Os últimos dias da campanha têm sido profícuos em episódios telenovelescos com pouca importância. Um deles ocorreu na semana passada, durante uma visita da Aliança Democrática à Bolsa de Turismo de Lisboa, no Parque das Nações: um jovem atirou tinta verde a Luís Montenegro, numa ação que veio depois a ser reivindicada pelo movimento Greve Climática Estudantil. Recordo a situação não por causa do que se passou, mas pelo que ela revela acerca da distância que separa os mais novos do poder político. Desta vez, ao contrário do que aconteceu no debate com Pedro Nuno Santos, que decorreu no Capitólio, cercado pela manifestação de polícias, o líder do PSD reagiu a quente e reagiu bem. É um exagero comparar o episódio da “tinta verde” com o momento de viragem em que, nas presidenciais de 1986, Mário Soares enfrentou operários em fúria na Marinha Grande. Mas é justo reconhecer-se que Montenegro esboçou imediatamente um sorriso e, com savoir-faire, apressou-se a dizer: “Por mais tinta que me atirem, eu vou seguir o mesmo caminho. Tenho todo o respeito pelas pessoas que se manifestam pelo clima, mas era mais fácil podermos conversar.”
Sobre o ato e os jovens em si, já quase tudo foi dito. Estes jovens são incoerentes quando escolhem esta forma de luta? Sim, são. Privilegiam formas ilegais e antidemocráticas de defender as suas ideias? Claro. Do clima à globalização, passando pelas desigualdades sociais e pela linguagem neutra, misturam tudo na grande Bimby da contestação? Certamente. Põem-se a jeito para serem manipulados por forças com objetivos duvidosos e que atuam de forma pouco transparente no espaço público? Sim. Banalizam estes atos de protesto, como sublinhou o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa? É evidente. Entendem a urgência climática como uma espécie de apocalipse sobre o qual a maioria dos cidadãos – mais preocupados com o fim do mês do que com o fim do mundo – já não quer nem saber? Sem dúvida. Prejudicam a causa que dizem defender? SIM!
Se definirmos eficácia pela capacidade de influenciar decisões políticas, é fácil concordarmos que os protestos destes ativistas, que mimetizam um movimento internacional, têm, de facto, pouca eficácia. No caso concreto de Luís Montenegro, terá ainda menos, uma vez que o presidente do PSD não é sequer deputado e, por isso, formalmente, trata-se “apenas” de um candidato a primeiro-ministro em plena campanha eleitoral. É verdade que Montenegro – como líder do partido que, nos idos dos anos 80, foi pioneiro nos temas do ambiente – podia ter aproveitado para falar das medidas que tem para essa área e que, agora, quer ver escrutinadas pelo voto. Em vez disso, preferiu apresentar queixa. Está no seu direito, trata-se de uma ação ilegal, mas estamos conversados em matéria de disponibilidade para o debate que ele próprio propõe.A propósito deste e de outros protestos do género, o dilema tem-se colocado frequentes vezes: até onde devemos ser tolerantes com os intolerantes? Devemos permanecer nessa posição de diálogo mesmo quando, do lado de lá da trincheira, está alguém que quer destruir-nos? Impressionante tem sido assistir ao consenso em torno da condenação dos jovens da tinta verde. Da boca de gente insuspeita, da esquerda à direita, li e ouvi adjetivos como “idiotas”, “cobardes” e “imbecis”. Mariana Mortágua, líder de um partido que tem por hábito estar do lado das causas “jovens” (digamos assim), escreveu no antigo Twitter: “O ataque de hoje ao PSD é um ataque à liberdade na campanha eleitoral e, portanto, à democracia. Se os autores desta ação alegam uma causa justa, então são os piores defensores dessa causa.”
Sou da geração da luta contra as propinas. Fui a algumas manifestações, mas não me revejo naqueles traseiros ao léu que levaram o saudoso Vicente Jorge Silva, num célebre editorial do Público, a falar na “geração rasca”. Porém, também não me revejo na forma desproporcionada como as ações dos ativistas do clima têm sido socialmente condenadas. Um arruaceiro é um arruaceiro, um terrorista é um terrorista. Às democracias saudáveis e maduras compete tratar com calma e tranquilidade aqueles que – num momento de insensatez, mas de compreensível insensatez – infringem a lei.
A avaliar por esta campanha eleitoral, estamos condenados a ser um país de velhos exclusivamente preocupados com os assuntos que interessam aos velhos: das pensões às carreiras das diferentes corporações (médicos, professores, polícias). Reproduzimos lamúrias sobre a falta de participação dos jovens, mas depois, de forma altiva e arrogante, não os escutamos e, no final, ainda lhes damos lições de moral. Os jovens são jovens e, por isso, fazem parvoíces e atiram tinta verde. Mas somos nós que nos estamos nas tintas para eles. Pior do que ser jovem parvo e inconsequente é ser velho cínico e insensível.
Breviário
O mistério dos indecisos
O facto de, após meses da mais longa campanha eleitoral de sempre, o número de indecisos estar a aumentar nas sondagens devia – a nós, jornalistas – obrigar-nos a parar para pensar. Se, na era da informação, são a desinformação e o ruído das redes sociais que prevalecem, como vão os eleitores decidir em consciência e, supostamente, tomar melhores decisões?
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