A escassez de habitação que se tem verificado poderá agravar-se nas próximas décadas, face ao rápido crescimento da população e à falta de políticas adequadas do lado da oferta. Juntando fatores como a falta de mão-de-obra especializada e a reduzida produtividade no setor da construção, podem facilmente ocorrer problemas relacionados com custos de construção, que impactem negativamente nos preços das casas, assim como na rentabilidade do setor.
Neste contexto enquadra-se o conceito de industrialização da construção (IC), que, por meio da evolução tecnológica, procura aumentar a eficiência e produtividade do setor, contribuindo assim para o progresso da economia e da sociedade. A IC recorre a processos tecnológicos para ligar a conceção à produção (processos “design-to-make”), onde se incluem a robótica e automação, em particular a impressão 3D de componentes de edifícios (e.g. paredes, fachadas e outros elementos estruturais ou arquitetónicos).
A impressão 3D na construção consiste num processo automático de fabrico aditivo (do inglês, “additive manufacturing”) que cria elementos construtivos, dentro ou fora do local da obra, através de impressoras de grande dimensão (e.g. sistemas em pórtico ou braços robóticos) que depositam materiais, como betão ou argila, por camadas sucessivas, frequentemente com uma forma contínua e uma secção transversal específica (técnica denominada por “extrusão”).
A crescente adoção de tecnologias de impressão 3D tem sido uma realidade em diversos setores de atividade (e.g. medicina e alimentação) ao nível global, ganhando maior relevo na área da construção (e.g. edifícios e pontes) a partir da década de 90, principalmente em países como os EUA, Rússia, Itália, Dinamarca, Holanda, China, Japão e Emirados Árabes Unidos. Portugal, em 2024, estreou-se com a sua primeira casa (parcialmente) construída com impressão 3D.
Comparativamente aos métodos de construção tradicionais, as potenciais vantagens associadas a esta tecnologia de automação, que se podem repercutir em custos e prazos menores, incluem: maior precisão e rapidez e menos erros na execução; menor carga de mão-de-obra; menos desperdício material e impacto ambiental; maior flexibilidade na execução de protótipos e conceções arquitetónicas mais complexas e customizadas; menos complexidade e mais segurança na realização da obra.
Não é possível, contudo, em geral, realizar integralmente uma obra com impressão 3D. Por exemplo, no caso de edifícios, excluem-se tarefas como a execução de fundações, vãos (e.g. portas e janelas) e instalações mecânicas, elétricas e hidráulicas.
Destacam-se ainda limitações relacionadas com: a sensibilidade às condições climatéricas (e.g. temperatura e humidade), que impactam na qualidade e consistência dos materiais e no tempo limite para a sua aplicação; a escassez de materiais compatíveis com a impressão 3D; o acabamento natural da impressão, que pode requerer algum tratamento estético; o impacto ambiental dos materiais utilizados e da energia consumida na impressão; a dimensão das impressoras, que deve ser grande o suficiente face aos elementos a executar; a necessidade de mão-de-obra especializada para conceber as estruturas a imprimir, para preparar, operar, manter e reparar as impressoras, e para controlar a qualidade dos trabalhos; os elevados custos de investimento, derivados principalmente da mobilização dos equipamentos; a falta de regulamentação e legislação específicas (e.g. no domínio das estruturas e licenciamento); e a reduzida experiência na gestão de contratos de construção incorporando este tipo de tecnologias.
Assim, por motivos de complexidade técnica e logística, a implementação generalizada da impressão 3D, particularmente em obras de grande dimensão, constitui, ainda, um desafio relevante.
O sucesso da impressão 3D depende de significativas adaptações de processo e mentalidade, num setor que se distingue por ser avesso à mudança.
Para começar, o governo deverá tomar ações para promover a colaboração entre universidades e empresas, no sentido de adaptar os modelos de ensino e de negócio à evolução do ambiente construído, que precisa de novas competências, de caráter mais tecnológico. Em acréscimo, deverá estabelecer regulamentação e legislação para a contratação, dimensionamento e execução de estruturas com impressão 3D.
Por sua vez, as organizações do setor deverão colaborar entre si com o propósito de adaptar os seus processos e operações ao progresso da tecnologia, ganhando assim capacidade para melhor beneficiarem das vantagens da impressão 3D. Neste sentido, a formação e qualificação das pessoas, considerando as particularidades desta nova forma de construir, assume um papel crucial.
Ao nível contratual, é importante definir os requisitos e incentivos mais adequados para promover a integração entre todas as fases e intervenientes no desenvolvimento dos empreendimentos, recorrendo, por exemplo, a metodologias como o Building Information Modelling (BIM), que, por meio de modelos digitais 3D com toda a informação relevante, permite, de forma mais realista, dimensionar e simular as estruturas a imprimir.
Por fim, a impressão 3D tem o potencial para simplificar o planeamento e gestão do âmbito, custos, prazos, ambiente e segurança no desenvolvimento de empreendimentos de construção, criando assim condições para uma indústria mais resiliente e sustentável, enquanto desafios como a escassez de mão-de-obra qualificada e a crescente necessidade de edifícios e infraestruturas são mais facilmente atendidos.
Porém, existe ainda um longo caminho a percorrer, condicionado sobretudo à ação governamental e à vontade do setor em implementar as melhores medidas.