Fui recentemente com um amigo visitar dois novos espaços da capital: os Terraços do Carmo e o Jardim da Cerca da Graça.
O primeiro, um miradouro construído em patamares num espaço devoluto, antes ocupado por barracões da GNR, dá-nos uma perspetiva única da Rua do Carmo. Para quem se encontra nesta artéria da cidade, fica imediatamente por cima da antiga loja de Ana Salazar. O acesso é através do Largo do Carmo, pela ruela que liga ao Elevador de Santa Justa, e do novo terraço da cidade tem-se uma perspetiva única do Rossio e dos telhados da Baixa. As amansardadas águas furtadas da Rua do Carmo é que perderam em privacidade – alguns dos seus ocupantes estão agora a poucos metros de distância, nos pináculos dos edificios pombalinos do outro lado da rua, pouco protegidos dos olhares de curiosos.
A inclinada encosta limitada pelo antigo convento da Graça, pelo Caracol da Graça e pela Calçada da Senhora do Monte também foi resgatada ao abandono. Tem 1,7 hectares, diz o DN, e é pontuado por um quiosque, uma alameda e vários patamares (um deles com um plantação de citrinos). A vista é de cortar a respiração e compreende o Martim Moniz, a colina da Pena e a do Carmo. É mais próxima da cidade do que a do miradouro da Graça, uns metros acima. À principal via que atravessa a Cerca de norte para sul ainda faltam as árvores frondosas que merece e o quiosque foi colocado numa extremidade do parque, numa superfície de piso artificial que reflete em demasia a luz inclemente de junho. As árvores crescerão. Os lisboetas e os muitos visitantes da capital habituar-se-ão a estes novos espaços, que passarão a fazer parte dos roteiros de Lisboa.
O vereador José Sá Fernandes é o principal responsável pela devolução destes espaços nobres e abandonados à cidade. Os locals primeiro e os turistas depois apropriar-se-ão deles. A revolução verde de Lisboa também tem sido essencial para a crescente atratividade da cidade junto dos visitantes. Hoje, Lisboa é uma cidade diferente por causa do turismo.
Não sou um aristocrata, quanto à cidade. É verdade que há zonas com excesso de visitantes e numa tarde de verão visitar o Chiado pode ser uma experiência “diferente”, atendendo à quantidade de turistas que demandam a praça e as ruas do Bairro Alto e da Bica. Eu, que vivi nessa zona da cidade há quase duas décadas, sei contudo como era: soturna, sem oferta comercial, animada mas apenas por adolescentes e jovens adultos bêbados. Hoje há famílias e velhotes do norte da Europa, além dos jovens trendy que clonam os que percorriam aquelas ruelas já nos anos 80. A oferta comercial e cultural pode ter alguns excessos mas é incomparavelmente melhor, mais qualificada e diversificada.
Lisboa internacionalizou-se da melhor maneira: através dos que a visitam para a usufruierem. É melhor do que ser um hub de negócios. Ainda está suja e gasta mas todos os dias fica em melhor forma. Os turistas gostam e nos estudos de opinião manifestam a vontade de repetir a experiência. A mestiçagem do centro da cidade não é só racial – essa começou nos anos 80 e 90 – mas também de classe. Hoje, desde um grupo de jovens dos subúrbios de Londres a um magnata muçulmano, todos usufruem do centro histórico e dos bairros chiques do Chiado. E ainda bem.