Gostaria de resumir as semanas que acabo de passar em Riga com uma metáfora. Putine está a jogar póquer e nós, no lado ocidental da Europa, achamos que se trata apenas de uma partida de bisca lambida. Neste jogo, cheio de incertezas, é preciso saber como lhe parar a mão. Foi essa a principal preocupação que encontrei nos países bálticos. Existe um novo receio em relação à Rússia, maior que no passado recente. A Estónia, a Letónia e a Lituânia sentem-se ameaçadas. Não apenas em virtude do que tem acontecido na Ucrânia. Os incidentes com a força aérea russa – as incursões no espaço báltico e os voos de caças com os sistemas de identificação desligados – têm sido frequentes, como se Moscovo estivesse a testar a capacidade de reação do adversário. Para mais, sabe-se que Putine ordenou que fossem levados a cabo uma série de exercícios militares e que multiplicou a capacidade combinada das suas forças, nas regiões de fronteira com aquela nossa parte da Europa.
Ninguém tem uma bola de cristal que permita prever o futuro. À partida, não se pode ser alarmista. Mas também não é bom andar a dormir na forma. Há que reconhecer que o paradigma das relações entre a UE e a Rússia precisa de ser revisto. A resposta à postura de Putine deve ser multidimensional. Tem que ser apropriada, clara e firme. Acima de tudo, prudente. ?A prudência passa por saber ver os riscos possíveis, preparar as medidas de contenção necessárias e não ter medo de agir.
Para começar, é importante recordar que a paz e a prosperidade de ambos os lados da Europa têm assentado e devem continuar alicerçadas no respeito pelas normas e os acordos internacionais e por relações económicas estáveis. A Rússia, que exporta anualmente mais de 100 mil milhões de euros de gás e petróleo para consumo na UE, está tão dependente de nós como nós estamos dela. Somos parceiros comerciais de monta. ?A interdependência económica deve ser acompanhada pela cooperação política. Há aqui um equilíbrio entre princípios e interesses que é mutuamente necessário e vantajoso.
Por outro lado, há que ter em conta que os bálticos são membros da OTAN. Serão os estados mais expostos, pela sua proximidade geográfica, mas a sua defesa é fundamental, não só para os seus povos, como também para a credibilidade da Aliança Atlântica. Putine poderá pensar, como alguns dos seus conselheiros imaginam, que em caso de intervenção russa numa área limitada dos bálticos, por um qualquer motivo, a OTAN ficaria paralisada por falta de consenso interno e acabaria por engolir uma situação do tipo da Crimeia. Poderia mesmo vir a desintegrar-se enquanto estrutura de defesa. Essa maneira de imaginar a resposta aliada parece-me irrealista. A recente visita de Obama a Talin serviu para mostrar que um passo agressivo, para além da linha de fronteira, provocaria, do lado da OTAN, uma resposta à medida.
Penso que ninguém de bom senso quer uma confrontação bélica no nordeste da Europa. Se tal viesse a acontecer, teria consequências imprevisíveis. Não há, nesta parte do mundo, possibilidade de circunscrever um conflito militar a uma pequena zona bem determinada. Qualquer choque armado levaria a uma catástrofe inimaginável.
Perante isto, o que se pede a todos os líderes, de Moscovo a Bruxelas, passando por Washington, é que tenham juízo e coragem. Há outros desafios comuns bem mais importantes.