal mútua e processos de extradição bem como ações conjuntas de investigação ou congelamento de bens, apreensão e confisco de produtos da corrupção.
Em conclusão, na fenomenologia da corrupção “Não há almoços grátis!” . O seu custo é pago por todos nós!
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